Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 05, 2006

Celso Ming - Novo-desenvolvimentismo

ESTADO

Finalmente apareceu um economista capaz de ajambrar um projeto alternativo para a atual política econômica. É peça que pode ser fortemente contestada em seus pressupostos e em algumas de suas proposições, mas não se pode negar-lhe certa consistência.

O homem é Luiz Fernando de Paula, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ele acaba de concluir estudo que tem um título longo que já diz muita coisa: "Uma nova política macroeconômica: algumas proposições a partir de uma visão novo-desenvolvimentista."

O novo-desenvolvimentismo é um termo criado pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, também crítico contumaz da linha ortodoxa da atual política econômica. O professor De Paula parte dessas críticas e busca construir nova política econômica que privilegie o crescimento. Seus principais instrumentos são baixa dos juros, desvalorização do real, controle do fluxo de capitais e adoção de políticas ativas de avanço setorial.

Para usar termos hobbesianos, toda política econômica está construída sobre um medo básico. Assim, por trás da política do governo Lula, que continua a do presidente Fernando Henrique, está o medo da inflação. Por isso, o problema principal a enfrentar é o rombo do setor público que provém da propensão do governo a gastar mais do que arrecada e a se endividar.

O projeto de política econômica do professor De Paula procura livrar-se de dois medos: o da estagnação econômica, que perpetua a pobreza, e o da vulnerabilidade externa, que gera fuga de capitais quando ocorrem os choques externos, situação que leva a economia ao colapso.

Na crítica ao modelo hoje adotado, De Paula repete os argumentos já conhecidos. O de que a excessiva preocupação com a inflação puxa os juros para cima, o que, por sua vez, gera paralisia (stop and go). Em vez de resolver o problema fiscal (governo que gasta demais), os juros altos aumentam a despesa pública, beneficiam os que vivem de renda, atraem capitais que, por sua vez, valorizam excessivamente o real, derrubam as exportações, matam setores produtivos e agravam a vulnerabilidade externa.

O professor De Paula prega uma mudança importante no regime de metas. Quer que o Banco Central atue com dois mandatos: que, além de combater a inflação, garanta crescimento econômico. Assim, os juros seriam calibrados para obtenção harmônica desses dois resultados.

O Banco Central teria ajuda de outros instrumentos. Toda a política econômica concorreria para desmantelar mecanismos automáticos de reajuste (indexação); o governo teria metas de equilíbrio fiscal de longo prazo e geraria superávits fiscais combinados com juros mais baixos; o funcionalismo público seria chamado a assinar um pacto de crescimento pelo qual aceitaria temporariamente ficar sem aumentos salariais; e as reservas cambiais seriam elevadas para evitar a fuga de capitais.

Nada disso seria suficiente sem uma política de controle do fluxo de capitais. O Banco Central seria o anjo que, logo após a expulsão de Adão e Eva, o Senhor Javé colocou à porta do Paraíso, para impedir a entrada de intrusos. Tanto seria barrada a entrada de capitais indesejados quanto a saída de capitais de propriedade de residentes.
Para a professora Eliana Cardoso, essa proposta não passa de elixir produzido por charlatões. A idéia de controlar capitais "é fechar a porteira a cavalo que sabe pular a cerca".

Mas há mais críticas que se podem fazer. A primeira é a de que ficou difícil apoiar uma proposta de política econômica para a qual o principal problema a combater é a vulnerabilidade externa. Quando nada, é preciso entender que as importações de matérias-primas e produtos manufaturados pela China, Índia e um punhado de tigres asiáticos vão continuar a produzir enormes superávits no balanço de pagamentos. Parece remota a possibilidade de que a economia brasileira volte a sofrer colapso cambial.

Além disso, essa "visão novo-desenvolvimentista" faz pouco-caso do estrago que a inflação produz no próprio crescimento econômico. E desconsidera que o pressuposto para um crescimento econômico sustentável seja a estabilidade de preços.

Charlatanismo ou não, qualquer sugestão alternativa de política econômica terá de trabalhar com as idéias costuradas pelo professor De Paula.


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