PANORAMA ECONÔMICO |
O Globo |
4/4/2007 |
Os controladores já estavam amotinados, já tinham expulsado os superiores da sala, quando o governo foi chamado. A situação encontrada era de limite. O comandante da Aeronáutica queria fazer a única coisa possível pelo regimento: mandar prender. O ministro Paulo Bernardo perguntou se ele teria condições de restabelecer o tráfego. O comandante Juniti Saito disse que não. E aí começou a negociação. O presidente Lula está se esforçando para reescrever os fatos, mas o que aconteceu na sexta-feira foi que ele reagiu com a cabeça de um sindicalista numa crise militar. Na reunião ontem, começou afirmando: - Já determinei ao comando da Aeronáutica que assuma completamente esta crise com os controladores. Avisou ainda que a chance de os controladores não serem punidos é zero. Os que estiverem respondendo ao IPM serão afastados de suas funções. O problema é que há um documento escrito - fato confirmado pelo ministro Paulo Bernardo - afirmando que o governo não puniria. - Assinei o compromisso de que o governo federal não puniria ninguém, e ninguém foi punido até agora; mas o Ministério Público Militar é órgão independente e está abrindo um inquérito policial militar. O governo não pode impedir isso. Ninguém falou em anistia, muito menos em anistia preventiva. Os comandos militares foram acalmados pelo recuo do presidente, e pela decisão de punir os amotinados, mas, ao mesmo tempo, têm sido criticados por outras instâncias do governo por terem permitido que a situação de indisciplina chegasse tão longe. É bom lembrar que houve outros episódios de desautorização, como o dos ministros do Trabalho e da Defesa negociando com os controladores no início da crise. O fato mais importante agora é como resolver o futuro. O governo decidiu que não haverá desmilitarização do controle tão cedo. - Não será feita com a faca no pescoço do governo - diz o deputado Beto Albuquerque, que participou da reunião do Conselho Político. - Ficou escancarado que o problema é apenas dos controladores de vôo. Não existe apagão - afirma o deputado Jovair Arantes, do PTB. O problema é mais complexo. A desmilitarização do controle aéreo é considerada cara, complicada e ineficaz. O controle aéreo não se restringe aos controladores. Ele começa com a instalação de um radar que, no Brasil, muitas vezes, é feita em áreas isoladas; a Aeronáutica tem que providenciar geração de energia e pessoas que trabalhem no local. Na Europa, por exemplo, isso não sai tão caro nem é tão difícil, pois há sempre cidades próximas. As informações captadas pelo radar são enviadas via satélite para um centro de controle da Aeronáutica que cuida tanto da defesa aérea quanto do controle de tráfego aéreo (Cindacta = Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo). No Brasil, são quatro Cindactas: Brasília, Curitiba, Recife e Manaus. Neles, há salas separadas: uma, de acesso restrito, recebe as informações primeiro e é a que cuida da defesa. Nessa sala, as telas mostram todos os aviões que estão voando no país. Na outra, ficam os controladores de vôo cuidando do tráfego aéreo. A maioria dos controladores fica nesses centros, e não nos aeroportos. Os que trabalham nos aeroportos são responsáveis por pousos e decolagens, e lá está a maior parte dos controladores civis. Além disso, os controladores também utilizam os serviços da Aeronáutica de meteorologia, cartografia e aferição dos equipamentos. Tudo isso posto, caso o governo decidir desmilitarizar, será preciso ter um gasto ainda não calculado. O contingenciamento das tarifas aeronáuticas tem impedido investimentos necessários. A informação é de que chegam a R$2 bilhões retidos. Há também decisões controversas. Uma delas, a de ampliação do Aeroporto de Congonhas. A obra já havia sido desaconselhada pelo antigo DAC. A Infraero só realizou a reforma do terminal, mas não cuidou da pista - que fecha toda vez que chove muito. E pior: as obras no terminal avançaram na direção da pista, reduzindo o tamanho do pátio de estacionamento de aeronaves além do que é permitido pelas normas internacionais. Por enquanto, as soluções são mais do mesmo: convocar os controladores que estão na reserva - alguns já estão até trabalhando, e outros estão sendo chamados. - Nestes casos, é preciso ter um grande banco de reservas. Alguns se aposentaram ainda jovens e estão preparados para reassumir funções - contou-me o deputado Beto Albuquerque. Outra decisão é a contratação de estrangeiros, mas, no governo, diz-se que não podem ser dos Estados Unidos ou de outros países com os quais haja "barreira da língua". Portanto teriam que ser da América do Sul. Segundo uma fonte, o Itamaraty já estaria em contato com embaixadas da região para viabilizar esse reforço externo. Pouco provável que seja viável. Quem conhece os militares brasileiros sabe que eles temem qualquer compartilhamento de informação com estrangeiro. Seja americano ou argentino. Ao contrário do que passou a sustentar agora o governo, a crise vai além do problema dos controladores. Quando estiver completamente resolvida a questão militar, mesmo quando estiver completo o quadro de efetivos e reservas do controle aéreo, o país terá problemas no transporte aéreo de passageiros. O problema do controle é só a ponta mais aguda e visível desta crise. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, abril 04, 2007
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