Editorial |
O Estado de S. Paulo |
3/8/2006 |
Mais uma gorda fatura deve ser debitada na conta do brasileiro "comum", aquele sujeito regularmente convocado para custear benefícios que ele mesmo nunca receberá. Desta vez, ele terá de pagar pela salvação financeira da Petros, o fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás. Um acordo para isso está sendo concluído entre a empresa e a Federação Única dos Petroleiros (FUP). Estimado em R$ 9,3 bilhões, o rombo atuarial do fundo deverá ser coberto pela estatal em 30 anos. Numa divisão simples, isso equivale a R$ 310 milhões por ano. Como será repartida a fatura? A Petrobrás é controlada pelo Tesouro Nacional, mas parte de seu capital pertence a acionistas privados. Suas ações são negociadas em bolsas no Brasil e no exterior. Apesar do controle estatal - ou, talvez, graças a isso -, a empresa criou em 1970 um generoso plano de aposentadorias que seria administrado pela Petros. Seria adotado o sistema de "benefícios definidos", com remuneração preestabelecida para os aposentados. O quadro de beneficiários acabou sendo ampliado, sem que as contribuições crescessem proporcionalmente aos compromissos. O resultado foi um buraco atuarial: feitos os cálculos, descobriu-se que a Fundação Petros não teria como cumprir suas obrigações dentro de certo número de anos. Há mais de dois anos a empresa e a FUP começaram a negociar uma solução para o problema. O acerto está praticamente concluído e será sacramentado quando 95% dos participantes da Petros - 90.250 pessoas - aprovarem a proposta. O acerto inclui também uma alteração do regime, que passará a ser de "contribuição definida". Haverá indenização - que deverá custar R$ 1,425 bilhão - para as possíveis perdas decorrentes da passagem para o novo sistema. Com esse acerto, a distorção criada com a formação da Petros apenas deverá assumir nova forma. A solução do problema poderá reforçar a imagem da Petrobrás nos mercados de capitais. Isso poderá compensar os custos do acordo para os acionistas privados. Mas os demais brasileiros, que são apenas acionistas indiretos, por meio do Tesouro, ficarão, como antes, numa situação claramente desvantajosa. Pagarão uma parte da fatura, como contribuintes de impostos. Talvez paguem também como consumidores, se a empresa transferir parte dos novos encargos aos preços. Se a Petrobrás for beneficiada economicamente pela melhora de imagem, depois de anunciado o acordo com a Petros, nada garante que isso se reflita nos dividendos pagos ao Tesouro, de onde sai o dinheiro para programas públicos. Na prática, milhões de brasileiros que só têm acesso à magra aposentadoria do INSS, terão de aumentar sua contribuição ao bem-estar dos associados da Petros. Esses associados já dispõem de vantagens trabalhistas inexistentes para a maioria dos cidadãos. Seu novo regime previdenciário, embora menos generoso que o sistema inicial da Petros, ainda será melhor que o dos outros brasileiros. Esses muitos milhões dependem essencialmente, para sua aposentadoria, de recursos de origem privada, Esse dinheiro sai de seu bolso e da receita das empresas que os empregam. A situação é semelhante quando dispõem de planos complementares, com o custeio dividido entre as empresas e seus trabalhadores. O caso dos fundos de pensão das estatais - não só da Petros - é muito diferente. Essas companhias funcionam como entidades privadas quando estabelecem os planos de previdência complementar para seus funcionários. Mas são estatais, quando usam recursos provenientes em grande parte do acionista controlador, o Tesouro público. Seus empregados dispõem, portanto, de evidentes privilégios, que os tornam cidadãos de classe especial. Nada se disse, ainda, sobre uma possível contribuição desses empregados para a solução do problema da Petros. Ao contrário, eles aparecem na história apenas como beneficiários, custeados pelas atividades empresariais de seus empregadores e pelo dinheiro dos contribuintes. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, agosto 03, 2006
Uma fatura para o cidadão
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