Isso preocupa especialmente, diz o FMI, porque aumenta o risco de protecionismo comercial, que irá afetar, exatamente, os países emergentes. Os mesmos que deverão ter um novo e importante papel na sustentação do crescimento mundial. E a agravar-se esse quadro, talvez não possa atender ao que deles se espera, pois só continuarão crescendo se continuarem exportando.
Ou seja, estamos entrando num terreno em declive, ameaçado por uma nova onda de protecionismo que já se acentua nos Estados Unidos e na Europa, com o enfraquecimento do comércio multilateral. Ninguém cede nada porque todos estão preocupados com seus problemas.
UM BRASIL QUE REAGE
Aqui, no Brasil, temos dois cenários opostos. Um é o do Brasil institucional em que não se caminha e desanima, e outro é o Brasil comercial, cheio de dinamismo. Estamos importando mais, nos integrando mais no comércio mundial. Parece que, afinal, as grandes empresas nacionais decidiram romper as amarras da burocracia e dos obstáculos oficiais.
Na verdade, deram as costas ao governo e, assumindo o custo dos juros e do câmbio, decidiram viver sua vida, que é exportar mais para um mercado ainda aberto mesmo com expansão menor. Poderiam desenvolver-se mais, muito mais, se o Estado não os atrapalhasse tanto.
Em resumo, o dinamismo do comércio exterior brasileiro, mesmo significando pouco na conjuntura do mercado mundial, é uma espécie de resposta heróica a tanta inércia dos ministérios que deveriam cuidar dos assuntos comerciais, mas não cuidam ou cuidam mal.
O OUTRO BRASIL
Mas não estaríamos exagerando com esse "outro Brasil" que eles não vêem? Não, não exageramos. Há dinamismo, sim. A própria coluna constatou suas proporções ao folhear as 340 páginas do recém-lançado anuário Análise Comércio Exterior por um grupo de jornalistas econômicos. Ali estão empresas que crescem exportando, parceiros comerciais, os 50 principais produtos negociados pelo Brasil, quem é quem e quem cresceu e por quê.
É uma radiografia profissional feita por uma equipe de jornalistas e técnicos, projetando um quadro que quase nos leva a perguntar: mas será que isso é Brasil? E, ao percorrer as análises, as entrevistas e avaliar os dados estatísticos, concluímos que é, sim, o Brasil que se descolou de Brasília e caminha sozinho, com ou sem Doha, com ou sem OMC. Sofre apenas a ausência de acordos bilaterais, o peso da inércia enervante da nossa diplomacia que se agarra a projetos inúteis quando deveria estar concluindo acordos bilaterais. Mas dá a entender que estamos avançando, com eles ou sem eles.
Seria melhor, com os acordos bilaterais, aumentaríamos consideravelmente nosso comércio. Mas, ao contrário de Brasília, não vamos ficar parados enquanto eles não vem. Já esperamos muito...
O OUTRO BRASIL LÁ FORA
E essa intensa atividade do "outro Brasil", que nos anima, está nas páginas desse anuário - o maior inventário já feito sobre o comércio exterior brasileiro. Há exemplos de empresas que após crescerem muito no Brasil, romperam fronteiras e estão adquirindo grandes empresas no exterior.
Essa expansão para fora é negativa quando se trata de companhias de menor porte que, não tendo fôlego, deixam de investir aqui por causa das condições adversas e correm para fora. Mas é altamente positiva para as grandes multinacionais brasileiras que continuam investindo pesadamente aqui e no exterior. Elas aumentam suas exportações com a produção feita aqui, mesmo vendendo mais no país em que se instalam. Há um mercado imenso ainda a ocupar. Para as grandes empresas, ao contrário das menores, investir no exterior não invalida sua política de investir no Brasil - têm recursos para ambos.
O EXEMPLO DA VALE
Um exemplo é a Vale do Rio Doce, a mesma Vale vitoriosa que a esquerda está querendo estatizar. A companhia adquiriu 75,66% do capital da mineradora canadense de níquel Inco, tornando-se a segunda maior empresa de mineração do mundo, atrás apenas da anglo-australiana BHP Billiton.
Outros grupos empresariais brasileiros também intensificaram suas estratégias de internacionalização. Os negócios no exterior, mais as exportações do grupo, já respondem por 59% das receitas da Gerdau.
O caso de como a Gerdau vem construindo seu caminho fora do Brasil também faz parte do anuário, que publica os casos de sucesso vencedores da segunda edição do Prêmio Análise-FIA de Comércio Exterior - uma iniciativa da Análise Editorial e da Fundação Instituto de Administração. Causa ânimo ver esse contraste entre o retrato do Brasil que produz, que cria empregos, que gera divisas, e o Brasil sonolento de Brasília, que tanto preocupa e entristece.
*E-mail: at@attglobal.net