Entrevista:O Estado inteligente

domingo, abril 15, 2007

As ocas promessas do governo

O governo federal, na gestão Lula, é um patrão de quem o líder metalúrgico de tempos idos em nenhuma hipótese compraria um carro usado, tantas as provas de sua prontidão para lograr os interlocutores ou parceiros em potencial. Em mais de uma circunstância, de caso pensado, o presidente faz ou autoriza que se façam promessas de aumentos salariais a setores do serviço público que não podem ser cumpridas. A promessa, ou melhor, a embromação, é uma jogada afinal pueril para exorcizar momentaneamente insatisfações funcionais a caminho do ponto de ebulição. Pressupõe que, abrandado o fogo da hora, a mobilização pelas demandas tenderá a arrefecer com o tempo - e, se ressurgir, sempre será possível fabricar novos artifícios para neutralizá-la.

Exemplo disso foi o teatro montado pelo Planalto para se desvencilhar de um compromisso assumido com todas as letras - e números - pelo então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Em fevereiro do ano passado, ele prometeu por escrito ao Grupo de Entidades Representativas de Classe (Gerc), da Polícia Federal, que a corporação teria 60% de aumento, em duas parcelas iguais. Os primeiros 30% foram, de fato, autorizados em julho - como parte do polêmico pacote de bondades de R$ 7,7 bilhões, dirigidas a diferentes categorias do funcionalismo. A segunda parcela ficou para ser quitada em dezembro. Mas, àquela altura, já reeleito, Lula preferiu olhar para o outro lado, como se nada tivesse com a palavra empenhada daquele seu ministro que sabe perfeitamente o que significa a expressão latina pacta sunt servanda.

Com a sua paciência se esgarçando - e o justificado receio de que o governo quer passar-lhes um calote disfarçado de contingenciamento -, os federais decidiram, na última semana de março, fazer uma greve de advertência de 24 horas, que afetou 25 das 27 superintendências regionais do órgão, com as conseqüências de praxe: travamento de 38 mil inquéritos, suspensão da emissão de 7 mil passaportes e por aí. A idéia de promover nos aeroportos uma operação-padrão só não foi adiante porque os delegados concluíram sensatamente que isso seria escarnecer dos passageiros já submetidos ao intermitente apagão aéreo. O Planalto, de seu lado, produziu uma nova promessa - a de que os dirigentes da Federação Nacional dos Policiais Federais seriam recebidos dia 10, no Ministério do Planejamento, para novos entendimentos.

Mas este é um governo que não se envergonha de sua pequenez. Sob a patética alegação de que determinado técnico da Pasta viajara a São Paulo, a reunião com o titular Paulo Bernardo foi transferida para o dia 11. “Adiaram uma vez. Outro adiamento não vão poder”, reagiu um exasperado presidente da federação, Marcos Vinício Wink. “Uma hora vão ter que definir.” Definir, porém, é um termo que o lulismo baniu de Brasília faz tempo - em relação a seja lá o que for. Também dia 11 não houve reunião com os funcionários.

Para ficar apenas na área das reivindicações do funcionalismo, o passa-moleque e a indefinição empilham um problema sobre outro. Na semana passada, foi a vez de funcionários do Banco Central fazerem uma greve de advertência. Eles querem equiparação dos salários de nível superior com os dos auditores da Receita, que recebem cerca de 40% a mais. Seu último reajuste, de 10%, data de 2005.

Também os militares estão cientes de que o governo quer embromá-los. O novo comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura Neto, se queixa abertamente do soldo dos camaradas. As Forças Armadas, diz, são “a carreira de Estado mais mal paga do Executivo”. Em recente entrevista a este jornal, ele reconheceu que houve uma melhora no primeiro mandato, mas lembrou que ainda está para ser coberto um resíduo inflacionário de 7%. Absteve-se, naturalmente, de aludir às ocas promessas presidenciais na matéria. O cúmulo da desmoralização da palavra oficial, como se sabe, foi a volta atrás no caso dos controladores de vôo amotinados. Tendo-lhes prometido o céu, Lula renegou tudo para apaziguar os militares. O presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais resume bem toda a situação: “Não cumprir os compromissos acordados está se tornando um hábito do governo federal, que decepciona até os mais otimistas.”

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