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O Conselho de Ética da Câmara está preparando o arquivamento do pedido de reabertura dos processos por quebra de decoro parlamentar contra deputados reeleitos, envolvidos nos escândalos do mensalão e dos sanguessugas.
Com isso, será revogado o precedente estabelecido na legislatura passada quando o então deputado Pinheiro Landim renunciou, depois de reeleito, às vésperas da retomada de um processo por venda de habeas-corpus a traficantes. O Legislativo firmará, assim, o conceito de que o voto anistia qualquer crime, antes mesmo da investigação.
A trama anda passando mais ou menos despercebida por causa da predominância de assuntos como a crise aérea, a CPI do apagão e a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de definir os partidos como titulares dos mandatos parlamentares.
Enquanto há luz sobre esses temas, a penumbra em volta permite que o arquivamento prospere sem reações nem repercussão negativa.
O caso é o seguinte: logo no início da legislatura, o PSOL representou ao Conselho de Ética pedindo que fossem reabertos os processos dos deputados Valdemar da Costa Neto e Paulo Rocha, que renunciaram para não correr o risco de serem cassados por causa das denúncias do mensalão. Pediu também a retomada do caso do deputado João Magalhães, cujo processo não prosperou porque a legislatura terminou.
O presidente do conselho, Ricardo Izar, postergou por 18 dias o envio das representações à Mesa Diretora da Câmara e agora resolveu suspender a tramitação delas até que seja respondida uma consulta feita pelos líderes do PT, PR, PP e PMDB, o grosso da base governista.
Digno de nota é o teor das três perguntas da tal consulta, elaborada de maneira explicitamente direcionada para a obtenção das respostas que permitam a legitimação do arquivamento.
Primeira pergunta: “É admissível a instauração de procedimento disciplinar contra parlamentar quando o fundamento da representação for baseado em ato ou procedimento - supostamente ocorrido no momento anterior a processo eleitoral que confirma novo mandato - ampla e suficientemente divulgado e debatido pelas autoridades competentes nos foros próprios e de conhecimento dos cidadãos à época do pleito?”
O truque aqui reside em considerar todos os fatos de “amplo e suficiente” conhecimento do eleitor que, portanto, votou consciente, perdoou o deputado e resolveu premiá-lo com a renovação do mandato, como veremos na pergunta seguinte.
Ei-la: “Tal hipótese (a reabertura dos processos) não configuraria constrangimento ao exercício do mandato, em flagrante subversão dos preceitos constitucionais e à vontade expressa pelo povo nas urnas?”
Terceira pergunta: “Essa mesma hipótese não encontraria óbice regimental no disposto no Artigo 2º do Código de Ética e Decoro Parlamentar, na medida em que iria de encontro à vontade do eleitor e, conseqüentemente, à garantia do pleno exercício do mandato parlamentar?”
Quer dizer, não é uma consulta no sentido estrito do termo. Trata-se antes do enunciado de uma tese à qual os líderes do PT, PP, PR e PMDB aguardam apenas que o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, chancele com sua assinatura de aceitação.
É como diz, em síntese, o deputado Chico Alencar: “A Câmara não quer investigar nada e o Conselho de Ética, firmada essa ‘jurisprudência’, tende a ficar ocioso. Não chega a ser uma ‘pizzaria’, mas uma...‘marcenaria’. Está se construindo ali uma grande gaveta, destino de quantas denúncias vierem relembrando situações não investigadas do passado recente”.
Dos grandes partidos de oposição, PSDB e Democratas, nem o mais leve sussurro se ouviu. E pelo rumo da carruagem, nem se ouvirá nada contra essa ação de solidariedade mútua em que o governo mostra a cara e a oposição vende a alma.
Anos de vida
Quinta-feira, dia 5, comemorou-se o primeiro aniversário de conclusão da CPI dos Correios com grande indignação pela falta de punição dos envolvidos e até de conclusão das investigações.
Má vontade com o escândalo do mensalão, tanta cobrança assim.
Em matéria de aniversário, há outros mais longevos: o caso Waldomiro Diniz, por exemplo. Já fez três anos - mais exatamente três anos e dois meses - e nada até agora se concluiu a respeito de uma denúncia de extorsão cujo flagrante foi filmado e exibido em rede nacional de televisão.
A madrinha
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, é conhecida nos bastidores da crise da aviação como a fada-madrinha dos controladores de vôo.
Dilma Rousseff é tida por eles como avalista de suas posições dentro do governo. Tanto que, no ápice do apagão total do dia 30, pediram para negociar com Dilma.
Na Aeronáutica - a quem a ministra transferiu publicamente a responsabilidade pela solução da crise logo depois de ser nomeada pelo presidente Lula a gerente do grupo interministerial formado para cuidar do assunto - ela é vista como antagonista dos militares.