Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, abril 12, 2007

Lula impera



Editorial
O Estado de S. Paulo
12/4/2007

Tudo que vai bem no Brasil se deve ao presidente Lula. Nada do que vá mal é por culpa dele. Essa parece ser, reduzida aos seus termos essenciais, a percepção hoje dominante no País, a julgar pela recém-divulgada pesquisa CNT/Sensus segundo a qual perto de dois terços dos brasileiros (63,7% dos entrevistados) aprovam o desempenho presidencial. Na série histórica desse levantamento, Lula só se saiu melhor no ano inaugural do primeiro mandato, quando a avaliação positiva de seu comportamento no Planalto beirou 80%.
Tamanha a dissociação entre a sua figura, envolta numa aura imaculada, e o descalabro oficial conhecido pela esmagadora maioria da população - o amaldiçoado apagão aéreo que vem irrompendo aos surtos desde outubro passado - que apenas um quarto das 2 mil pessoas ouvidas na sondagem realizada no começo do mês apontou o governo federal como o principal responsável pela crise (como se a patética incapacidade de resolvê-la pudesse ser debitada a outrem).
Por qualquer ângulo que se encarem os resultados da pesquisa, Lula impera, soberano. No segundo turno da eleição de 2006, quando enfrentou o tucano Geraldo Alckmin, teve contra si 39% do eleitorado (pelo critério dos votos válidos). Cinco meses depois, o antilulismo definha a olhos vistos. Só 28% desaprovam a atuação do presidente.
Menor ainda (25%) é o contingente dos que acham que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o totem por excelência do segundo mandato, não vai ajudar o País a crescer.
Decerto devem ser aqueles mesmos brasileiros que culpam o Planalto pelo caos na aviação. Reciprocamente, embora 59% dos entrevistados confessem que não ouviram falar do PAC, 58% apostam no seu êxito. Pudera: se vem de Lula, boa coisa há de ser. Outros dados sustentam a hipótese de que, para o grosso da população, Lula é Lula e o resto é o resto. Por exemplo, nada além de 5% das pessoas confiam no poder público (o governo como instituição), menos do que na Igreja, Forças Armadas, meios de comunicação e Justiça, nessa ordem. E apenas 1 em 100 confia no Congresso.
O presidente só tem a lucrar com isso. Os burocratas e os políticos, uns e outros malvistos, encarnam por definição o estorvo que ele, no imaginário popular, dá tudo de si para remover na sua heróica jornada por um Brasil como nunca antes se viu - especialmente para os pobres. É o mesmo julgamento que afinal prevaleceu quando se esgotou o escândalo do mensalão: digam o que disserem, Lula tem as mãos limpas e, se não erradica a política corrupta, ou é porque não há força humana capaz de fazê-lo ou é porque ele depende dos políticos, corruptos ou não, para levar adiante os seus planos de progresso econômico e social.
A entronização do presidente deriva de um conjunto de fatores que já fizeram valer a sua influência na definição do voto popular em 2006. Por menos que o País tenha crescido, a duradoura fase excepcional por que passa a economia no mundo, sem nada parecido com as sucessivas crises que cobraram alto preço do Brasil entre 1994 e 1998, foi decisiva para o governo domar a inflação, especialmente no caso dos bens de consumo de massa, aumentando em conseqüência o poder aquisitivo das classes de renda mais baixa. E o povo não tem nenhum motivo para ser pessimista em relação a isso e ao nível de emprego.
Além disso, mais do que nunca, Lula, o sortudo, monopoliza o chamado discurso público. Desde o seu superlativo triunfo na batalha por mais quatro anos no Planalto, a oposição, se não se escafedeu do palco nacional, perdeu o eixo e a credibilidade - com a agravante de não oferecer à sociedade um contraponto efetivo ao lulismo, na forma de uma liderança com uma mensagem diversa e consistente, e uma fração que seja do carisma de Lula. De mais a mais, os seus dois maiores nomes com efetivo poder político, o governador paulista José Serra e o seu homólogo mineiro Aécio Neves, não têm a mais remota intenção de aparecer na ribalta antagonizando o presidente. Por razões administrativas, hoje, e eleitorais, quem sabe, amanhã.
Coroando tudo, o Bolsa-Família mantém Lula firme nas nuvens. Afinal, 57% dos brasileiros ou conhecem algum beneficiário da política social do governo (42%) ou eles mesmos são os beneficiários (15%). Precisa mais?

Arquivo do blog