Se existe um partido que não pode reclamar, muito menos estranhar, a boa sorte do presidente Luiz Inácio da Silva - confirmada nas duas pesquisas de opinião divulgadas na semana passada, registrando popularidade intocada -, este partido é justamente aquele com veleidades a capitalizar o apoio dos outros 50% que não se encantam com o desempenho pessoal do presidente nem consideram seu governo ótimo e bom.
Falar sobre a dubiedade, a fragilidade, a ausência de identidade e a inércia do PSDB equivale a chover no molhado. Notícia antiga, constatação superada de uma realidade consolidada.
Digno de registro para análise a respeito do cenário ou mero raciocínio que venha a nos ajudar a entender o quadro eleitoral quando esse futuro próximo se apresentar, é o fato de o maior - e auto-proclamado melhor - partido de oposição do País não perceber o quanto se desgasta em praça pública atraindo a desconfiança e alimentando a desesperança de seu eleitorado real e potencial.
Dias atrás, um grupo de 70 simpatizantes típicos do PSDB, paulistas de classe média alta, fortemente críticos do governo federal e fartamente informados sobre o mundo da política, trocava idéias num centro de estudos e debates, em São Paulo, quando alguém abordou o assunto desempenho da oposição como um todo e comportamento do tucanato em particular.
Estabeleceu-se sem contestação a unanimidade sobre a incapacidade do PSDB de se firmar como um contraponto à aliança entre PT e PMDB. Aquele grupo, talvez majoritariamente eleitor de José Serra na eleição para o governo do Estado, não enxergava no PSDB uma alternativa, um partido diferenciado da desqualificação genericamente atribuída à classe política ou uma possibilidade para adesão entusiasmada na próxima eleição presidencial.
Aos fatos que sustentam tal avaliação: recuo na crise do mensalão por causa da descoberta de que o senador Eduardo Azeredo (naquela época presidente nacional do PSDB) tivera acesso ao caixa 2 de Marcos Valério de Souza; participação fundamental na eleição do PT para a presidência da Câmara em função de acertos conduzidos pelos governadores José Serra e Aécio Neves; titubeio prolongado no caso Renan Calheiros, por conta das relações de amizade da bancada tucana com o presidente do Senado e da aliança política de Calheiros com o governador de Alagoas, Teotônio Vilela Filho, também ex-presidente do PSDB.
Juntem-se esses três episódios e teremos um denominador comum entre eles: a submissão do partido à defesa de interesses localizados que não rendem um só benefício e produzem todo o malefício resultante do abandono de uma política de atuação partidária referida em idéias, princípios, projetos, valores, pensamentos, ações conjuntas bem definidas e, de preferência, um projeto com começo, meio e fim.
Caso não surja nenhuma novidade no cenário da sucessão de Lula nem prosperem idéias sobre um terceiro mandato, o quadro caminha para se ter em 2010 a disputa entre um partido (PT) sem candidato e dois candidatos (Serra e Aécio) sem partido, brigando entre si.
Com ferro fere
'Eu não tenho compromisso com o erro.' Esta frase, recorrente no repertório do político Renan Calheiros, ele repetiu diversas vezes ao longo de sua carreira, sempre que pretendia se distanciar de adversidades alheias ou justificar mudanças de posição.
Em sua atual desventura, o dístico pode ser invocado por seus parceiros e lhe bater à nuca como um bumerangue pesado.
Fabulando em protesto
Sob o título Fazenda Brasil, o deputado Chico Alencar juntou uma série de expressões populares e elaborou uma fábula-manifesto 'sobre os que juntam fabulosa riqueza pecuniária com pecuária'.
Alguns trechos: 'Ê vida de gado... Enquanto você estava pensando na morte da bezerra, donos de enormes currais eleitorais aumentavam seu pecúlio com aberrantes negócios pecuários. Com cara de boi sonso, eles vêm com aquela conversa para boi dormir, jurando que não tem boi na linha, que foi tudo limpo como leite pasteurizado de vaca premiada, livre de aftosa.
'Não fique chorando o leite derramado! Vamos dar nomes aos bois: não é vaca Estrela nem boi Fubá; é Renan, Roriz, Quintanilha, Jucá... A situação na Ré-pública está de vaca desconhecer bezerro. Mesmo com algumas excelências enroladas como novilha atolada até o chifre, quem não se sente como rês desgarrada nessa multidão-boiada caminhando a esmo?
'Berre, povo marcado, não deixe a vaca ir para o brejo! Não diga amém como vaquinha de presépio.' Na convocação geral ao emprego da boiada 'para não sair da briga', Alencar termina com nova versão de Boi da Cara Preta, substituindo os rebentos que têm medo de careta pelos 'senadores que encheram a maleta'.