Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 07, 2007

Dora Kramer O tempo é o senhor da razão



O exemplo e os conselhos do deputado Jader Barbalho, consta, têm servido de esteio ao presidente do Senado, Renan Calheiros, para resistir a apelos e protestos para que se licencie do cargo. Saindo, perderia o que lhe resta de força, raciocina.

A certeza se baseia, entre outros fatores, na interpretação de que Jader começou a escrever o roteiro que o levaria à renúncia do mandato em outubro de 2001, quando pediu licença da presidência do Senado, três meses antes.

Na ocasião, o então presidente pediu afastamento por 60 dias, prometendo voltar em breve com tudo esclarecido, provando que as acusações de desvio de dinheiro público que o levariam à prisão em fevereiro de 2002 tinham “intuito politiqueiro”. Arrematou com uma frase de efeito: “Nem Jesus Cristo escapou de ser crucificado.”

Calheiros foi mais modesto, preferiu comparar-se ao presidente Luiz Inácio da Silva, dizendo-se agora vítima da mesma mídia “opressiva” - quiçá “fascista” - que tantas injustiças cometeu contra o presidente, o PT e a base aliada no Congresso quando se descobriu no interior do governo um duto ligando empresas estatais ao partido, por onde passavam verbas oficiais por intermédio de Marcos Valério de Souza e companhia.

Ao contrário do que parece em retrospectiva, Jader Barbalho não entregou os pontos com rapidez. O atual presidente enfrenta acusações há pouco mais de um mês, mas pressão mesmo só começou a sofrer há menos de duas semanas.

Jader resistiu por quatro meses até se licenciar. Foi eleito presidente do Senado em fevereiro de 2001; em março um relatório do Banco Central revelou a existência de depósitos suspeitos de serem provenientes de desvios de recursos do Banpará nas contas dele.

Em abril, surgiu o caso das verbas da Sudam - R$ 9,6 milhões para um projeto de criação de rãs para a mulher do então presidente do Senado. Ainda assim, ele ficou no cargo até julho. Em agosto, no Congresso se iniciou uma investigação preliminar e, naquele mesmo mês, o relatório final da CPI da Grilagem de Terras pediu o indiciamento do senador por irregularidades cometidas quando era titular do ministério da Reforma Agrária.

Concomitantemente, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado deu parecer favorável à abertura de CPI sobre as gestões de Jader Barbalho à frente das pastas da Reforma Agrária e da Previdência, no governo José Sarney.

No curso da licença de 60 dias, o corregedor do Senado, Romeu Tuma, o mesmo de agora, concluiu pela existência de indícios que justificavam a abertura de processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética.

Assim como fez Renan Calheiros, ao dizer na semana passada que o conselho “finge fazer o seu trabalho”, denunciando como irregular o rito por ele mesmo estabelecido, Jader também contestou a legitimidade dos conselheiros para investigá-lo.

Em setembro, no dia 10, anunciou sua volta à presidência para dali a uma semana. Romeu Tuma rebateu revelando a existência de provas contra ele no caso Banpará.

Dois dias depois, a comissão especial de investigação concluiu que o presidente licenciado mentiu ao negar as acusações e pediu abertura do processo no Conselho de Ética. Perdido, Jader reassumiu a presidência, mas anunciou a renúncia, que de fato apresentaria no dia 5 de outubro.

Só então saiu do foco, encerrando uma agonia de sete meses entre as primeiras denúncias, a licença e a renúncia.

Sob esse foco é que o atual presidente insiste em permanecer, indiferente à evidência de que o tempo deixou de ser seu aliado desde que o Senado se percebeu cúmplice de manobras protelatórias.

Agora, a disposição do Senado de esmiuçar seu patrimônio e seus negócios agropecuários, além de suas relações com a empreiteira Mendes Júnior, substituiu a leniência com que foram recebidas as suspeitas sobre a forma de pagamento da pensão de sua filha com a jornalista Mônica Veloso.

Jader Barbalho confrontou o quanto pôde e Renan Calheiros confronta já mesmo sem poder. Não necessariamente terão destinos semelhantes. Os casos e as circunstâncias são diferentes. O exemplo de Jader não conta para Calheiros a história de um erro cometido por falta de resistência, como ele supõe ao acreditar que o seu agora conselheiro liquidou-se porque resolveu se licenciar. Inclusive porque só se licenciou quando já estava liquidado.

O caso de Jader exibe a repetição de uma vocação para o confronto com os fatos que nada tem a ver com coragem ou hombridade. Guarda, sim, relação com o despudor e a torpeza de se esconder atrás da cadeira de presidente do Senado.

Ver navios

Com toda a cobrança explícita de Renan Calheiros por mais solidariedade do Planalto, o presidente Lula não avançará para além da defesa da tese da presunção da inocência feita em cerimônia pública na presença do presidente do Senado.

Cheque em branco só uma vez, para Roberto Jefferson. Depois daquela, ele não deu a mais ninguém, nem a José Dirceu.

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