Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, agosto 31, 2006

PCC e licença para matar


Artigo - José Rodrigo Rodriguez
Gazeta Mercantil
31/8/2006

O problema não é criar exceções, é saber qual a aceitável. Em 29 de junho deste ano a Suprema Corte dos EUA decidiu que Salim Ahmed Hamdan, prisioneiro de Guantânamo, tem direito a habeas corpus e à proteção da Convenção de Genebra, negados por uma lei aprovada durante o governo Bush. Também afirmou que o governo agiu ilicitamente ao submetê-lo a uma comissão militar criada especialmente para tratar dos prisioneiros de Guantânamo. Afinal, seus crimes tiveram lugar antes de ela existir. Além disso, considerou ilícita a criação da comissão. Dentre seus poderes, estava a possibilidade de aceitar qualquer prova, inclusive depoimentos obtidos sob tortura, e manter sob sigilo fatos e provas reunidas para incriminar os acusados.
A decisão foi um golpe na política de combate ao terrorismo de Bush. Sua estratégia inclui a criação de medidas excepcionais para diminuir a proteção de direitos fundamentais e facilitar a investigação e a punição dos culpados. Esta estratégia não é invenção americana. Na Europa e na América Latina, fala-se de um Direito e de um Processo Penal com "velocidade" distinta, mais rápida e com menos garantias, aplicável a crimes como o terrorismo.
É fácil para um democrata recuar horrorizado diante de propostas assim. Ainda mais em nosso País que não fez o dever de casa no combate ao crime organizado e enfrenta problemas de corrupção policial e judicial. Mesmo assim, é preciso engolir em seco e refletir antes de desqualificar a criação de exceções às regras. Não se trata de defender a política de segurança do agente 007: licença para matar. Mas é preciso avaliar a eficácia de algumas regras "normais". Nosso ordenamento está repleto de exceções à regra. A defesa da mediação e conciliação na esfera penal e a extinção da punibilidade de crimes tributários pelo pagamento são dois exemplos. O problema não é criar exceções, mas saber quais delas são aceitáveis. Ainda: é preciso diferenciar regimes de exceção, como o de Guantânamo, de medidas pontuais. Estas, podem ser defensáveis sob certas circunstâncias.
Bruce Ackermann, professor de Direito de Yale, insuspeito de qualquer simpatia por Bush, lançou este ano "Before the Next Attack". O livro defende a criação de um regime constitucional de emergência, altamente vigiado e controlado. Não se trata de abrir mão de garantias e direitos fundamentais, mas de dotar a democracia de poderes para lidar com o problema do terrorismo. Diante da proposta, o leitor tem pelo menos duas opções. Pode concluir que se trata da obra de um traidor da democracia ou pensá-la como uma resposta à retórica governamental da "guerra" ao terrorismo. O terreno é escorregadio e, por isso mesmo, a coragem do livro deve ser louvada
O debate irá avançar quando pararmos de pensar em abstrato e falar por slogans. Melhor discutir medidas concretas. Por exemplo: os líderes do PCC devem poder comunicar-se sigilosamente com seus advogados e familiares? Como impedir que a prisão se torne o quartel general do crime? Deve-se proibir a comunicação desses prisioneiros com o mundo exterior? É claro que não, mas talvez submetê-la à vigilância de autoridades, sob a fiscalização da OAB, com dever de sigilo absoluto, exceto sobre o eventual planejamento de ações ilícitas.
Adotar medidas que destoam das regras gerais é tapar o sol com a peneira? É dar poderes demais a um Estado despreparado para lidar com o problema? Pode ser. Mas mesmo em Estados ricos, medidas assim têm sido adotadas. Há versões autoritárias, como nos EUA. Resta saber se é possível e necessário pensar em outras.
Para um democrata é inaceitável pensar a exceção como ação trivial e secreta das autoridades. Mas é razoável pensar em casos restritos e controlados democraticamente. Para fazer avançar o debate é preciso seguir o exemplo de Ackermann e pensar para além do trivial. Assim, seremos capazes de refletir por outro viés, sem abandonar a defesa da democracia. O incômodo que sentiremos ao nos arriscar para além de argumentos conhecidos leva o nome de filosofia.

Palavras ao vento


EDITORIAL
Folha de S. Paulo
31/8/2006

Programa de governo do PT nada diz; discurso que muda conforme a platéia costuma preceder estelionato eleitoral

FICOU CELEBRIZADA a reação do então ministro da Fazenda Mário Henrique Simonsen ao ser indagado sobre o 2º Plano Nacional de Desenvolvimento, que acabara de ser lançado pelo governo de Ernesto Geisel: "Não leio ficção". Qualificar de ficção o autodenominado programa de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgado na terça-feira, seria elogioso. As 30 páginas poderiam ser resumidas a uma só, em branco, tamanho o grau de generalidade do que expressam.
Abaixar os juros, ampliar o gasto social, aumentar os investimentos públicos e privados, acelerar o crescimento do PIB, fortalecer o SUS e universalizar o ensino básico são metas que estão no universo semântico da cura do câncer: todos são a favor.
Mas, além de empenhar-se em trazer a Copa do Mundo de futebol de 2014 para o Brasil, a que projetos, especificamente, uma hipotética segunda gestão Lula dedicaria suas energias para a consecução de ao menos parte daqueles nobres objetivos?
A essa questão, que deveria ser o ponto de partida para a confecção de qualquer programa de governo, o texto do PT não responde. De onde sairão os recursos para o desejado aumento dos dispêndios sociais? Que fundos sustentarão a ampliação do gasto federal em infra-estrutura, hoje em níveis pífios? É possível fazer os dois ao mesmo tempo, dado o patamar asfixiante da carga tributária e da dívida pública?
O programa de governo de Lula marca um retrocesso em relação ao que o próprio candidato havia afirmado há uma semana, em discurso no Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Lá, diante de empresários, expressou a necessidade de "diminuir as despesas de custeio" do Estado, bem como o peso dos impostos no país.
Muda a platéia, muda o discurso. Para agradar empreendedores, corte de gasto e de impostos; para afagar a militância petista, aumento de despesa e arroubos retóricos contra a "privataria" da era tucana. Para não perder votos de ninguém, cobrado ontem acerca do assunto, Lula voltou a prometer carga fiscal mais baixa.
Em política, uma campanha "customizada" -como se diz no jargão em voga-, ao gosto de cada freguês, é apenas a ante-sala do logro, do estelionato eleitoral. Não favorece o amadurecimento da democracia a estratégia em que o candidato despista o eleitorado ao longo da campanha para depois de eleito explicitar a que interesses irá desagradar.
De acordo com o Datafolha, Lula teria mais de 60 milhões de votos caso a eleição fosse hoje. Se dá valor às palavras "transparência" e "ética" -que insiste em pronunciar a torto e a direito mesmo após o mensalão ter-lhe varrido as cúpulas do governo e do partido-, o candidato à reeleição deveria explicitar o que pretende fazer com tamanho capital eleitoral. Deveria ser o primeiro interessado em participar de debates e entrevistas.
Lula, porém, foge o quanto pode desse compromisso com a evolução das instituições políticas. Seu séquito continua a tratá-lo como um ídolo religioso, que não pode ser profanado.

O FGTS e os fundos de Lula 2006 vinícius Torres Freire

O FGTS e os fundos de Lula 2006

Artigo -
Folha de S. Paulo
31/8/2006

Governo planeja aumentar investimento com dinheiro do Fundo; problema é quem controla o risco do negócio

O DINHEIRO do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço é barato. Relativamente barato para quem consegue um empréstimo via FGTS. Caro para quem tem fundos trancados lá, corrigidos à taxa de 3% mais TR (uns 2%). Por lei, o FGTS financia basicamente habitação popular e saneamento.
Desde junho, o governo pensa em dirigir parte do Fundo para investimentos em ferrovias, estradas, portos, aeroportos e energia elétrica. Anteontem, obteve um aval simbólico do conselho curador do FGTS para um projeto de lei que muda a destinação de parte dos recursos "livres" para investimento do Fundo, cerca de R$ 21 bilhões. O programa de governo de Lula menciona a criação de "fundos setoriais" para bancar infra-estrutura e investimentos em indústrias de longa maturação.
Se os fundos do FGTS financiam gente pobre, o subsídio implícito é compreensível. De outro modo, os empréstimos via Fundo teriam de render mais para os trabalhadores, com garantia de risco ao menos semelhante à dos empréstimos para casas e esgoto.
O plano do governo Lula é permitir que os trabalhadores virem cotistas de fundos de investimento em negócios de infra-estrutura. Outra parte do dinheiro financiaria 30% dos empreendimentos. Motivo: os investimentos públicos estão à míngua por causa do aumento de gastos, da lei fiscal e do superávit primário. O FGTS seria uma alternativa atraente para investimentos: não exigiria mais controle de despesas.
No caso de eventuais perdas, a conta não cairia no Tesouro, mas na dos trabalhadores e de seu Fundo de Garantia. Nos anos 80 e 90, empréstimos com dinheiro do FGTS acabaram em calotes monstruosos, bancados pelo Tesouro. Subsidiaram compra de casas pelo Sistema Financeiro da Habitação. Estados e municípios tomaram recursos via FGTS. O calote, em valores de 2001, foi de R$ 34 bilhões.
Mas a polêmica não pára aí.
Os representantes da Confederação Nacional do Comércio e da Confederação Nacional da Indústria (CNI) votaram contra a inovação do governo no conselho curador (tripartite, composto de oito membros do governo, quatro de associações empresariais e quatro de centrais sindicais). Motivo: riscos financeiros e desvio de finalidade.
O representante da CNI vem sempre da construção civil. Agora é Roberto Kaufmann, presidente do sindicato da indústria da construção do Rio. Kaufmann diz que as garantias de investimentos em infra-estrutura são menores que as das obras em habitação, as quais de resto, seriam socialmente prioritárias.
O dinheiro do Fundo para crédito imobiliário está dobrando este ano, para R$ 10 bilhões. Foram de R$ 5 bilhões em 2005. A indústria da construção civil está contente, mas quer R$ 15 bilhões anuais e que a maior parte vá para obras novas, não para imóveis usados e material de construção. Sobraria pouco para os fundos de infra-estrutura de Lula.
O problema é: quem banca e controla o risco? A parte do FGTS que seria utilizada para o investimento não compromete o dinheiro devido aos trabalhadores. Mas, se uma ferrovia for à breca, como o foram algumas privatizadas? Vai haver socialização de prejuízos?
vinit@uol.com.br

Lula e a mídia


Editorial
O Estado de S. Paulo
31/8/2006

Sem dúvida beneficiado por ter feito um discurso lido, sem acréscimos improvisados, o pronunciamento do presidente Lula na abertura do 6º Congresso Brasileiro de Jornais, terça-feira, em São Paulo, teve uma precisão conceitual irretocável, ao estabelecer o valor da liberdade de expressão e a conexão profunda entre a livre imprensa e a democracia. Mas, como quase sempre acontece, as palavras do presidente não corresponderam - infelizmente - à realidade dos fatos, no que diz respeito a seu próprio governo.
Disse o presidente: "O Estado democrático só existe, se consolida e se fortalece com uma imprensa livre (...) A liberdade de expressão foi uma das maiores conquistas históricas da sociedade humana. E é um dos bens mais preciosos da vida social (...) Nossa legislação impede qualquer forma de censura. O Estado tem se pautado por não causar qualquer tipo de interferência nos meios de comunicação social." E o presidente disse mais, que "o único juiz da atuação da imprensa é a própria população", que "ela, sim, consegue ver se os problemas do seu cotidiano estão ou não representados nas notícias e nos debates que são veiculados pelos meios de comunicação, e sabe reconhecer quando o jornalismo é, de fato, a grande praça pública onde sua voz pode ser ouvida".
Sob o ponto de vista institucional, até pelo fato de a sociedade brasileira já ter sofrido severas censuras de ditaduras, nossa legislação é muito mais anticensória do que a de muitas democracias que nunca passaram por períodos de cerceamento à liberdade de expressão. Mas, suspensa a censura do regime militar, foi somente no governo Lula que se tentou, por duas vezes (e mais uma terceira, como veremos), criar-se limitações à plena liberdade de expressão, sob diferentes roupagens ou disfarces.
A primeira tentativa foi a de criação do famigerado Conselho Federal de Jornalismo (CFJ), projeto enviado pelo governo Lula à Câmara dos Deputados, destinado a "orientar, disciplinar e fiscalizar" o exercício da profissão e a atividade de jornalismo, inclusive compoderes de punir jornalistas. O governo recuou nesse propósito, graças ao firme repúdio da opinião pública, que repercutiu no Congresso.
A segunda tentativa foi a da criação da também famigerada Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) - entidade com poderes discricionários sobre a regulamentação e controle do cinema, televisão, TV por assinatura, rádio e demais empresas de modalidade audiovisual, em qualquer formato. O espírito autoritário - para não dizer totalitário - de tal projeto foi prontamente detectado e, mais uma vez, foi rechaçada a imposição de cerceamento à liberdade de expressão no País. Agora, no assim intitulado "Programa de Governo", divulgado na campanha reeleitoral, se afirma que num novo mandato presidencial Lula "incentivará a criação de sistema democrático de comunicação, favorecendo a democratização da produção, da circulação e do acesso aos conteúdos pela população".
O problema é que, ao achar, corretamente, que "o único juiz da atuação da imprensa é a própria população", um presidente eleito por essa população dá a impressão de que se sente no direito de decidir ele próprio "se os problemas do seu cotidiano estão ou não representados nas notícias e nos debates que são veiculados pelos meios de comunicação".
Ante esse sinal de perigo, não dá para deixar de relacionar a idéia de setores do PT, de construir uma cadeia de jornais regionais que apóie as "idéias populares" do governo, e o plano de apoio publicitário (da Casa Civil e da Secretaria de Comunicação Institucional, há dois anos) a jornais de periferia afinados com o Planalto, com a incisiva acusação do coordenador do programa de governo do presidente Lula, Marco Aurélio Garcia, contra "alguns" formadores de opinião do País - que chamou de "golpistas" e "deformadores de opinião". Para deixar por menos, já conhecemos bem esse filme.
Em sua fala na ANJ, Lula reconheceu que "sua história política deve muito à imprensa", referindo-se ao apoio que teve da mídia como líder sindical.
Esqueceu, no entanto, do apoio que tem obtido da mídia em toda a sua carreira, posto que jamais, "neste país", homem público algum ocupou tamanho espaço nos veículos de comunicação, principalmente como presidente.

Barrado na festa Rolf Kuntz


artigo -
O Estado de S. Paulo
31/8/2006

O Brasil está fora da próxima redistribuição de cotas - e do correspondente poder de voto - anunciada pelo diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), o espanhol Rodrigo de Rato. China, Coréia do Sul, México e Turquia serão os premiados nessa rodada, primeiro passo de uma reforma da instituição. O governo brasileiro esperneou nos últimos dois anos para ser incluído na lista, mas o esforço, até agora, não deu certo. Desde os anos 90 a reputação brasileira melhorou muito, entre os dirigentes e os grupos de maior influência nas principais instituições financeiras internacionais. Mas durante 20 anos o País cresceu muito menos que outros emergentes e isso tem um preço político.
O FMI está em busca de um novo papel na economia mundial. Continuará a ser um emprestador de última instância, mas deverá dedicar-se muito mais à prevenção de crises do que às funções de pronto-socorro. Deverá reforçar seu trabalho de coleta e distribuição de informações e de análises sobre o estado da economia mundial. Seus dirigentes ambicionam transformá-lo num centro de orientação e de articulação de políticas.
Mas a instituição precisa também reforçar sua legitimidade.
A redistribuição de cotas e de votos é parte dessa tarefa. Será preciso dar maior peso às economias em desenvolvimento. Mas, para começar, será necessário reconhecer a importância relativa conquistada nas últimas décadas por algumas economias.
A extensão da mudança é desconhecida, por enquanto, e ainda vai depender de negociações.
Para começar, haverá uma redistribuição ad hoc para correção de algumas distorções mais evidentes. A China tem apenas 2,94% dos votos, embora sua economia seja maior que a da Itália e pouco menor que a da França. O México tem 1,20%, a Coréia, 0,76% e a Turquia, 0,45%. O Brasil tem 1,41% dos votos, embora sua economia, pelas medidas oficiais, tenha o dobro do tamanho da belga. Mas a Bélgica tem uma participação bem maior, 2,13%.
O Brasil nunca foi mencionado pelos dirigentes do Fundo nas discussões sobre a primeira redistribuição de cotas. Aparentemente, Publishsó há uma explicação para isso: nos últimos 20 anos, o País perdeu posições na economia global, enquanto outros emergentes avançaram.
Entre 1990 e 2004, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro aumentou 30,7%, segundo as medidas convencionais. No mesmo período, a economia chinesa cresceu 444,7%, de acordo com a tabela divulgada em abril deste ano pelo Banco Mundial. A Coréia acumulou uma expansão de 157,7% nesses 14 anos, com desempenho igual ao mexicano (157,5%). Enquanto isso, a Turquia dobrou sua produção.
Em 1990, China, Coréia e México tinham economias menores que a brasileira, pelos padrões tradicionais de cálculo.
Em 2004, cada uma das três havia superado o Brasil. Nesse ano, o PIB brasileiro chegou a US$ 604 bilhões. O da China alcançou US$ 1,93 trilhão, o da Coréia, US$ 679,7 bilhões, e o do México, US$ 676,5 bilhões. A Turquia continuava atrás, com US$ 302,8 bilhões, mas havia partido, em 1990, de apenas US$ 150,6 bilhões.
Os analistas têm apresentado explicações variadas para a diferença entre o desempenho desses países e o do Brasil. Mas alguns pontos parecem fora de dúvida. Todos esses países tiveram, na maior parte do tempo, economias menos instáveis que a brasileira. Alguns enfrentaram crises, mas conseguiram vencê-las mais prontamente.
Não atravessaram períodos tão longos de inflação (com exceção da Turquia), exibiram condições fiscais mais favoráveis e deram mais atenção ao comércio externo.
Entre 1990 e 2004, o valor das exportações brasileiras aumentou 207,1%. A receita chinesa das vendas ao exterior cresceu 855,6%. A coreana, 290,4%. A mexicana, 364,4%. A turca expandiu-se 387,1%.
O governo brasileiro só começou a cuidar seriamente da inflação em 1994, quando abandonou, apesar da forte oposição de alguns grupos, o recurso a soluções mágicas. A arrumação fiscal, ainda hoje incompleta, só começou para valer a partir da renegociação das dívidas de Estados, da primeira reforma da Previdência e da aprovação de leis para disciplinar as finanças públicas. A abertura da economia começou nos anos 90 e isso permitiu notáveis ganhos de produtividade, mas seus efeitos só se tornaram mais sensíveis a partir da mudança cambial de 1999.
Os efeitos dessas mudanças ainda estão sendo colhidos, mas é preciso completar o trabalho para destravar de uma vez a economia. O resto é pensamento mágico.

A reação irracional da Bolívia à EBX Raphael de Almeida Magalhães



Artigo -
Gazeta Mercantil
31/8/2006

O projeto siderúrgico da empresa brasileira interessa à economia boliviana. A polêmica em torno do projeto siderúrgico da EBX na Bolívia oferece um campo de observação sedutor para a projetada integração econômica da América do Sul, que o imbróglio da Petrobras, muito mais complexo, não deve obscurecer. Mesmo porque, do ponto de vista estrutural, sob a ótica dos interesses da Bolívia, o projeto da EBX talvez atenda melhor a economia boliviana que o da Petrobras.
Os investimentos da EBX são vultosos em comparação com os dados básicos da economia boliviana: na fase inicial, investimento de US$ 150 milhões, construção de quatro altos-fornos para a produção de ferro-gusa para mercados bolivianos e externos, sendo que as duas primeiras unidades estão em fase final de teste. E na segunda fase, vencida a etapa da implantação das usinas de ferro-gusa e disciplinada adequadamente a questão do suprimento da base energética do projeto, a EBX contempla a possibilidade da implantação, em território boliviano, de uma siderúrgica para a produção de aços longos.
A produção desta usina se destinará, em parte, para o mercado externo e parte para o próprio mercado boliviano, constituindo-se, na verdade, em plataforma essencial para um programa de industrialização do espaço econômico boliviano, equivalente ao papel desempenhado pela Companhia Siderúrgica Nacional na história econômica brasileira. Inicialmente, os altos-fornos processarão minério de ferro brasileiro da jazida da MMX, vinculada à EBX, situada no Estado do Mato Grosso do Sul.
A grande novidade do projeto, do ponto de vista estrutural, é agregar valor industrial ao minério brasileiro no espaço econômico boliviano e não no próprio espaço brasileiro, como é usual. É uma iniciativa que pode se converter em paradigma para uma efetiva integração econômica da América do Sul: o valor unitário de minério exportado do Brasil é de US$ 40 a tonelada, enquanto o valor unitário do ferro-gusa exportado do Brasil é de US$ 275, sendo a totalidade do valor agregado apropriado pela economia boliviana.
Ao lado desta vantagem, o projeto utilizará carvão de origem vegetal na conversão do minério de ferro em ferro-gusa, visando, de novo, a tornar-se um paradigma para projetos siderúrgicos ambientalmente inquestionáveis, segundo os mais rigorosos critérios técnicos e aproveitando, sempre, insumos bolivianos.
Os insumos florestais, base energética do projeto, serão providos por produtores bolivianos. Na etapa inicial, vendendo resíduos florestais existentes em áreas certificadas pelas autoridades bolivianas. Posteriormente, para garantir em termos permanentes o suprimento de carvão para sustentação do projeto, serão desenvolvidos, pela EBX, em articulação com os produtores florestais locais, amplos programas de reflorestamento, garantindo a siderúrgica aos produtores locais assistência técnica e financeira, além de mercado para a produção e comercialização deste insumo energético fundamental.
A concepção técnica do projeto, pela combinação da agregação de valor industrial na Bolívia e utilização de recursos energéticos não-poluentes providos por recursos florestais bolivianos, é profundamente inovadora em relação a outros projetos de ferro-gusa e terá, sem dúvida, amplo apoio até mesmo dos mais radicais grupos ambientalistas e se habilitará aos fundos financeiros instituídos para projetos que capturem carbono.
A geração de emprego prevista nos projetos florestais e siderúrgicos é estimada em cinco mil empregos permanentes nos programas florestais e de 300 empregos na siderurgia.
É difícil, assim, compreender as razões do governo boliviano para condenar o projeto, tendo-o como nocivo ao país. A alegada agressão ao meio ambiente não é procedente, uma vez que o projeto se espelha em similares projetos no Brasil que utilizam insumos florestais como redutor de minérios. Os exemplos mais recentes são as usinas da Mannesman e da Vale do Rio Doce; a primeira instalada no centro de Belo Horizonte e a outra no Pará. Projetos que foram financiados pelos fundos internacionais destinados a projetos que seqüestram carbono da atmosfera e o chamado mecanismo de desmonte ou limpo - MDS.
Sou ardoroso e histórico defensor de projetos produtivos que integram, economicamente, a América do Sul. Por isso, espero que o governo da Bolívia, vencida a suspeita que levantou em torno do projeto e esclarecida a questão do meio ambiente, acolha o projeto da EBX, que é, econômica e socialmente, útil para o país. Poderá servir de paradigma para iniciativas empresariais brasileiras e bolivianas, que integrem a América do Sul, usando, em cada caso, em benefício comum, os insumos que cada qual dispõe, além de organizar, como no caso da EBX, projetos integrados que beneficiem, equilibradamente, as duas economias, a detentora da matéria-prima e a que detém o mercado, exatamente como é o caso da empresa brasileira.

A marca deles é a crise Plínio Fraga


Artigo -
Folha de S. Paulo
31/8/2006

O excelente documentário da americana Rachel Boyton "Bolívia: História de uma Crise", ainda em cartaz no Rio e em São Paulo, tem um título original mais cifrado, mas mais criativo e provocador do que o da versão brasileira. "Our Brand is Crisis" deve ser traduzido para algo como "crise é nossa marca".
O documentário acompanha o passo a passo da campanha à Presidência da Bolívia de Gonzalo Sánchez de Lozada, o Goni. Na década de 90, marcou sua gestão administrativa por privatizações e abertura ao capital estrangeiro.
Em 2002, mal nas pesquisas e com alta rejeição, Goni tentava voltar à Presidência. Como saída, contratou o marqueteiro James Carville, que já deu palpites aqui em campanhas de Paulo Maluf e FHC.
Na Bolívia, Carville e sua equipe conseguiram virar uma disputa que parecia perdida, prometendo suprir os anseios do eleitor mais do que atender as necessidades do país. Goni foi reeleito, mas ficou sete meses no poder, sendo obrigado a renunciar em meio a uma crise social e política conturbada, com mais de cem mortos em protestos. O filme termina com o ex-presidente exilado em Washington, de onde assistiu à vitória de Evo Morales, no pleito de sua sucessão.
O problema dos marqueteiros é que não poupam nem a mãe para vencer. Não resolvem problemas, como abordá-los na campanha. Depois passam o pepino adiante.
Um dos mais badalados marqueteiros brasileiros respondeu certa vez a uma questão prosaica. Um homem de 40 anos ainda vivia com a mãe e tinha sua imagem no universo feminino prejudicada cada vez que tocava no tema. "Pare de dizer que você mora com sua mãe. Diga que sua mãe mora com você." Antes dependente, agora provedor. A situação da mãe não mudou, mas o discurso ficou muito melhor.

A conta não fecha


EDITORIAL
O Globo
31/8/2006

O documento apresentado pelo PT com as diretrizes de um eventual segundo governo Lula não escapa à síndrome da onipotência, muito comum aos textos desse tipo divulgados em campanhas eleitorais. O mundo visto pelas lentes desses documentos encharcados de ideologia, mas disfarçados de exercícios acadêmicos, é um mundo previsível, sob controle e prestes a distribuir bondades sem qualquer custo ----, a não ser o de ir às urnas e votar no candidato certo.

O próprio presidente-candidato, ao separar o que são as "bravatas" oposicionistas dos imperativos do mais importante cargo executivo da República, já demonstrou saber que na vida real não é bem assim. Isso não impediu que o PT listasse um rosário de intenções - nem todas boas -, cuja execução se assemelha a um cavalo que parte a galope em todas as direções. Em 30 páginas, o partido, com os aliados PCdoB e PRB, expõe um projeto de governo que não fica de pé, por desafiar leis como a da gravidade. Quer o PT, ao mesmo tempo, expandir os gastos públicos, e por diversas formas - pelo custeio (salário mínimo, Bolsa Família etc.) e pelos investimentos -, reduzir a carga tributária e ainda cortar os juros. Assim como a adversária Heloísa Helena, os petistas confiam na redução da taxa básica do Banco Central (Selic) como fonte de financiamento da multiplicação milagrosa dos gastos.

Impossível, pois, como os juros não obedecem a ordens de qualquer burocracia, o resultado da expansão dos gastos será a manutenção das taxas em níveis altos. É isso ou a volta com força da inflação, além do risco de fuga de divisas.

No plano político, o programa parece investir contra a cláusula de barreira quando propõe "(...) assegurar a pluralidade de partidos". Mas, ao mesmo tempo, defende a "( ...) construção de maiorias necessárias à governabilidade". Se de fato for intenção do PT trabalhar para reduzir a cláusula de barreira, o partido terá produzido outra incongruência. Afinal, "maiorias necessárias à governabilidade" não rimam com pulverização partidária.

PT e Lula têm protagonizado uma crônica de desencontros. Pode ser que este seja mais um, e o programa venha a ter a importância num segundo mandato proporcional ao tamanho com que a estrela do partido aparece na campanha da reeleição.

Míriam Leitão - 'Bate, doutor'


Panorama Econômico
O Globo
31/8/2006

O candidato Geraldo Alckmin tem números e fatos na cabeça e recorre com freqüência à sua bem-sucedida experiência administrativa, mas ainda não tem programa. No calor da reta final, ainda não demonstra paixão. Quando alguém pergunta por um motivo para voltar para o Brasil, ele fala em política econômica. Quando tem os dez minutos finais para encerrar seu pensamento, ele conta uma história de Pindamonhangaba, que nem o favorece. E Alckmin mesmo conta que tem ouvido nas ruas um pedido: "Bate, doutor".

É incompreensível um candidato de oposição não ter ainda alinhavado idéias do que propõe como alternativa ao povo ao qual pede votos. Por isso eu quis saber do candidato do PSDB-PFL por que alguém que lutou tanto para ser candidato não tem, a esta altura, um conjunto de idéias e propostas em nome das quais se candidatou.

Ele disse que o programa será divulgado nos próximos dias em capítulos.

Ao responder a Cora Rónai, Alckmin deu um escorregão: disse que José Serra perdeu a eleição em 2002 porque o povo queria crescimento e emprego. Jorge Bastos Moreno quis saber se era isso mesmo que ele tinha dito e ele confirmou: "É verdade."

O candidato contou que tem ouvido de eleitores o mesmo pedido:

- Bate, doutor.

Ele acha que isso é prova de que a rua está virando; não vê como sinal de que deva mudar de estratégia de campanha por um tom mais agressivo. Disse que não é assim e prefere fazer propostas. Mas quais são elas, afinal?

Alckmin promete um ajuste fiscal como fez em São Paulo, dizendo que isso permitirá a redução da carga tributária e da taxa de juros. Com o aumento do investimento, o país vai crescer num ritmo maior e isso criará um círculo virtuoso.

Na entrevista do "Jornal da Globo", na segunda-feira, quando confrontado com a pergunta sobre de onde tiraria o dinheiro para ampliar programas como o Bolsa Família, ele respondeu que cada ponto de queda da taxa de juros significa R$8 bilhões não gastos.

Essa é a mesma proposta da candidata Heloísa Helena: a queda dos juros produz dinheiro para todos os projetos. Perguntei se ele era contra a autonomia do Banco Central.

- Eu sou a favor da independência do Banco Central - disse, e explicou que a queda dos juros será conseqüência de uma política fiscal mais austera que ele colocará em prática.

- O programa do Lula é um engodo, e ele está avisando lá que vai aumentar os gastos - alertou e, nesse ponto, está coberto de razão. Derruba-se a taxa de juros como conseqüência de uma política fiscal mais dura, e o PT está avisando que sua proposta é de aumentar os gastos.

Alckmin tem boas histórias de corte de gastos e de combate ao desvio de recursos públicos.

- O que é o sanguessuga? É superfaturar o preço da ambulância comprada pelo poder público. Como se resolve isso? Com leilão eletrônico. Economizamos R$4 bilhões em três anos e meio. O governo queria comprar carros, avisava as montadoras, elas davam lances num leilão reverso e conseguimos uma redução de 25% no preço.

Numa das histórias que contou do seu tempo de candidato a prefeito, Alckmin revelou que seu pai o criticou pelos ataques aos adversários:

- Ele me disse que os possíveis equívocos dos meus adversários não aumentariam em nada as minhas qualidades. E eu guardei isso.

Uma lição paternal sábia para várias ocasiões da vida, mas o momento - que ele mesmo define como sendo de desencanto com a política - exige mostrar os erros do governo para se reconstruir a confiança na política.

Em um bom momento, Alckmin falou com desenvoltura e simpatia de um livro médico, recomendando a luz do sol da manhã como saudável e estabilizadora.

Durante toda a entrevista citou, como contou o Ancelmo Gois, seis vezes Mário Covas, e o PSDB quase não recebeu referências. Ele é um candidato de uma ala do partido, ainda não reuniu o partido inteiro.

A Flávia Oliveira, disse que fará a reforma tributária e contou, de novo, decisões que tomou em São Paulo, onde reduziu impostos e aumentou a arrecadação.

A Tereza Cruvinel, avisou que não aceita a proposta de união com Lula.

- Numa eleição, o vencedor governa e o perdedor fiscaliza. Gosto das coisas bem separadas.

Na questão da segurança, ele tem, de fato, bons números. Conta que fez sete presídios de segurança máxima; enquanto o governo federal fez um. Abriu, junto com Mário Covas, 70 mil vagas no sistema prisional; e o governo federal, apenas 30. Os números são bons, mas não apagam a sensação de piora da questão da segurança que vem do cotidiano de medo da população de São Paulo após os ataques do PCC.

Alckmin demonstra conhecimento administrativo, afinal governar bem São Paulo é uma experiência como a de governar um país, mas lhe falta paixão e senso de oportunidade como candidato.

Quando um leitor perguntou, pela internet, que razão o candidato lhe daria para voltar a morar no Brasil, era a hora ideal para o discurso apaixonado pelo país que todo candidato que se propõe a ser presidente tem de ter. Ele deu uma resposta burocrática, repetindo receitas de política econômica. Quando o assunto é corrupção, às vezes, constrói frases sem sujeito. Faz tudo para fechar seus ouvidos ao conselho que ouve na rua: "Bate, doutor."

Merval Pereira - Ainda com fé na virada



O Globo
31/8/2006

Para quem está a ponto de perder no primeiro turno, o candidato tucano Geraldo Alckmin demonstra uma estranha fé na capacidade de alterar o quadro e chegar ao segundo turno contra Lula, o que seria um resultado que, por si só, já mudaria o panorama da corrida presidencial. Para um candidato que, como Lula, age como vencedor e já escolhe os ministros para o segundo mandato, seria um baque, até mesmo psicológico, ter que disputar um segundo turno. A certeza de Alckmin está baseada no ambiente das ruas, que já está mudando, disse ele ontem, na entrevista do GLOBO, mas também, e sobretudo, em um aparato tecnológico de pesquisas que indica que ele hoje está mais próximo dos 30% das intenções de voto do que dos 27% apontados no último Datafolha.

Pela análise da equipe de campanha, se Alckmin atingir 32%, haverá segundo turno, desde que Heloísa Helena se mantenha na faixa de 10% em que está. O perigo é que ela desabe daqui para a frente. No acompanhamento de pesquisas, Lula teria hoje perto de 45% das intenções de voto, e não 51%, como apontado pelo Datafolha. A explicação para essa diferença seria que o espalhamento das suas pesquisas é menor que o da campanha de Alckmin, que faz pesquisas em 480 cidades em todo o país com duas mil entrevistas, enquanto o Datafolha faz entrevistas em 175 cidades, e o Ibope em cerca de 150.

A coordenação da campanha de Alckmin tem um tracking (pesquisa telefônica) de mil entrevistas todo dia, saídas de uma amostra inteira de duas mil entrevistas que vão sendo substituídas. Considerado muito rápido pelos técnicos, o instrumento mede a tendência do eleitorado de um dia para o outro e detecta qualquer mudança de humor, muito mais do que as pesquisas eleitorais dos institutos, que demoram, entre fazer o campo de pesquisa e tabular, cerca de cinco dias.

Há um outro tracking de três dias, e outro de quatro dias, para complementar as informações. Além disso, há pesquisas qualitativas em sete estados, sobre o programa de televisão, feitas por um sistema inglês de medição da reação do telespectador.

A entrada do locutor no programa de terça-feira relembrando as acusações de corrupção contra o governo Lula "passou tranqüilo", na definição dos técnicos em comunicação da campanha de Alckmin, com um detalhe curioso: dos sete estados, só em São Paulo o locutor foi identificado com a campanha de Alckmin.

Mesmo que, com o passar dos programas, esse tipo de intervenção volte a ser usado e identificado imediatamente com o tucano, não haverá problemas porque "a essência da crítica foi bem-recebida", está no limite da aceitação pelo eleitorado, o que é a grande preocupação dos coordenadores de comunicação da campanha.

Apesar de ressaltarem que desde o primeiro programa Alckmin faz reparos ao governo Lula, seus comunicadores dosam os ataques para não ferir a suscetibilidade dos eleitores. Um exemplo define bem os cuidados: vou à sua casa pedir um favor (o seu voto), chego lá e começo a falar mal de uma pessoa de quem você gosta.

A estratégia até o momento não mudará, como o próprio candidato revelou ontem. A intenção é criar a imagem do candidato junto ao eleitorado, e não simplesmente torná-lo conhecido. O objetivo é torná-lo conhecido pelas qualidades certas para levar o eleitor a mudar seu voto com segurança. Pelos cálculos de Alckmin, Lula hoje tem cerca de dez pontos percentuais que não são dele, são eleitores que estão com ele porque não conhecem o outro candidato, não têm certeza de que ele seja bom.

A propaganda pretende criar no eleitor a idéia de que há uma alternativa, que não é arriscada. Convencê-lo, ao menos, de que os dois são bons, para depois, no segundo turno, marcar a diferença. Alckmin insiste em que a campanha ainda mal começou, e contou experiências suas e do ex-governador Mario Covas de virar campanhas eleitorais somente a poucos dias da eleição.

Distorções das pesquisas eleitorais foram lembradas por Alckmin, como em 2002, em que, no dia da eleição, os institutos de pesquisa apontavam quase um empate triplo na disputa ao governo de São Paulo. Ao abrirem as urnas, deu 38% para Alckmin, 32% para José Genoino e 21% para Maluf.

Pelos grupos qualitativos, há a certeza na campanha de Alckmin de que sua candidatura cresce, sendo mais bem avaliada em todos os sete estados nos últimos dias. Todos os atributos do tucano melhoraram, e ultrapassaram os de Lula, à exceção de dois. Hoje Alckmin já seria visto como o que tem mais capacidade para governar; o mais sincero; com mais condições de melhorar o sistema de saúde e de criar empregos. Lula ainda é visto como o candidato que tem mais visão dos problemas nacionais, e o que entende mais o problema dos pobres.

Alckmin e seus marqueteiros esperam uma subida lenta, mas firme, que deverá ser detectada pelas pesquisas por volta do dia 15 de setembro. E especulam sobre qual será a reação de Lula no momento em que sua queda - que eles garantem já ser detectável - for apontada pelas pesquisas. Mas continuam apostando mesmo é nas urnas de 1º de outubro.

Só lá saberemos com certeza se essas informações não passam de factóides, caracterizando o "estelionato eleitoral" de que falei ontem ou, ao contrário, retratam uma campanha de marketing tão competente que desbancou o que Alckmin classificou ontem de "uso descarado da máquina pública" em favor da reeleição do presidente Lula.

Jânio de Freitas - Da boca para fora



Folha de S. Paulo
31/8/2006

O "programa" lançado por Lula retoma com mais agressividade seu escapismo no assunto corrupção

O NÍVEL de sinceridade na disputa pela Presidência teve uma pequena melhora, com os ataques desferidos por Lula, Alckmin e Fernando Henrique, como expressão, afinal, de sentimentos pessoais evidentemente reprimidos. Mas os respectivos argumentos em nada atenuaram a mediocridade, que já parece sem remédio, da atual campanha. O acerto da pontaria é feito com desrespeito acintoso aos fatos e ao eleitor.
O "programa" lançado por Lula, sem programa algum e apenas para cumprir uma formalidade, retoma com mais agressividade o seu escapismo no assunto corrupção: "como podem falar de ética os autores da privataria/que engavetaram denúncias na Justiça/[abafaram] dezenas CPIs"? Por maior que possa ser a procedência desse questionamento, não leva os erros graves de ontem a anular os graves erros de hoje. Nem os desculpam. Os erros do PT e de integrantes da cúpula do governo, inclusive do círculo do Planalto, continuam sem receber de Lula uma palavra decente ao eleitorado, sem inverdades e artimanhas.
Caso este último, mais uma vez, da declaração que Lula acrescentou ao lançamento do "programa": "No meu governo é assim, não tem sujeira embaixo do tapete, doa a quem doer. Denunciem tudo o que for, que nós vamos apurar." As atitudes do PT no Congresso são todas orientadas pela Presidência. Com maior freqüência, sem reserva alguma. E o PT lutou de todos os modos para evitar as CPIs dos Correios, dos Bingos e do Mensalão. Nelas, lutou ferozmente para impedir e, quando impossível fazê-lo, para dificultar a apuração dos fatos e de suas autorias. As CPIs só se instalaram porque a Presidência da República, o PT e a chamada base do governo foram derrotados. Logo se viu que havia motivos fortes para tal resistência, e melhor faria Lula se a eles se referisse quando diz que "no meu governo é assim".
Na exaltada reação às referências do "programa" de Lula ao seu governo, Fernando Henrique fez a observação correta de que "não adianta dizer que o sistema é culpado. O sistema tem muitos erros, mas moral é conduta, é pessoal, é individual. Quem falha tem que ser punido porque falhou." Poderia desenvolver a observação, com muita utilidade. Preferiu outra via: "Quando há desvio ou alguma coisa equivocada, ele [Lula, claro] passa a mão na cabeça e diz que o companheiro errou. Não. O senhor errou, porque não puniu o companheiro. Isso precisa ser dito e cobrado".
Como precisa ser dito e cobrado, também, que isso mesmo foi feito no governo Fernando Henrique. Flagrado e gravado ao fazer tráfico de influência em benefício de empresa estrangeira, dentro mesmo do Planalto, o embaixador Júlio Cesar Santos recebeu na cabeça a mão protetora do presidente e, ainda mais, o presente de uma embaixada em Roma. Os que avançaram no "limite da responsabilidade", para manipular privatizações, e tantos outros, saíram incólumes do risco de CPIs, por ação direta da Presidência.
A sinceridade melhorou um pouco, mas em mão única.

Eliane Cantanhede - No mesmo saco




Folha de S. Paulo
31/8/2006

O senador Antero Paes de Barros está para o escândalo dos sanguessugas assim como o também senador Eduardo Azeredo está para o do mensalão. Eles metem o PSDB no saco de acusados e minam o discurso ético da oposição.
Azeredo, que presidiu o PSDB, é uma espécie de prova viva de que o esquema Marcos Valério começou para o financiamento de campanha de tucanos em Minas e só depois evoluiu para uma central do PT e do governo Lula para a compra de partidos e de votos no Congresso.
Antero foi da CPI do Banestado e da CPI dos Bingos, é titular do Conselho de Ética do Senado e entrou no último lote (três parlamentares) da extensa lista de suspeitos sanguessugas. Tornou-se mais uma dor de cabeça para Alckmin.
Azeredo é emblemático pelo alto cargo e por dividir as culpas do valerioduto. Antero, porque, além de virulento acusador dos petistas nos seus cargos do Senado, passa a ser o único tucano incluído na CPI dos Sanguessugas. O outro, um deputado, desligou-se do partido.
Ontem, o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, reuniu-se longamente com tucanos. Imaginava-se que para discutir as pesquisas, a campanha ou o oportunismo do governador Lúcio Alcântara (CE), que aderiu a Lula no Planalto a dias da eleição. Nada disso. Um dos maiores problemas dos tucanos é Antero, que entrou em cena num capítulo eletrizante da campanha: justamente quando Alckmin e os tucanos decidiram abrir guerra contra Lula e o PT.
As armas de Alckmin são cuecas, Land Rover, Dirceu, Palocci, Delúbio, Silvinho, Waldomiro e por aí afora. Mas bastam um só Azeredo e um só Antero para o ricochete. E para legitimar o pretexto de artista que antes pregava a ética e agora quer votar em Lula: não dá para fazer política sem... sujar a mão. Tradução: são todos iguais.(Embora para um analista isento não seja isso,é o que fica-th)

Dora Kramer - ´Voto aberto protege eleitor´



O Estado de S. Paulo
31/8/2006

Até pouco tempo atrás, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, não era um entusiasta do fim do voto secreto nas sessões do Parlamento. Para os casos de cassações, por exemplo, não tinha certeza de que o voto aberto seria garantia de punição. Ao contrário, poderia inibir suas excelências diante dos colegas acusados.
Isso quando ainda o corporativismo se sobrepunha a quaisquer outros valores dentro do Poder Legislativo.
Mas hoje o presidente da Câmara pensa diferente.
Tantas o Congresso fez que o quadro se inverteu: "A publicidade de voto passou a ser uma proteção para o eleitor e uma forma de o Parlamento dar à sociedade alguma resposta na direção da recuperação de sua credibilidade.
As coisa coisas chegaram a um tal ponto que é preciso fazer um gesto." Ou seja, o fundo do poço venceu a racionalidade dos critérios que nos primórdios justificavam a existência do voto secreto para o deputado e o senador. "Na origem, foi criado para proteger o parlamentar do arbítrio do rei e, depois, no regime militar, a regra permaneceu para preservar a independência do deputado e senador do poder discricionário."
Note-se que o voto secreto não é exigido só para cassações. Vale para punições, mas vale também para a escolha de diretores de agências reguladoras, embaixadores, presidentes do Banco Central, conselheiros do Tribunal de Contas da União e, mais importante, para a votação de vetos presidenciais a projetos aprovados pelo Legislativo.
Em tese, Aldo Rebelo acha que a manutenção do sigilo para todos esses outros casos seria o ideal, excetuandose apenas as cassações, porque não existe um perfeito equilíbrio entre Poderes em matéria de independência.
Com o fim do voto secreto para tudo - que é a proposta considerada mais adequada pelo presidente da Câmara -, Rebelo vê a possibilidade de aumentar a "vigilância" do Executivo sobre o Legislativo naquelas outras questões. A derrubada de um veto presidencial, por exemplo, que já é difícil, ficaria praticamente impossível.
Agora, como todo o Congresso foi submetido a um grau de suspeição jamais visto, o presidente da Câmara não vê outro jeito senão a extinção radical do sigilo do voto. "Se a população reduz a sua confiança no Parlamento, a única atitude possível é esse mesmo Parlamento dar a maior publicidade possível a todos os seus atos." No limite, Aldo Rebelo considera que até essa publicidade servirá de proteção ao deputado e ao senador contra intenções autoritárias e controladoras por parte do governo.
A questão crucial que se impõe agora é: vai dar realmente para votar o fim do voto secreto na semana que vem, como pretende o presidente da Câmara? Há três ou quatro meses ele responderia negativamente a essa pergunta. "Fiz uma consulta aos líderes partidários que ficaram de ouvir suas bancadas e até hoje estou esperando as respostas."


Aldo Rebelo acha que o sigilo no Parlamento hoje só favorece o compadrio

A CPI dos Sanguessugas, entretanto, funcionou assim como a gota d´água que faz transbordar a represa da insatisfação social. Câmara e Senado envolvidos em acusações de roubalheira explícita é, de fato, uma situação insustentável.
Tanto que a mesma consulta feita dias atrás àqueles líderes resultou em aceitação, senão plena, ao menos majoritária. PP, PL e PTB ainda estão hesitantes, mas PMDB, PSDB, PT, PFL, PPS, PSOL, PC do B e PV dispuseram-se a votar simbolicamente as 20 medidas provisórias que trancam a pauta para dar espaço à emenda constitucional de extinção do voto secreto.
Fica faltando o governo retirar a urgência de alguns projetos para criar as condições regimentais exigidas. Na semana que vem, se alguém obstruir a votação simbólica das MPs ou se o Planalto não cumprir o acordo na retirada das urgências, ficará claro quem não quer o fim do voto secreto.
Se aprovado, os sanguessugas já irão para o plenário sob a nova regra. "Nem todos, alguns, se reeleitos, terão os processos reabertos na próxima legislatura", diz Aldo Rebelo.
E o voto aberto bastará para garantir as punições? "Nos casos mais escandalosos, sem dúvida. Hoje já há uma convicção interna de que o corporativismo funciona contra a instituição que mexe com a vida de todo mundo e precisa ter credibilidade, sob pena de perder sua razão de ser."

Uma vez basta
Aldo Rebelo nega as especulações segundo as quais estaria se preparando para disputar a reeleição à presidência da Câmara, tal como fará o presidente do Senado, valendo-se da regra segundo a qual pode haver um novo mandato em legislaturas diferentes.
Rebelo acha que para ele disputar mais dois anos de presidência faltam as condições objetivas: sustentação de um grande partido (ele é do PC do B) e força junto ao Palácio do Planalto, que o elegeu da outra vez, numa situação peculiar, mas agora vai, na visão dele, preferir outro tipo de entendimento em conformidade com as necessidades da nova base parlamentar. "Em torno do afilhado é que se faz o compadre", ensina, ciente de que não é mais o afilhado da vez.

Clóvis Rossi - Desfazendo a herança Lula



Folha de S. Paulo
31/8/2006

A crise da Volkswagen -ou, mais exatamente, de sua unidade de São Bernardo do Campo, particularmente emblemática- acaba sendo todo um compêndio sobre a evolução da economia global e a involução do sindicalismo e da ação governamental.
Nos anos 70/início dos 80, o sindicalismo, graças em grande medida à liderança de Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, obteve ganhos notáveis em salários e condições de trabalho para certos setores operários. Ganhos que se prolongaram no tempo, a ponto de o salário de um operário metalúrgico de São Bernardo estar hoje, na média, em R$ 3.600, mais que o dobro do que se paga em unidades do Paraná (perto de R$ 1.650).
Até 2001, quando a situação já havia mudado, mas a liderança sindical ainda estava no sindicato, Luiz Marinho, hoje ministro, obteve da Volks um acordo que permitiu a manutenção dos empregos por cinco anos.
Agora, no entanto, a correlação de forças mudou tanto que André Beer, ex-presidente da Anfavea (a associação dos fabricantes de veículos), diz a Lilian Witte Fibe (Uol News) que quem faz acordo assim "não está bem da cabeça".
Por quê? Simples: nas condições presentes do capitalismo global, a ordem é produzir cada vez mais com cada vez menos gente. Demitir em penca, portanto. Nem Luiz Marinho nem Lula, agora no governo, podem fazer algo, como faziam antigamente. E nem é culpa deles, a não ser pelo fato de que, ou não acompanharam, ou não entenderam a mudança do jogo, pró-capital. Ainda mais pró-capital do que habitualmente.
Vai piorar mais, prevê Beer: "Quando vierem [em dois ou três anos] as montadoras chinesas, salve-se quem puder". Há algum candidato por aí que tenha idéia de como salvar quem puder ser salvo?

Celso Ming - Parcimônia adiada




O Estado de S. Paulo
31/8/2006

Ocorte de 0,5 ponto porcentual nos juros básicos, que agora estão a 14,25% ao ano, adiou a série da parcimônia que o Banco Central vinha anunciando desde maio.
De setembro do ano passado até agora, o Banco Central cortou os juros em 5,50 pontos porcentuais, o que não é pouco para os padrões brasileiros.
São os juros mais baixos dos últimos 31 anos. Mesmo com mais essa tesourada, o Brasil segue entre os campeões mundiais na matéria.
A maioria dos especialistas vinha apostando em que o corte seria menor porque se apegou à idéia de que o Banco Central optaria por não provocar surpresas.
Há três anos, a autoridade monetária dá especial importância à tarefa de assegurar sintonia com o mercado.
A menos que surjam imprevistos que exijam reação rápida, esta diretoria do Banco Central parece mesmo preferir antecipar seus movimentos, cuidar de que os agentes econômicos se preparem no tempo certo para a mudança de ritmo da música e, em seguida, cumprir a tarefa sugerida a fazer um movimento mais brusco.
Esta prática de seguir o préanunciado é também um jeito de lidar com a aflição natural que se acumula a cada alteração do preço do dinheiro. Há alguns meses, a ansiedade que precedia as reuniões era tanta que deram a esse estado geral dos espíritos o apelido de TPC - Tensão pré-Copom.
Hoje, quase ninguém se lembra disso. Enfim, o Banco Central parece entender que, do ponto de vista da eficácia da política monetária, é mais importante garantir a orquestração das expectativas do que acertar em cheio na dose mais adequada dos juros.
A ata desta reunião, a ser divulgada na sexta-feira da próxima semana, deverá explicar as razões mais importantes que levaram o Banco Central a manter o corte de 0,5 ponto porcentual. Alguma indicação disso já foi adiantada no comunicado oficial divulgado logo após o término da reunião de ontem. E dá para saber quais foram as outras.
Aqui dentro, temos dois dados novos. O primeiro é o de que a expectativa de inflação para este ano caiu mais e está abaixo dos 3,7%, para a meta de inflação de 4,5%, o que vinha pedindo mais folga nos juros. O segundo é o de que toda a economia passou a trabalhar com avanço do PIB mais baixo do que os 4,0% projetados pelo governo. Uma atividade econômica mais fraca reduz os riscos de que ocorra inflação de demanda, situação que poderia exigir contra-ataque dos juros.
Na área externa, o maior risco para a política antiinflacionária do Brasil vinha da alta dos preços do petróleo e da idéia de que a inflação americana exigisse novo choque de juros. Se isso se confirmasse, seria inevitável a brusca revirada nas cotações do dólar no mercado internacional e também no câmbio interno, fator que tenderia a descarregar mais inflação na economia brasileira.
Mas também aí houve virada.
A atividade produtiva nos Estados Unidos está em desaceleração. O temor da hora é o de que se desencadeie uma recessão e não novo galope do consumo. É por isso que os preços do petróleo estão recuando acentuadamente. O West Texas Intermediate, tipo de referência negociado no mercado de Nova York, há apenas 54 dias atingiu o recorde de US$ 78,40 por barril de 159 litros. Ontem, chegou a ser negociado abaixo dos US$ 69.
A queda das cotações do petróleo reduz o reajuste dos preços internos dos derivados esperado para depois das eleições. E, se esses preços subirem menos do que se previa, a economia tenderá a produzir menos inflação nos primeiros meses de 2007.
Pode-se argumentar que o Banco Central não fixa os juros com base na inflação passada ou com a que pode acontecer ainda neste ano. Porque a política monetária tem lá seu tempo de ação e reação (que leva cerca de seis meses), o Copom tem de atuar de olho em meados de 2007, ano para o qual a meta de inflação também é de 4,5%. Mas nada se vê na cabeceira dos rios que possa produzir enchente mais abaixo. E devem ter sido esses os fatores que determinaram a decisão unânime ontem tomada.
Alguém ainda vai perguntar se o Banco Central não olhou também para as eleições e, nesse caso, estaria ajudando a criar mais confiança. Cá entre nós, do ponto de vista do candidato Lula, o Banco Central já fez muito ao garantir todo esse tombo da inflação.

Gasto com Bolsa Família cresce 60% em 1 mês

BLOG  REINALDO AZEVEDO

O Globo desta quarta traz uma matéria emblemática do que é o modo petista de governar. Os repasses para o Bolsa Família cresceram 60% em julho na comparação com junho: R$ 952 milhões contra R$ 598 milhões. O governo decidiu antecipar para julho pagamentos que deveriam ser feitos só em agosto. De janeiro a junho, os gastos com assistência social chegaram a R$ 11,5 bilhões, contra R$ 8,9 bilhões em igual período do ano passado. Como o Bolsa Família é uma ação continuada do governo, não está sujeita a qualquer restrição do período eleitoral. É o Apedeuta fazendo história Nestepaiz...

PIB ruim do trimestre também assusta o Copom E DADOS S/PIB JUROS

PIB ruim do trimestre também assusta o Copom

Além da questão eleitoreira, há uma outra razão para o corte de 0,5 ponto percentual na Selic. O PIB do segundo trimestre vem uma porcaria em relação ao trimestre anterior. E será divulgado nesta quinta-feira. Os mais otimistas falam em 1,1% de crescimento; mas há sólidas apostas em apenas 0,6%. Ainda que dê o limite superior da banda, o crescimento de 2006 será de modestos 3,6% — Lula havia falado até em 5%, depois de um crescimento de 2,3% em 2005. O próprio IPEA já reviu sua estimativa: para 3,8%. Nos primeiros quatro anos (1995-1998), a média de crescimento do governo FHC foi de 2,57% (4,22%, 2,66%, 3,27% e 0,13%); no segundo (1999-2002), de 2,09% (0,79%, 4,36%, 1,31% e 1,93%). Houve apagão em 2001 e Lulão em 2002. O petista vive os melhores quatro anos da economia mundial do pós-guerra. As exportações, no período, dobraram de tamanho; o risco país, de fato, despencou — as taxas reais de juros, no entanto, continuam estratosféricas. Se o país crescer mesmo só aqueles 3,6% (e há quem fale em 3%), o Apedeuta, numa circunstância histórica única, com países emergentes se expandindo acima de 7%, vai produzir um crescimento médio, em 4 anos, de 2,8%, a saber: 0,50%, 4,90%, 2,30% e 3,6%. Sem enfrentar uma miserável crise. Em tempo: o desempenho pífio de setores da indústria que hoje sofrem com o real valorizado e com os juros é que empurram para baixo o crescimento do país.
BLOG REINALDO AZEVEDO

quarta-feira, agosto 30, 2006

Jefferson Pérez renuncia à vida pública e critica o povo

BLOG NOBLAT

Com mais quatro anos de mandato a cumprir e a eleição para a Presidência República a disputar na condição de vice do candidato Cristovam Buarque, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) anunciou há pouco em discurso no plenário do Senado que abandonará a vida pública com a reeleição iminente de Lula.

- Estamos aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio (presidente do Tribunal Superior Eleitoral), este é o país do faz-de-conta. Estamos fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um mês recebendo sem fazer nada para o Congresso Nacional.

- Como se ter animação em um país como este com um presidente que, até poucas semanas atrás, até poucos meses atrás, era sabidamente – como o é – um presidente conivente com um dos piores escândalos de corrupção que já aconteceu neste país e este presidente está marchando para ser eleito talvez em primeiro turno?

- É desinformação da população? Não, não é. Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste país, todos concordarão ou a grande maioria que o presidente sabia de tudo; então votam nele sabendo que ele sabia. A crise ética não é só da classe política, não, parece que ela atinge grande parte da sociedade brasileira.

- Ele vai voltar porque o povo quer que ele volte. A democracia é isso. Curvo-me à vontade popular, mas inconformado. Esta será uma das eleições mais decepcionantes da minha vida. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos por parte de governantes não têm mais importância

- (...) Vou continuar protestando sempre, cumprindo o meu dever. Isso não seria justificativa para dizer que não vou fazer mais nada. Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até o último dia de mandato, mas para cá não quero mais voltar, não.

- Um país que tem um Congresso desse, que tem uma classe política dessa, que tem um povo. Senador Antonio Carlos Magalhães, dizem que político não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte da população que compactua com isso, é lamentável. E que sabe, não é por desinformação, não. E que não é só o povão, não, é parte da elite, inclusive intelectuais.

- Compactuam com isso é porque são iguais, se não piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê?, Senador Antonio Carlos Magalhães, que é um pouco mais velho do que eu e vai continuar ainda. Mas, para mim, chega.


O adeus de Jefferson Péres (II)

PSDB, PFL, PMDB e PT lamentaram a decisão de Jefferson Péres (PDT-AM) de abandonar a vida pública. Mas se ele esperava alguma demonstração de indignação coletiva, enganou-se. Os governistas não gostaram nadinha do que ele falou sobre reeleger Lula.

Cristovam Buarque (candidato à presidência)

- A que ponto chegou a política em que um homem da estatura do Jefferson Péres foi empurrado a isso. Eu entendo as razões dele. Vou dar alguns exemplos do porquê o Jefferson Péres fez um discurso como esse. Na semana passada estive em João Pessoa e um jornalista fez uma pesquisa na rua sobre em quem as pessoas iam votar. Um entrevistado disse que votaria em quem estivesse solto no dia das eleições. E teve gente que disse que ele estaria solto porque corrompeu o juiz. Depois, o pronunciamento desses artistas sobre a ética é uma das gotas d’água que levaram o senador a isso. E em terceiro: o fato de o presidente estar se colocando como eleito por antecipação. Existem formas de dar o golpe e uma delas é se anunciar vencedor antes das eleições.

Arthur Virgílio (PSDB)

- Vamos fazer de tudo para que ele não largue a vida pública. Eu entendo que não dá para culpar o povo. O povo responde ao seu processo político próprio. A gente faz política com alegria e tristeza. O povo é este, é o meu povo. O que posso fazer?

José Agripino (PFL)

- Tem dois pontos: eu lamento muito se ele insistir nessa tese porque é uma das melhores figuras do Senado. Ele está verbalizando a indignação dos homens de bem deste país. Quem sabe esse gesto venha a acordar a indignação nacional?

Ideli Salvatti (PT-SC)

O Cristovam Buarque (cabeça da chapa de Péres) vira e mexe fala algumas coisas sobre preocupação com uma tendência autoritária do governo, uma tendência chavista. Tem coisa mais autoritária do que não reconhecer a vontade da população? Ou os iluminados acham que têm a idéia mais adequada e límpida e que o povo não vale de nada?


Hélio Costa (ministro das Comunicações)

Ele é absolutamente imprescindível, é uma referência política, ética e moral e para nós é sempre a visão da seriedade. Eu espero que esse pronunciamento seja apenas um reflexo de uma candidatura que não emplacou. Mas não pode discutir uma candidatura vitoriosa do presidente Lula.

CARLOS VEREZA Artistas e a ética

 Cartas do leitores O GLOBO
 Artistas e a ética
 Os poucos artistas que foram à casa do ministro da Cultura para manifestar apoio ao presidente da República são cidadãos informados e não ignoram os escândalos e a vergonhosa rapinagem praticada pelo PT nos cofres públicos. Assim sendo, ao votarem pela segunda vez no maior farsante de toda a história política brasileira, passam da condição de eleitores à de cúmplices, conscientes da lamentável desagregação ética e moral que assola o país.

CARLOS VEREZA (por e-mail, 27/8)

Livro mostra Lula xingando Kirchner, após beber três doses de uísque

Livro mostra presidente xingando Kirchner, após beber três doses de uísque

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O "Lulinha paz e amor", essa hábil construção do marketing político, desaparece entre a terceira e a quarta dose de uísque e se transforma em uma catarata de palavrões e ofensas a presidentes e países supostamente aliados.
É o que contam Eduardo Scolese e Leonencio Nossa, que cobrem o Palácio do Planalto para, respectivamente, a Folha e "O Estado de S. Paulo", no livro "Viagens com o Presidente - Dois Repórteres no Encalço de Lula do Planalto ao Exterior".
Scolese e Nossa relatam jantar na embaixada do Brasil em Tóquio, no final de maio de 2005, presentes cerca de 20 pessoas, todos brasileiros, no qual, após beber três doses de uísque e com a quarta ao meio, o presidente diz coisas como:
"Tem horas, meus caros, que eu tenho vontade de mandar o Kirchner para a puta que o pariu".
"Aquele lá [referindo-se a Jorge Battle, então presidente do Uruguai] não é uruguaio porra nenhuma. Aquele lá foi criado nos Estados Unidos. É filhote dos americanos."
"O Chile é uma merda. O Chile é uma piada. Eles fazem os acordos lá deles com os americanos. Querem mais é que a gente se foda por aqui. Eles estão cagando para nós."
Sobrou também para os fazendeiros: "Tem que acabar com essa porra de fazendeiros que toda hora vem pedir dinheiro ao governo".
O discurso, se é que pode se dizer assim, de Lula em Tóquio se deu no exato momento em que fracassavam os esforços do governo para impedir a CPI dos Correios, aquela que acabou expondo o mensalão e levou o presidente a dizer-se traído, sem no entanto apontar os traidores.
O livro de Scolese e Nossa, que acompanham o dia-a-dia palaciano há dois e três anos, respectivamente, relata uma brincadeira dos repórteres: perguntar, nas poucas vezes em que podiam se aproximar do presidente, quem era o traidor.
"Viagens com o Presidente" tem o grande mérito de tratar Lula -e, de quebra, uma porção de ministros e assessores- como pessoa física, ao contrário do que ocorre, habitualmente, no noticiário a respeito das atividades presidenciais.
O presidente (qualquer que seja) é apresentado apenas como a pessoa que faz discursos, assina atos, inaugura obras, reúne-se com seus pares e assim por diante. Dá a impressão de que não come, não bebe, não faz pipi, sexo ou qualquer outra atividade inerente ao ser humano.
Já na sua segunda página (fora os agradecimentos, o sumário e a apresentação), os dois repórteres contam, por exemplo, o primeiro diálogo entre Lula e Fernando Henrique Cardoso, no dia seguinte à vitória do petista em 2002.
Lula: "Fernando, como você faz para dar uma escapadinha?"
FHC: "É impossível, Lula...impossível...Aqui tem ajudante-de-ordens para todos os lados".
O Lula-pessoa-física que emerge do livro tem pouco ou nada a ver com o "paz e amor" do marketing. Ironiza auxiliares, pode ser bastante ríspido com eles e usa palavrões com uma freqüência fora do comum. Os auxiliares parecem não se incomodar. Ao contrário: "Ouvir um palavrão [do presidente] pode significar status" perante Lula, contam os dois repórteres.
O livro não é nem pretende ser um retrato acabado de Lula. Até porque as conhecidas dificuldades de acesso ao presidente permeiam boa parte das páginas. Mas mostra, sim, bastidores do funcionamento da Presidência que, no cotidiano do jornalismo, acabam sendo, na melhor das hipóteses, pé de página nos jornais.

Zuenir Ventura O Globo Os reforçadores de opinião

Afinal, a sociedade em que vivemos é da informação, como tudo leva a
crer, ou da desinformação, como às vezes se desconfia? É indiscutível
que jamais as pessoas se informaram tanto quanto agora, em termos de
quantidade, rapidez e qualidade. Mas não sabe ao certo como são
recebidas as mensagens transmitidas sem cessar, a todo momento o que
aceitamos e o que rejeitamos. O debate ganhou atualidade diante de um
enigma que ainda não encontrou resposta: por que, apesar da avalanche
de denúncias da imprensa contra ele e seu governo, Lula continua à
frente das pesquisas, pelo menos até agora? Os jornalistas e
colunistas políticos mal disfarçam uma justa frustração e um certo
(re)sentimento de derrota. É como se todo o seu trabalho tivesse sido
inútil. De que adiantaram tantas críticas acusações? Quase como
consolo, costuma-se atribuir o fenômeno aos segmentos "menos
esclarecidos" da população, os que não lêem jornais.

Será que é isso? Além de ser uma alegação elitista, que lembra a
desculpa dos políticos quando perdem — a culpa é do povo, que não
sabe votar ela não se sustenta. Primeiro, porque Lula não chegou aos
50% das intenções de voto contando só com esses eleitores. Depois,
porque os tais segmentos podem não ter acesso aos jornais e à
internet, mas vêem televisão, e esta teve papel importante na
revelação dos escândalos. Não desconheciam o que a mídia divulgava.
Talvez conhecessem até demais.

Outro dia assisti a um seminário na Academia Brasileira de Letras em
que alguns colegas de profissão se dividiram quanto à questão. Houve
quem contrariasse a opinião predominante e afirmasse que, no fundo,
somos a sociedade da desinformação.

Um exemplo fez sucesso na platéia: "Se fôssemos da informação, Lula
não seria reeleito, seria preso." O debate foi proveitoso, mas não
desfez a dúvida, talvez porque o processo encerre um paradoxo.

Ao ser informativo em excesso, acaba desinformando.

A torrente de imagens, sons, palavras, idéias e conceitos emitidos
está chegando ao destino como ruído e não como mensagem. Informação
demais, como tudo, causa indigestão.

É uma hipótese. A outra é que nós, jornalistas, se não somos
irrelevantes, devemos, pelo menos, perder um pouco da nossa mania de
grandeza e da soberba de achar que fazemos a cabeça dos outros.

Em matéria de preferências políticas, há mais livre arbítrio do que
se pensa. Nada mais impróprio do que nos chamarem de "formadores de
opinião" (de minha parte, não formo nem na minha casa), quando não
somos nem "reformadores". No máximo, "reforçadores". Nunca soube de
alguém dizendo: "Penso assim, mas estou querendo mudar de idéia." Com
exceção dos indecisos, os que nos procuram é para confirmar uma
convicção, não para mudá-la.

Merval Pereira Sem alternativa


 Até o momento, e não há indicações de que alguma coisa mudará, a candidatura à Presidência de Geraldo Alckmin se configura um verdadeiro estelionato eleitoral para os que acreditaram em sua potencialidade de concorrer com o presidente Lula. O ex-governador de São Paulo montou toda uma estratégia para impor sua candidatura contra a do ex-prefeito José Serra, que aparecia nas pesquisas eleitorais como a melhor opção tucana para enfrentar Lula. Com uma suposta capacidade de inverter resultados eleitorais nas campanhas, especialmente pela televisão, Geraldo Alckmin criou tamanho embaraço dentro de seu partido que acabou inviabilizando um acordo em torno de Serra para impor-se como o “candidato natural”, a despeito das fragilidades evidentes de sua candidatura.

Os institutos de opinião, sem exceção, defenderam a tese de que Alckmin tinha uma possibilidade de crescimento muito maior que a de Serra, que atingira seu teto nas pesquisas do fim do ano passado, quando chegou a ultrapassar Lula. Ameaçando implicitamente criar uma dissidência dentro do PSDB contra a cúpula partidária e contando com pelo menos a benevolência, se não com o apoio velado dessa mesma cúpula, o ex-governador paulista conseguiu se impor como candidato, prometendo inverter a situação eleitoral “quando a novela mudasse de horário”, se referindo ao programa de propaganda gratuita no rádio e televisão.

Interesses pessoais superaram os partidários, idiossincrasias mais uma vez se impuseram no caminho da solução mais razoável, e o receio de partir para o tudo ou nada e ficar sem São Paulo e o governo federal na mesma tacada fizeram de Alckmin um candidato marcado para perder. Cristianizado já há algum tempo, muito por seus defeitos, mas também pelos defeitos de um partido que perdeu o rumo ao proteger seus membros envolvidos nos escândalos que denunciava, Alckmin está recebendo nas pesquisas eleitorais — e tudo indica que receberá nas urnas — a resposta à sua vaidade política, e corre o risco de se tornar uma figura patética ao repetir, a cada nova pesquisa desalentadora, que está em plena ascensão.

Pois quanto mais conhecido Alckmin se torna, mais rejeitado pelo eleitorado ele é, e mais empacado no mesmo lugar ele fica, sem foco e sem objetivos definidos. Do jeito que anda a coisa, sairá da eleição menor do que entrou, ou, quem sabe, do mesmo tamanho que sempre teve, um político regional que não tem a dimensão do cargo a que aspira.

Nos votos válidos da pesquisa CNT/ Sensus (descontados nulos, brancos e indecisos), Lula teria hoje 62,3%; Alckmin, 23,8%; Heloísa Helena 10,4%; e Cristovam, 1,9%.

Significa dizer que Lula já alcançou o percentual que obteve no segundo turno da eleição de 2002, de 61,3%, e Alckmin não agregou absolutamente nada à votação que Serra teve no primeiro turno de 2002, de 23,2% do eleitorado.

Se a média do PT era 30%, os números atuais significam uma derrota do PSDB como partido, que estacionou na casa dos 20% do eleitorado ou, na melhor das hipóteses, pela pesquisa Datafolha também de ontem, na faixa dos 30%.

O programa de Alckmin está bem avaliado, mas não funciona, seria eficiente para um candidato a governador, que é a experiência que ele tem. Teria que transformar Lula em Maluf, e nem tentou.

O sociólogo Ricardo Guedes, da Sensus, acha que, se os tucanos baterem em Lula com as denúncias já conhecidas, não vão mudar a tendência.

O que é conhecido já teria sido absorvido. O eleitorado que havia desistido de Lula depois dos escândalos voltou para ele porque o mercado eleitoral não ofereceu uma alternativa. Heloísa Helena traduziu esse voto de protesto em determinado momento, tirando inclusive mais votos de Alckmin, mas se perdeu no programa eleitoral, se apresentando de uma forma arcaica.

Ontem, na sabatina no GLOBO, Heloísa Helena foi confrontada com essa maneira arcaica de fazer política, a começar pelo linguajar empolado, até sua defesa do socialismo, mesmo que a longo prazo, e a conseqüente luta quixotesca contra os bancos e grandes corporações, sem compreender que a dívida interna é patrimônio da população de maneira geral, que coloca seu dinheiro em cadernetas de poupança e em fundos de investimentos, que a senadora insiste em classificar de especulação financeira.

Menos mal que deixou claro que não dará o calote, apenas reduzirá drasticamente os juros pagos. Se conseguir fazer isso de uma penada, sem provocar inflação e desequilíbrio fiscal e sem fuga de capitais e desenvestimento, terá dado uma contribuição relevante aos estudos econômicos, e provado na prática que existe uma grande conspiração contra o crescimento do país e a favor dos grandes lucros dos banqueiros.

Guedes acha que o eleitor tende a fazer o segundo turno já no primeiro, e por isso a maioria das eleições para governador vai terminar no primeiro turno, e a maior parte dos governadores será reeleita. Na percepção do eleitor, os ganhos macroeconômicos superam os problemas éticos que foram gerados: estabilidade da economia, geração de empregos, aumento do salário mínimo acima da inflação, queda do preço da cesta básica, programas sociais.

Hoje, apenas 18% acham que Lula pode ser responsabilizado pela corrupção e, desses, apenas 6% acham que ele teve participação direta.

A aparente apatia do eleitorado brasileiro seria, ao contrário, apoio ao governo Lula, não apenas resultado de políticas assistencialistas, como também de um bem-sucedido trabalho de convencimento da população de que não aconteceu nada além do que a corrupção normal da política brasileira.

Essa é uma questão que merece análise mais aprofundada, pois demonstraria que teve sucesso uma operação de dissimulação das atitudes do presidente da República que pode ter graves conseqüências para a democracia brasileira e gerar uma crise institucional num provável segundo governo Lula.

Miriam Leitão Dívida segundo HH

O GLOBO

Dívida segundo HH

Publicada em 30/08/2006

Míriam Leitão

A candidata Heloísa Helena se preparou para responder sobre dívida pública. Mas a resposta foi confusa. Ela disse que tem compromisso com a meta de inflação, mas não quis dizer se aceitaria que os juros subissem caso os preços subam. Afirmou que não acredita que a inflação subirá como não acredita em fuga de capitais. Avisou que ela não permitirá que o dinheiro saia.

Heloísa Helena está num daqueles momentos em que um político tem que manter seu discurso original, mas precisa não assustar os outros eleitores. Isso a fez dizer coisas que agradam a uns e outros. Disse que manterá as metas de inflação e tem compromissos com ela. Mas não a ponto de permitir a alta dos juros caso os preços subam.

Na verdade, ela não admite essa hipótese. Para a candidata, a inflação simplesmente não vai subir. Afirmou que os investidores não precisam temê-la e explicou que a dívida pública é um instrumento importante para o país, mas, quando eu perguntei se ela aplicava o dinheiro em dívida pública, respondeu de impulso:

— Eu não especulo.

Meu ponto é que Heloísa Helena sempre usa um excesso de adjetivos fortes e eloqüentes contra os banqueiros quando fala do assunto. Mas os grandes carregadores da dívida não são os banqueiros e, sim, os poupadores, pessoas e empresas que têm dinheiro aplicado em fundos garantidos por papéis públicos; metade da dívida pertence a esses poupadores e aos fundos de pensão. Pedi que ela deixasse de lado todos os adjetivos contra os banqueiros que sempre fazem tanto sucesso eleitoral e que me dissesse objetivamente qual era sua proposta para a dívida pública.

Heloísa Helena conseguiu falar alguns segundos sem adjetivos para, logo em seguida, acusar os “moleques de recado do capital financeiro internacional” e os “sabotadores do desenvolvimento brasileiro” pela alta taxa de juros.

Acha que, quando os juros caírem, haverá dinheiro para enfrentar todos os problemas brasileiros: a pobreza, a violência, o baixo nível educacional, o risco de os adolescentes se drogarem, a perversidade do sistema prisional, o risco das fronteiras. Será apenas o caso de baixar os juros e haverá dinheiro para tudo isso.

Claro que os juros precisam cair, mas a questão é como; por um ato de vontade presidencial? Ela disse que poderia ser por decreto, mas que não fará isso. Apenas estabelecerá que o país terá que crescer o dobro do que cresceu e os juros cairão para permitir esse crescimento. O risco de a inflação subir ela simplesmente descarta:

— Não acredito em risco inflacionário. O debate inflacionário é uma farsa técnica.

Ela usa a mesma expressão “eu não acredito” para afastar o risco de fuga de capitais. Garante que dá sua palavra de mulher e a segurança jurídica do país para garantir que não haverá calote. Diz, no entanto, que, se o investidor quiser sacar e levar o dinheiro para fora do país, ela não deixará, as leis do país não permitirão, nem haverá alternativa para o poupador.

Pelo seu raciocínio, o poupador, se sacar o que estiver poupado, não terá o que fazer com ele. Não poderá comprar dólares, porque o dólar ficará caro.

— Não temos outra alternativa; para crescer, precisamos tirar de algum lugar. Tiraremos dos juros e quem quiser receber seu dinheiro aplicado receberá, mas objetivamente vai ser impossível mandar para fora porque eu não vou deixar, nem haverá alternativa de aplicação.

Quando saiu da entrevista, um dos integrantes da sua campanha disse que sabia que essa seria a minha pergunta. De fato, era previsível, porque é o centro do raciocínio dela: a candidata pensa em tirar recursos para todos os seus planos da queda dos juros. De fato, eles precisam e têm chances de continuar caindo, mas não é desta forma que se faz política monetária.

A candidata está convencida de que os poupadores são especuladores, e que eles são apenas 0,005% da população brasileira e, na verdade, os aplicadores em fundos lastreados em título público são cerca de oito milhões de brasileiros pessoas físicas.

Ela explicou bem a diferença entre programa de partido e de governo. O primeiro é o objetivo último de um planejamento estratégico; o segundo é o que é possível fazer num primeiro momento. Exemplo: o PSDB defende o parlamentarismo, mas governou no presidencialismo.

Diz que seu sonho é o socialismo, que define apenas como sendo aquele momento lindo em que uma criança judia e uma criança muçulmana brincam juntas.

Tem razão quando diz que é contra a estatização do movimento social e é impagável quando ataca o governo com humor e se refere ao presidente Lula como “sua majestade barbuda”, ou quando, com mais gestos que com palavras, critica o estilo nada do candidato do PSDB.

Usa e abusa das frases cortantes e acusações e prefere as mais impessoais e genéricas, como esta:

— O Congresso Nacional é bandido quando o chefe do Executivo bandido é.

A cada ponto do discurso, Heloísa Helena invoca a sua condição de mulher e mãe. Ela o faz por estratégia bem pensada: são as mulheres que estão mais indecisas, são elas que fizeram seu crescimento recente, são as mulheres que têm a chance de parecer um fato novo na política brasileira que passa por um momento tão sem graça.

Mas concretamente a situação de Heloísa Helena é que, ao final desta eleição, ela pode estar sem mandato e sem partido. Seu PSOL está tendo uma extraordinária exposição, mas terá que cumprir a cláusula de barreira para sobreviver, o que dificilmente conseguirá. Em vez de renovar seu mandato, ela preferiu correr o risco. Colhe os louros de ter uma exposição que jamais teria se não fosse candidata.

AUGUSTO NUNES A noite dos velhacos

JB

No Brasil, sabe-se há tempos, de onde menos se espera é que não vem nada mesmo. Neste começo de século, descobriu-se que, em temporadas eleitorais, o país se torna a cada semana mais cafajeste. A conjugação desses dois fenômenos rascunhou a comédia de maus costumes encenada neste agosto por figuras do, como direi?, mundo artístico.

O espetáculo foi apresentado na sala de visitas da residência carioca de Gilberto Gil, compositor, cantor, showman, pensador e, nos minutos que sobram, ministro da Cultura. Para que o elenco atacasse o enredo com segurança, o produtor de cinema Luiz Carlos Barreto resumiu o argumento para a platéia: "A política é um terreno pantanoso, a ética é de conveniência. Se o fim é nobre, os fins justificam os meios".

Animado com os sorrisos indulgentes, Barretão engatou uma quinta: "O que eu acho inaceitável é roubar. Mentir é do jogo político. Não é roubo". Muito simpático. Convidado de honra da noitada, o presidente-candidato Lula sentiu-se, desde logo, entre companheiros. Sentiu-se entre cúmplices ao ouvir a fala inicial do ator Paulo Betti: "Não vamos ser hipócritas: política se faz com mãos sujas".

(Convém reproduzir com precisão as bobagens que Betti diz. No esplêndido artigo Os bobos da Corte, a jornalista Dora Kramer, por exemplo, acrescentou um "só" às palavras de Betti, entre "política" e "se". Amuado, nosso galã de meia idade reivindicou a correção: a consoante e a vogal, alegou, conspiravam para alterar o sentido do que dissera. Pois releiam a frase. Com ou sem "só", é exemplarmente torpe).

A ousadia de Betti foi a senha para estréia do músico mineiro Wagner Tiso como coadjuvante em montagens teatrais obscenas. "Não estou preocupado com a ética do PT", solfejou o menos famoso de qualquer parceria. "Acho que o PT fez um jogo que tem que fazer para governar o país".

Tradução da partitura: roubalheiras no Executivo, gatunagens no Congresso, a patifaria promovida a forma de arte política - nada disso agora tem relevância para o compositor que se esvaía em lágrimas com clubes de esquina e corações de estudantes.

Estabelecido o império da pouca-vergonha, o ator José de Abreu cuidou do epílogo: homenageou explicitamente os companheiros José Dirceu, José Mentor e José Genoino. Todos Josés - tanto o autor quanto os alvos da homenagem. É um quarteto e tanto.

O Dirceu foi acusado pelo procurador-geral da República de chefiar a "organização criminosa sofisticada" forjada no Planalto. O Mentor ampliou notavelmente o prontuário como relator da CPI do Banestado e comparsa de Marcos Valério. O Genoino, uma das estrelas do maior escândalo da história da República, evadiu-se da presidência do PT depois que o assessor do irmão foi capturado com dólares na cueca. Abreu, o quarto José, mereceria ser boicotado pelos critérios da decência se já não tivesse sido condenado à obscuridade por insuficiência de talento.

Como José de Abreu, também Paulo Betti e Wagner Tiso não sabem o que é sucesso desde os tempos em que o basquete brasileiro ganhava títulos internacionais. Sobrevivem com patrocínios extorquidos de empresas estatais e favores concedidos pelos governos. Nenhum deles é mais o garotão dos bons tempos. Na pátria da juventude a qualquer preço, é compreensível que estejam preocupados com o envelhecimento.

Homens assim envelhecem mal. Às vezes, nem envelhecem: sem escalas, passam de moços a velhacos.

CELSO MING O Programa de Lula

ESTADO

celso.ming@grupoestado.com.br

Na área econômica, o Programa de Governo do presidente Lula é um encadeamento de omissões, de simples declarações de intenção e de generalidades destituídas de metas claras.

Uma dessas omissões está logo na página 7, quando acusa o governo anterior de “privataria” porque “entregou grande parte das empresas estatais em processos marcados por graves denúncias de irregularidades”. Se as denúncias são tão graves, por que o governo Lula não as investigou? E, se as investigou o suficiente para concluir que produziram “privataria” - seja lá o que isso signifique -, por que não a denunciou à Justiça e ao povo brasileiro? E se foi tão nefasta para o País, por que não a reverteu?

O discurso do presidente Lula pronunciado quinta-feira por ocasião da última reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social tem mais projeto e mais conteúdo econômico do que esta lengalenga. No pronunciamento, pelo menos está a promessa reafirmada pelo presidente de seguir combatendo a inflação: “Meu compromisso com a inflação baixa é definitivo, eu vou repetir, o meu compromisso com a inflação baixa é definitivo.” Por que esses termos não foram incorporados ao novo documento?

Fala de desoneração tributária, mas não de reforma tributária. Não reconhece que a carga tributária ficou insuportável nem como atacar a gastança do governo federal, que vem aumentando substancialmente acima do crescimento do PIB.

Menciona, sim, a necessidade de reforma sindical, mas não diz em que direção. Fala em melhorar a gestão da Previdência, mas no texto não há nem sombra da necessidade de aprofundamento da reforma. Em nenhum momento assume que é preciso aumentar a contribuição e reduzir o benefício para o aposentado.

Sustenta que “o País está ingressando em um novo ciclo de desenvolvimento”, mas não deixa claro como isso se fará. Promete políticas industriais, as mesmas de sempre: “ênfase nos setores difusores de tecnologia, tais como software, semicondutores, fármacos, medicamentos e bens de capital, assim como em áreas estratégicas como nanotecnologia, biotecnologia e biomassa”. A maioria dessas políticas foi anunciada já em 2003, mas ficou por aí, quase inteiramente emperrada. Se haverá a retomada dos projetos, faltou dizer por que não avançaram até agora.

Em abril, o PT divulgou suas “Diretrizes para a elaboração do programa do governo do Partido dos Trabalhadores - eleição presidencial de 2006”, o ensaio para o documento ontem divulgado.Lá foram feitas fortes críticas à política econômica desta administração: “A obra do governo Lula é parcial, desigual e incompleta”. E o PT pediu mudança de rumo na economia. Para o Banco Central, exigiu um duplo mandato: “Além de ser o guardião da moeda, deve igualmente preocupar-se com o crescimento, o emprego e o bem-estar social” - ficou registrado no documento. Mas o Programa do Presidente Lula não reconhece erros da política econômica. Aparentemente, o presidente desautorizou as críticas. Sobre a proposta de dar autonomia operacional ao Banco Central, não há uma única palavra. Nem contra nem a favor.

Promete o fortalecimento da política de exportações, mas em nenhum momento indica como pretende enfrentar a firme tendência à valorização do real. Enfim, a atual política cambial, objeto unânime das críticas dos economistas de esquerda, não é tema que mereceu consideração.

Para multiplicar as exportações, todos sabemos, é preciso acesso aos mercados e isso não acontecerá sem novos acordos comerciais. O Programa insiste em “privilegiar a integração sul-americana - o Mercosul e a Comunidade Sul-americana de Nações” - e ignora a necessidade de buscar novos mercados onde eles realmente existem. Nem mesmo se menciona a necessidade de dar urgência às negociações comerciais entre o Mercosul e a União Européia.

A maioria dos objetivos na área energética já está definida ou é conseqüência de decisões já tomadas. Mas o documento os enuncia como novidade.

Finalmente, o Programa de Governo se compromete com o projeto de “democratização dos meios de comunicação”, sem explicar o que pretende com isso. Pelo cheiro da brilhantina, trata-se de produzir bovina subserviência dos meios de comunicação ao futuro governo Lula.

E isso não consegue esconder o projeto autoritário de amolecimento de corações e mentes.

Arquivo do blog