Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 19, 2007

Dora Kramer - Osso duro de largar




O Estado de S. Paulo
19/10/2007

Os políticos oposicionistas mais preocupados com a sucessão presidencial de 2010 - vale dizer, quase todos - divergem quanto ao caminho a ser adotado, mas todos concordam que algum plano a nação petista terá para continuar no poder depois de concluído o segundo mandato de Luiz Inácio da Silva.

Aquele contingente de milhares que ascendeu social e politicamente com a eleição do presidente Lula, reza o raciocínio unânime, não vai se conformar com facilidade em voltar à planície que, em muitos casos, significa o retorno ao vale dos despossuídos. E aí, já sem o charme do diferencial “do bem” relativamente aos outros partidos.

Um baque de boa monta para quem teve acesso a mares dantes nunca navegados e não dispõe de preparo, tradição e formação profissionais para, na eventualidade de derrota eleitoral, preservar o padrão adquirido nos oito anos de poder.

Há, atualmente, duas visões correntes na oposição a respeito. Os mais catastróficos, em geral tucanos, vêem a possibilidade de o PT - não Lula, por constrangimento pessoal - tentar de alguma maneira conseguir o terceiro mandato.

Como precaução, já começam a conversar sobre a possibilidade de ressuscitar a tese da apresentação de uma emenda propondo o fim da reeleição como forma de criar uma expectativa segura da volta de Lula à presidência em 2014 - pois o eleito em 2010 já não poderia concorrer - e, assim, acalmar as tentações de proposições continuístas.

O risco de mexer com esse assunto - que por isso mesmo havia sido abandonado - seria de, uma vez alteradas as regras, o PT invocar o direito de Lula disputar em 2010 alegando que o jogo estava zerado.

De outro lado, temem que a resistência em abandonar os ossos envoltos nas gordas carnes da máquina pública possa impulsionar a maioria no Congresso a conseguir aprovar a emenda de um novo mandato.

A inquietação é tanta que, pasme e acredite o leitor, há quem avente mesmo a possibilidade de se negociar com Lula uma prorrogação de um ano de mandato em troca do fim da reeleição.

Há, no entanto, outra corrente de pensamento menos alarmista, da qual faz parte o prefeito do Rio de Janeiro, César Maia. Ele concorda com a premissa do desejo de continuar. “A república dos pelegos não vai querer voltar a ganhar R$ 800 assim tão facilmente”, diz ele.

Mas o prefeito não compartilha dos temores em relação a golpes de mão institucionais. Não porque acredite em ausência de desejos, mas porque está convencido da carência de condições objetivas.

Ele lembra uma frase de Leonel Brizola dita quando da volta do exílio negando que lutaria pela implantação do socialismo no Brasil: “A burguesia brasileira não cabe em Miami”. Com isso, Brizola queria dizer, já naquela altura, antes da redemocratização completa, que certos limites democráticos não poderiam ser ultrapassados sem uma resistência firme da sociedade.

Por isso, César Maia tem plena certeza de que o PT nem tentará soluções heterodoxas, “simplesmente porque não passam, da mesma forma como não prosperaram algumas tentativas de cunho autoritário”.

Na visão dele, o PT constrói uma “capilaridade” de influências e benefícios sociais na máquina estatal tentando que essa mesma máquina seja capaz de eleger qualquer candidato do campo de Lula.

“Como ele não há mais nenhum, mas considerando que na oposição também não há uma figura forte capaz de capitalizar a demanda do eleitor, pode ser que o governo com os instrumentos de que dispõe consiga montar uma candidatura viável, escolhendo um entre tantos nomes sem expressão eleitoral.”

Arriscaria aposta em algum?

Em nenhum. Nem do governo nem da oposição. Na opinião dele, o atrativo da eleição de 2010 é justamente seu caráter de loteria. “Não há favoritos e, por isso, no primeiro turno todos terão candidato.”

Escaldado

O presidente Lula vai se reunir com os 100 maiores empresários do País, não para convencê-los de que a carga tributária é leve no Brasil. O objetivo do governo é ver se neutraliza as movimentações contra a CPMF, pois ainda está fresca na memória a derrubada da parte da Medida Provisória 232, que aumentava a tributação de pessoas jurídicas prestadoras de serviço.

A MP foi derrotada parcialmente justamente por causa da mobilização do empresariado.

A idéia do encontro com os empresários surgiu antes do fracasso do ato-show contra a CPMF promovido pela Fiesp, mas, antes prevenir que remediar o irremediável.

Com os governadores, o Planalto adota estratégia semelhante e faz também a aproximação, em movimentos homem a homem. Tem dado certo. Em plena tramitação da CPMF não se ouviu falar em nenhuma reunião de governadores.

Aécio Neves, por exemplo, no início do ano se apresentava explicitamente como comandante de um levante em favor da redistribuição de parte do imposto do cheque, dizia-se intransigente quanto a isso e, de repente, não mais que de repente, aquietou-se.


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