Entrevista:O Estado inteligente

domingo, abril 08, 2007

João Ubaldo Ribeiro Devaneios governamentais



Imagino que agora, depois de seis meses em que o presidente ordena que o apagão desapague sem que nada aconteça, o dito apagão não seja mais problema, até porque o presidente deixou que outros dessem as ordens e - são essas coisas curiosas da vida - aí as ordens foram atendidas. Mas não entendo bem dessas altas questões e só sei é que, em toda essa crise de quem a principal culpada deve ter sido a imprensa, o governo ainda teve tempo de pensar na área cultural e ofereceu um espetáculo muito superior a qualquer clássico dos Três Patetas (no governo há muito mais de três, vivemos uma era de fartura). Continuamos na venturosa posição de este ano não termos governo até o momento e, por conseguinte, também não termos de que nos queixar. Ninguém pode alegar que ele está fazendo alguma coisa e, por conseguinte, não há ações a criticar.

Até porque, leio nas folhas que, depois que o presidente aprendeu que os generais não têm por hábito chamar os sargentos de 'companheiros sargentos', passou a ocupar-se de outras questões, entre as quais avulta o deslanchar impetuoso do PAC. E as folhas dizem também que a fuzarca desenvolvimentesca (novos tempos, novos termos) vai começar por estes dias, com intensa campanha de propaganda para divulgar que o PAC vai fazer e acontecer. Isso é muito necessário, para obter a compreensão e o apoio do povo, tanto assim que, novamente conto o que leio nos jornais, a verba de propaganda é bem maior do que a destinada ao principal projeto de educação. Pode não ter governo, mas propaganda do governo tem - não se pode querer tudo ao mesmo tempo, dr. Waldir Pires já disse, tem que ter paciência.

Aqui do meu cantinho, resolvi fazer a minha parte. Quando o novo governo começar, espero que levem em conta um projeto que bolei aqui e que coincide com uma das mais importantes áreas da criação de empregos do governo, ou seja, cargos e colocações públicas. Estava eu vendo um noticiário de televisão, quando apareceu a história de uma moça americana que havia acusado um rapaz de estupro porque ela, embora por iniciativa própria, tinha bebido demais e o rapaz - como direi? - foi lá. O juiz disse né-né, que ela bebera porque quisera e não tinha havido estupro nenhum.

Mas isso suscita justificadas preocupações, porque gostamos de fazer tudo o que fazem nos Estados Unidos e essa delicada área ainda não está regulamentada no Brasil. Mas, ao mesmo tempo, a chance de sairmos na frente de outras nações outra vez. Minha idéia é a criação do Ministério da Cópula e do Acasalamento, destinado não só a gerar milhares de empregos na burocracia federal, como a zelar por aspectos de nossa conduta inexplicavelmente negligenciados até chegar o maior governo da História deste país. Aqui no Brasil se transa de maneira desordenada, vamos reconhecer que é uma esculhambação e assim nunca vamos entrar para o Primeiro Mundo.

Ninguém quer proibir que se transe. O que se quer é que se transe de forma construtiva e em consonância com os interesses do País, que, no caso, são muitos. O primeiro, já disse, é a criação de empregos. O segundo, não menos importante, é dar uma posição digna à d. Marta Suplicy, que, na sua condição de sexóloga conceituada, estará bem melhor na nova pasta do que a que arranjaram para ela. E o terceiro é nos dar uma posição de vanguarda em estatísticas das mais completas sobre o assunto, proporcionando avanços científicos ainda inimagináveis, desde o combate a doenças sexualmente transmissíveis ao controle de natalidade.

Todo brasileiro ou brasileira que desejasse, matrimonialmente ou apenas em relações eventuais, ter uma vida sexual seria obrigado a tirar e portar a Carteira Nacional de Copulador(a), que seria concedida mediante a apresentação de alguns documentos essenciais, desde atestado negativo para uma lista pré-definida de doenças, até o cadastro obtido após um exame psicotécnico (conhecido pelos maldosos como o psicotoque) e o preenchimento de extenso formulário, cobrindo preferências de parceiros, fetiches, perversões, problemas, posições favoritas e peculiaridades especiais. Creio que isso levaria a carteiras de Copulador(a) A, B, C e assim por diante, passando a ser obrigatória a sua apresentação à entrada de motéis, hotéis e mesmo edifícios de apartamento, a critério da administração. Para não falar que copular sem carteira renderá multas e perda de pontos, até a temível cassação - medida dura (ou mole, conforme o caso), porém necessária para o pleno funcionamento do sistema. E a cartilha seria absolutamente sigilosa, exceto por um paloccismo ou outro, mas isso acontece.

A ação educativa seria naturalmente complementada pela Cartilha do(a) Copulador(a) (a Cópula Participativa ficaria restrita às comunidades especialmente licenciadas), que traria lições de fácil compreensão para a realização da conjunção carnal conforme os melhores princípios e técnicas aceitáveis pela Carta de Caracas, assinada em conjunto pelos presidentes da Venezuela, Argentina, Equador, Colômbia, Paraguai e Bolívia e, embaixo, pelo Brasil. Espera-se que Chávez, o Redentor da América, contribua com a tão esperada revelação da famosa Paso del Perro Loco, posição afamadíssima, mas guardada a sete chaves por quem já a experimentou. Ou que Morales mostre sua famosa técnica do Puede-Carcar-Que-Les-Gusta.

Bem, sei que vocês hão de estar achando que escrevi uma porção de bobagens de quem não sabe o que fazer. Está certo, posso até concordar. Mas por que somente eu? Vocês por acaso não têm percebido que a última moda neste país é não saber o que fazer?

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