Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 07, 2007

China briga com Índia por mercado de túmulos


Indianos estão divididos entre os chineses clientes e os concorrentes

Margot Cohen


A paleta de cores do granito indiano congrega um mundo etéreo que vai muito além do conhecido. Blue Galaxy (Galáxia Azul), Paradiso, Aurora Indiana e Negro Himalaia são apenas alguns dos matizes oferecidos por esse país rico em minério.

Essas cores são o maior argumento de venda da Índia no setor global de túmulos ou, como dizem os especialistas no assunto, ''''o setor de monumentos e túmulos''''. Como os enlutados clientes ocidentais optaram por túmulos diferentes nas décadas de 80 e 90, os fabricantes indianos esperavam conquistar um lugar de honra eterno nos cemitérios dos Estados Unidos e Europa.

Mas a concorrência chinesa aniquilou essas claras projeções. Nos últimos seis anos, os fabricantes chineses conseguiram importar blocos não lapidados do cobiçado granito colorido indiano, trabalhar a pedra e manufaturar os túmulos na China, que são vendidos para o mundo todo a preços entre 10% e 30% inferiores aos produzidos na Índia. Essa estratégia cada vez mais bem-sucedida dos chineses deixou os indianos lutando para aumentar a produtividade, aperfeiçoar os vínculos com a clientela e reclamar sua fatia de mercado.

Para os indianos pioneiros, que têm na lembrança as horas ininterruptas gastas arrastando 30 quilos de amostras de granito para os aeroportos e freqüentando feiras internacionais, a concorrência é preocupante. ''''O mercado foi preparado e criado pelos indianos'''', diz R. Veeramani, presidente do Gem Group, com sede em Chennai, um dos maiores exportadores de monumentos e blocos de granito. ''''Os chineses se introduziram nele.''''

Esse avanço chinês realça a extraordinária capacidade do país para diversificar suas exportações e se direcionar para novos mercados. Esse talento também se reflete no comércio entre China e Índia. Em meio a notícias animadoras de que o comércio bilateral está crescendo quase 50% este ano, depois de ter atingido US$ 25 bilhões em 2006, a Índia começa a se inquietar cada vez mais com a elevação do déficit comercial com a China - que atingiu US$ 4,1 bilhões no ano passado e continua a aumentar.

Essa aposta da China nos cemitérios é apenas o mais recente avanço numa longa corrida global por um setor disposto a se beneficiar com uma população que envelhece. Atualmente, 80% das pedras para túmulos vêm da Ásia. Esse dado estatístico oculta uma longa sucessão de falecimentos, à medida que milhares dos empreendedores e pedreiros da Europa, Estados Unidos e Japão se voltam para a China e Índia. À semelhança da arbitragem em curso na comunidade marítima internacional - onde ondas de marinheiros britânicos, russos, poloneses, indianos, filipinos, chineses e vietnamitas vão e vêm sob o impulso das forças de mercado -, a busca por bons negócios com túmulos deve persistir.

Foi um marinheiro britânico que deu, pela primeira vez, a idéia para um amigo minerador indiano de Andra Pradesh, de que ele poderia começar a exportar monumentos para a Inglaterra. Era 1942, no auge da 2ª Guerra Mundial com sua lúgubre lista de enterros diários. No início, a nova companhia, Evershine, produzia os túmulos na sua forma tradicional, polindo e talhando a pedra à mão. Finalmente, na década de 70, a companhia começou a importar algum maquinário básico da Europa e a atividade ampliou-se para os Estados vizinhos de Karnataka e Tamil Nadu.

Hoje, entre mais de 100 fábricas de túmulos da Índia, a importação de máquinas sofisticadas da Europa e do Japão é considerada chave para superar em qualidade a concorrência chinesa.

Mas alguns industriais chineses zombam dessa noção de que o maquinário importado garante um acabamento superior. Eles fabricam seu próprio equipamento e, com isso, ajudam a rebaixar os preços indianos no atacado. ''''As máquinas européias não trabalham eficientemente'''', diz Antony Ma, diretor geral da Tianjin Zhongjian Wanli Stone Co. Ltd., que enviou 300 contêineres repletos de lápides em 2006 para os mais variados portos nos Estados Unidos, Europa e Japão.

O Japão foi o primeiro mercado que a China roubou da Índia nos anos 90, mas só depois de a Índia ter se beneficiado com o fechamento de muitas empresas japonesas tradicionais durante a recessão econômica. De início, as empresas chinesas ficaram encorajadas com o fato de que os elegantes modelos japoneses eram em preto e cinza, cores de granito que a China podia trabalhar dentro das próprias fronteiras. Logo, os empresários japoneses passaram a colaborar para desenvolver o setor, criando empresas em joint venture na China.

Mas foram tantas as empresas que entraram na atividade que os preços caíram e os lucros encolheram. Apesar de a China comandar 97% do mercado japonês em 1999, os cemitérios ocidentais pareciam mais tentadores. Depois de algumas avaliações, os chineses concluíram que a matéria-prima constituiria somente 20% a 25% do custo do produto acabado.

Em praticamente todos os demais aspectos: custo do combustível e da mão-de-obra, produtividade, desenvolvimento de infra-estrutura e disponibilidade de crédito, os chineses podiam derrotar os indianos na sua própria especialidade. Além disso, sabiam que conseguiriam um prazo de entrega mais rápido, por causa da geografia e dos cronogramas de transporte.

Para competir, os administradores indianos se apoiaram nos seus escultores. Por muito tempo elogiados por seguirem a tradição da Índia de esculpir templos intrincados, repentinamente os empresários indianos perceberam que o problema estava na administração do tempo industrial.

''''Nossos gerentes disseram que existe uma competição com a China e, portanto, é preciso trabalhar rápido'''', disse D. Asalan, escultor da Gem Granite em Chennais. ''''Mas a qualidade também é importante.''''

Naturalmente existem limites nessa cadeia de abastecimento global. Os túmulos, da Índia ou China, em geral são entregues sem o nome do falecido esculpido na pedra. Os fabricantes temem que os empregados possam escrever erroneamente um nome estrangeiro que não lhes é familiar, arruinando imediatamente um produto que é vendido por milhares de dólares ou euros. Assim esse delicado trabalho é concluído depois da entrega.

FATIAS DE MERCADO

As divisões do mercado ainda são confusas. As autoridades indianas dizem que 65% do mercado importador de túmulos da Europa pertencem à India e 35% à China, enquanto que as empresas desse setor, francesas e alemãs, lutam para continuar em atividade.

No caso da América do Norte, estima-se que 60% das importações de lápides são da Índia e 40% da China - enquanto que as fabricadas nos Estados Unidos vêm da Georgia e Vermont. Mas os chineses alegam que estão chegando à liderança nos Estados Unidos, enquanto que o mercado japonês continua firme em suas mãos.

Empresários como Ma ainda não estão cantando vitória. As companhias chinesas estão preocupadas com os impostos crescentes e os investimentos maiores para atender às campanhas oficiais antipoluição.

Esses fatores podem reduzir o diferencial de preço.

Entretanto, o contingente indiano manifesta otimismo. ''''Eles não conseguem nos aniquilar'''', declara K. Subba Reddy, presidente do Pallava Group, também com sede em Chennai, acrescentando que a Índia ainda seleciona o sortimento de blocos de granito nas próprias pedreiras, obtendo assim qualidade superior.

Ironicamente, algumas das maiores empresas de manufatura de lápides da Índia são agradecidas, e com razão, aos chineses. Como elas controlam as próprias pedreiras, sabem que, basicamente, a China salvou o setor indiano de granito do marasmo em que estava há sete anos. Hoje os chineses compram 45% do granito indiano.

A Índia ainda se esforça para compreender o papel duplo da China, como concorrente e como cliente.

Como a camada sarapintada do granito verde Himalaia, o comércio global não pode ser reduzido a uma única cor.

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