As reformas são essenciais, indispensáveis para modernizar a estrutura das leis e do Estado, torná-lo ágil, operante, racional e adaptado às mudanças ocorridas no tempo - no Brasil e no mundo. Repetida à exaustão por mais de uma década, não há hoje quem discorde dessa óbvia constatação, seja de direita, esquerda ou centro. Só oportunistas, demagogos e exploradores das benesses do Estado resistem às reformas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está entre eles, gostaria de aprová-las até o fim de seu governo, sabe que elas melhoram a gestão pública, aceleram o crescimento econômico e novos investimentos chegam e ficam. Apesar disso, Lula pouco ou nada fez para concretizá-las e na semana passada contribuiu para enterrar duas delas - a trabalhista e a previdenciária - ao escolher para ministros do Trabalho e da Previdência pessoas que historicamente trabalham contra reformas e o que menos querem é mudar as regras.
Na verdade, as reformas capengam desde o governo FHC. Embora real, o apoio da sociedade é silencioso, não explícito, em contraste com as resistências - barulhentas, engajadas e corporativas. As reformas política, tributária e do Judiciário não andaram em nenhum dos dois governos. A previdenciária foi um remendo no governo FHC e no de Lula nem implementada foi, porque ficou dependente de um fundo de pensão que jamais foi criado. Com a trabalhista foi pior: FHC limitou-se a extinguir a figura do juiz classista, uma anomalia herdada do Estado Novo de Vargas. Lula, nem isso, confiou o projeto a um fórum trabalhista que se perdeu em divergências inconciliáveis, nada produziu e morreu.
Antes mesmo de tomar posse na quarta-feira, o ministro Carlos Lupi, do PDT, avisou que não vai mudar uma vírgula na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que implique tirar direitos trabalhistas. Mas nada disse sobre a maioria dos trabalhadores, a parcela de 53% que não tem nenhum direito, trabalha na informalidade, sem 13º salário, sem férias nem Previdência Social, para os 47% restantes terem seus direitos garantidos. Candidato derrotado ao governo do Rio de Janeiro na eleição de 2006, Carlos Lupi fez uma campanha de acusações pesadas contra o PT e Lula, chamando-o de “traidor” e de outros adjetivos mais graves. Na semana passada mudou. “Na política, a gente só não faz acordo com o demônio”, explicou a transfiguração e tratou de começar a pensar no que interessa: nomes de seu partido para as Delegacias Regionais do Trabalho e para cargos no Ministério.
O mais grave no método usado por Lula para construir sua base política não é buscar aliados nos partidos (isso é normal), mas permitir que os partidos indiquem pessoas despreparadas, sem nenhum perfil técnico, alguns com problemas na Justiça e com a clara e explicitada intenção de por os Ministérios a serviço do seu partido, de seus filiados e compadres. Como tudo vale, não há seriedade, xingamentos e acusações de “traidor” rapidamente viram afagos. O próprio Lula absolve antecipadamente e consola o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, envolvido em processo no Supremo Tribunal Federal.
Com a reforma previdenciária, Lula parece viver um dilema dicotômico não resolvido. Ora o governo vai “consertar” a Previdência e tocar a reforma, quando o propósito é atrair investidores. Ora muda o discurso, encolhe a reforma e diz que ela só vai valer para os novos que ingressarem no mercado de trabalho, não admitindo sequer mudar a idade de acesso à aposentadoria. Não bastasse o fracasso do fórum trabalhista, Lula confiou o projeto a outro fórum, composto pelos mesmos sindicalistas que jogaram a reforma trabalhista no ralo. De origem sindical, o ministro Luiz Marinho pouco ou nada vai ajudar.
Reformas e mudanças não costumam ter aceitação política fácil, mas elas são absolutamente indispensáveis para o progresso do País e da população. Países como o Chile, que fizeram as suas há mais tempo, hoje colhem frutos, suas economias crescem a taxas mais elevadas e expandiram a oferta de empregos aos trabalhadores. Lula sabe disso. Mas, se defender as reformas implica perder popularidade, ele recua, cede à barganha política rasteira, não se comporta como um estadista