Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, outubro 16, 2007

A social-fantasia de Mantega


editorial
O Estado de S. Paulo
16/10/2007

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, encontrou um nome comprido para a política econômica do governo petista. Em entrevista ao Estado de domingo, batizou-a de “social-desenvolvimentismo”. Talvez se tenha inspirado no ministro da Justiça, Tarso Genro, especialista em rótulos grandes para conteúdos pequenos. Poderia valer a pena criar um nome para uma nova estratégia econômica. Mas não há novidade essencial na política em execução - não, pelo menos, na sua parte mais promissora e de maior sucesso até agora. Em todos os seus acertos, incluída a concessão de um trecho ferroviário e de vários trechos de rodovias à exploração privada, a administração petista apenas continuou um estilo de ação amadurecido nos anos 90.

Segundo o ministro da Fazenda, o “novo” modelo tem três pilares: 1) crescimento sustentado, sem inflação e sem déficits interno e externo; 2) formação de um mercado de consumo de massa; e 3) maior participação do País no mercado internacional, com geração de superávits comerciais e fortalecimento da moeda.

Nenhum dos três pilares foi criado a partir de 2003, quando começou o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A hiperinflação foi derrubada com o Plano Real, depois de várias tentativas malsucedidas. A parafernália da indexação foi desmontada a partir de julho de 1994 e para isso foi preciso vencer a resistência do PT e de outros partidos “progressistas”. Com a privatização de bancos estaduais e a renegociação da dívida dos Estados - um complicado processo financeiro e político - foi possível implantar uma efetiva política monetária. Nenhuma política desse tipo era possível quando os governos estaduais se endividavam sem controle e contavam com a leniência do Banco Central (BC) para manter seus bancos.

O ministro Mantega talvez não se lembre desses fatos ou talvez não conheça a dimensão de sua real importância. Com essas mudanças, o poder público ficou equipado para conter novos surtos - muito menos perigosos - de alta de preços. Derrubada a inflação, começou a elevação real do poder de compra dos assalariados. O presidente Lula pode ter esquecido a cronologia da política antiinflacionária, mas com certeza aprendeu uma lição relevante: os pobres são os maiores prejudicados pela inflação.

Permitir ao BC a manutenção de sua política, no primeiro mandato, foi um dos lances que mais contribuíram para sua reeleição. Para isso, teve de contrariar muitos petistas, defensores de “um pouco mais de inflação” para um pouco mais de crescimento. O próprio Mantega, durante parte do primeiro mandato, esteve entre os adversários da política antiinflacionária. Quando foi escolhido para a Fazenda, o presidente da República assegurou ao presidente do BC independência funcional em relação ao novo ministro.

Na entrevista ao Estado o ministro apontou avanços importantes na área social. Mas nenhum deles foi iniciado no governo petista. A distribuição de renda medida pelo Índice de Gini melhorou de forma quase ininterrupta a partir do Plano Real. Os padrões de consumo também se elevaram, primeiro velozmente, com o lançamento do plano, depois mais lentamente. Também nos anos 90 a alfabetização se universalizou e estava perto de 100% quando o presidente Lula assumiu a Presidência. A partir daí a elevação do índice calculado pelo IBGE foi marginal. Estranho seria se os indicadores tivessem piorado.

Também as políticas de transferência de renda aos mais pobres foram iniciadas antes do governo petista. O fato de terem sido alteradas e ampliadas não muda a história.

A diversificação de mercados é uma velha tendência - mais que isso, uma característica - do comércio exterior brasileiro. A recuperação do equilíbrio do balanço de pagamentos começou em 1996, com a mudança do regime cambial. A partir daí, os efeitos da modernização tecnológica e operacional da produção passaram a produzir efeitos mais sensíveis. Essa modernização foi estimulada por uma abertura condenada, na época, pelo PT e por outros grupos ditos de esquerda.

No resto da entrevista, o ministro da Fazenda faz a apologia da gastança e da multiplicação de empregos públicos, como se disso dependesse a eficiência do governo. Mas também nisso a administração petista não é original, exceto quanto a um ponto: aparelhamento como o dos últimos anos, nunca antes na história deste país.

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