Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, abril 12, 2007

Oportunidade perdida CARLOS ALBERTO SARDENBERG

Pessoal, é preciso reparar: a economia mundial está simplesmente sensacional. Com as boas perspectivas para 2007 — crescimento esperado de 4,9%, segundo o relatório divulgado ontem pelo FMI — serão cinco anos seguidos de expansão forte, na média de 5% anuais. A última vez que isso aconteceu foi no início do século passado.

Mais recentemente, houve crescimento acelerado no período 1970/73, quatro anos, pois, e que terminaram da pior forma: crise do petróleo, inflação, juros altos, recessão.

A quadra 2002/05, portanto, já é de qualidade superior à de 30 anos atrás. Não há sinais de crise aguda no horizonte. Ao contrário, o FMI e muitos outros analistas acreditam que a expansão mundial pode continuar ao longo de 2008.

Além disso, por obra da globalização, todas as regiões do mundo estão em crescimento.

Também é um dado a reparar. Há mais equilíbrio, um país, uma região apoiando a outra. Neste momento, por exemplo, os EUA estão em desaceleração, compensada, porém, pela aceleração de Japão e União Européia, especialmente da Alemanha.

Há riscos no horizonte, como o enorme déficit dos EUA com o resto do mundo, mas parece que podem ser administrados sem crises maiores, isto é, sem recessão.

Por outro lado, excetuado um ou outro país, também não há inflação. Nas regiões importantes, fica na faixa de 2 a 3% ao ano. Nos EUA, o índice está um pouco acima do tolerável, mas, de novo, a probabilidade maior é de controle sem necessidade de políticas recessivas.

Essa inflação no chão é conseqüência de múltiplos fatores — como a produção barata da China e dos asiáticos em geral — mas muito especialmente da aplicação generalizada do regime de metas de inflação com banco central independente.

O comércio mundial (exportações mais importações de mercadorias e serviços) cresce na média de 10% ao ano. Qualquer país que tenha alguma coisa para vender está fazendo dinheiro.

As companhias fazem lucros, suas ações se valorizam, as bolsas estão bombando no mundo todo. Sobram recursos para investimentos.

Em resumo, tem para todos. Claro que países com boas políticas devem se beneficiar mais desse ambiente. O que nos remete ao Brasil. Primeira observação: a sorte do presidente Lula. Ele ganha as eleições e o mundo entra em crescimento espetacular. Exatamente o contrário da era FHC, com altos e baixos, e sucessivas crises internacionais.

Lula, de todo modo, teve o mérito de manter o tripé de política econômica erguido na era FHC — superávit primário, metas de inflação e câmbio flutuante — o que permitiu superar rapidamente a crise de confiança gerada pela própria vitória petista. Depois, a expansão mundial fez o resto do serviço. Propiciou, por exemplo, o forte crescimento das exportações, as quais, de sua vez, trouxeram os dólares que eliminaram o problema da dívida externa.

Sem inflação, sem dívida externa, com superávit primário e redução do endividamento público, os indicadores macroeconômicos brasileiros nunca foram tão adequados. Tudo de positivo que ocorre neste momento, e que puxa o crescimento local, vem dessa política econômica.

Por exemplo, o consumo das famílias cresce por causa dos ganhos de renda e do aumento do crédito — as duas coisas sendo consequências diretas do fim da inflação.

O país hoje colhe os frutos de uma política que vem sendo construída desde o lançamento do Real, em 1994. No início do governo Lula, na era Palocci, ainda houve alguns avanços — reforma da previdência pública, medidas microeconômicas — que melhoraram o desempenho macro. Depois, parou.

De modo que o governo Lula ficou assim: a “herança maldita” mantém a estabilidade econômica, garante um mínimo de crescimento.

Ao lado disso, a ampla distribuição de dinheiro público aos mais pobres, via Bolsa Família e aumentos do salário mínimo, que reajustam o piso das aposentadorias e pensões, forma a marca Lula.

É simples assim: a política econômica herdada de FHC, agora turbinada pelo crescimento mundial, mais as bolsas e o mínimo.

Mas é por isso que o país não cresce mais. Falta a perna dos investimentos. E estes dependem de reformas que o presidente Lula deixou de lado.

Os investimentos do governo federal em infraestrutura nem chegam a 1% do Produto Interno Bruto. Para aumentá-los, o governo precisaria gastar menos em custeio, pessoal e Previdência.

Isso exige reformas da Previdência e da administração pública.

Para abrir espaço ao investimento privado, também são necessárias reformas de cunho liberal, como as que levem à redução da carga tributária e dos custos trabalhistas. Também é preciso destravar o ambiente de negócios e voltar às privatizações, especialmente às concessões de serviços públicos (estradas, portos, aeroportos) à iniciativa privada.

Na verdade, nem haveria problema se o governo se concentrasse na distribuição de renda, desde que abrisse amplo espaço para o investimento privado.

Mas não há investimento público por falta de dinheiro, nem privado por causa das restrições ideológicas e da pura incompetência. O que significa que o país perde a oportunidade de ampliar sua capacidade de crescimento.

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