Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 10, 2007

Míriam Leitão - Descendo a ladeira



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
10/4/2007

A moeda americana está em queda contra a maioria das moedas do mundo. Uma das razões é o enorme déficit americano em transações correntes, um rombo de US$900 bilhões. Outra, o excesso de liquidez mundial. Nenhum dos dois motivos externos está prestes a mudar. Internamente, as razões para a queda do dólar também vão continuar: grande saldo comercial, investimentos externos, sobra da moeda estrangeira.

Por isso, o dólar deve continuar fraco. Aqui e no resto do mundo. Mas o real tem subido mais que outras moedas.

- O mundo tem tido um crescimento muito vigoroso desde que houve a queda forte da taxa de juros americana. Isso empurrou os termos de troca em favor de países como o Brasil, produtores de commodities. Por outro lado, o país não cresce e, por isso, importa pouco. O resultado é que recebe um fluxo forte de dólares, mas continua muito fechado, com pouca saída de dólar. Assim, o real é uma das moedas mais valorizadas no mundo - diz o economista José Alfredo Lamy, sócio da Cenário Investimentos.

Alexandre Maia, da Gap Asset Management, acha que o real vai continuar refletindo o "choque" de preços a favor:

- O preço dos produtos que o Brasil exporta tem subido mais que o dos produtos que o país importa. Ou seja, mesmo com esse crescimento maior das importações, há um choque positivo no preço, que atrai ainda mais dólares para o país.

O ciclo de expansão do mundo tem produzido, segundo Lamy, uma enorme distorção:

- Não existe mais risco no mundo. Todos os países estão com risco em queda; a maioria absoluta deles está em crescimento. Todos os gestores de política econômica, por mais besteiras que façam, continuam colhendo bons resultados e se julgando gênios. Veja os casos de Kirchner e de Chávez. Eles têm tomado decisões erradas, mas devem achar que estão fazendo tudo certo. No Brasil, não há sinal de reformas ou de qualquer medida para resolver os problemas estruturais, estamos em pleno colapso logístico, mas o risco-país só faz cair - comenta.

O excesso de liquidez tem produzido o efeito de o mercado sancionar tudo. O rombo persistente nas contas externas americanas dá uma razão estrutural para a queda do dólar frente às moedas dos países que financiam seu déficit (veja gráfico abaixo).

Mesmo alguns países que, na conta dos 12 meses, estão com sua moeda perdendo valor frente ao dólar, estão em alta este ano. A lira turca, por exemplo, cai, em 12 meses, 2% em relação ao dólar, mas, no ano, sobe 3,65%, apesar dos problemas políticos e monetários.

Ontem o dólar recuperou terreno frente ao euro e ficou estável em relação ao iene, por força das boas notícias sobre mercado de trabalho nos Estados Unidos. Mas a tendência tem sido de perda de valor. A libra subiu 12,7% e o euro 10,4% frente ao dólar em 12 meses.

No Brasil, o fato de a dívida/PIB ter caído pela revisão da metodologia do PIB, pela acumulação das reservas, apressa a queda do risco-país e valoriza ainda mais a moeda nacional.

- Em qualquer país, o risco está encolhendo. O do Brasil também. O temor que eu tenho é que, quando houver uma correção, pode ser muito forte. Nos dois episódios de correção recente, perdeu-se, em dois, três dias, o ganho de dois meses. Isso porque o mercado fica no oba-oba, mas ele sabe que várias distorções estão se acumulando na economia internacional - alerta Lamy.

Por enquanto, não há nada que possa reverter a queda do dólar frente ao real. Pelo contrário: o Brasil continua sendo beneficiado pelo ciclo de expansão mundial. Por ora, a tendência é de que o dólar permaneça descendo a ladeira.

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