Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 23, 2006

Míriam Leitão - Olhando para fora

Panorama Econômico
O Globo
23/6/2006

Na próxima semana, o Fed decide sobre o destino dos juros americanos.
A incerteza em relação aos movimentos de política monetária nos
Estados Unidos tem influenciado os mercados no mundo inteiro. Olhar
para a economia americana é o que mais fazem os analistas
ultimamente, pois qualquer índice lá tem mexido em bolsa, risco e
câmbio por aqui. “A energia está toda sendo gasta em tentar mapear o
investidor externo”, diz Roberto Padovani, da Tendências.

O consenso no mercado, refletindo as últimas declarações do Fed, é de
que no dia 29 haverá uma alta de 0,25 ponto percentual na taxa de
juros americana. Mas os analistas esperam é que, a partir de então, o
Fed deixe mais claro quais são as suas intenções.

— A reunião vai ser central para entender o que o Fed pensa; pode
ajudar o mercado a entender melhor como eles estão vendo a situação.
Por outro lado, tem também a possibilidade de eles olharem apenas as
variáveis a curto prazo — comenta Padovani.

Se o Fed optar por ficar olhando só essas variáveis, como índices de
inflação e de atividade, a tendência é de que a volatilidade
permaneça pois a cada novo índice o mercado vai interpretar à sua
moda e tirar suas próprias conclusões.

— Esta é a grande oportunidade de Bernanke de dar um sinal mais
claro. Os dirigentes do Fed têm indicado que o ciclo de apertos está
perto do fim, mas isso não quer dizer que não possa haver uma última
elevação dos juros em agosto para depois parar — acredita Luis Otávio
Leal, do Banco ABC/Brasil.

O gráfico abaixo mostra o quanto os discursos de Ben Bernanke têm
ajudado a aumentar a volatilidade. Como referência, é usada a
inflação implícita nos títulos americanos, que dá uma noção da
expectativa de inflação dos agentes do mercado. Os discursos de
Bernanke causaram várias mudanças — para cima e para baixo — nas
expectativas.

— Ele tem usado o discurso também para segurar a inflação — diz Luis
Otávio.

Padovani acha que o presidente do Fed é como “um gatilho num ambiente
cheio de gás”; seus discursos têm mais impacto porque o pano de fundo
agora é menos amigável:

— Há uma maior aversão ao risco e muita incerteza. Não há consenso
sobre os caminhos da inflação, sobre a atividade nos Estados Unidos —
afirma.

Ricardo Amorim, do WestLB, acredita que a decisão do Fed não deixará
o ambiente mais tranqüilo, por mais que este seja um desejo do
mercado. Prevê que esta não será a última alta e que, se o banco
central americano indicar que continuará subindo, isso pode
significar mais impactos nos mercados mundo afora, com piora de
bolsa, risco e dólar:

— A única forma de ele definir o quadro seria indicando que vai parar
de subir os juros, mas não acho que isso vá acontecer. A semana que
vem e a outra continuarão voláteis.

Além da decisão do Fed, está todo mundo de olho nos índices da
economia americana, sobretudo os de inflação, mercado de trabalho e
imóveis. Quanto a esses últimos, há duas notícias. A primeira: os
preços dos imóveis continuam subindo. O dado anualizado do último
trimestre indica 8% de alta. Ainda é muito, mas é menos que no
trimestre anterior. A outra informação é que despencou o número de
pedidos de construção de novos imóveis. Sem índices nem discursos do
presidente do Fed, esta semana foi até agora menos agitada nas bolsas
do mundo. Na semana que vem, a tensão pode voltar.

Na economia real, no Investimento Estrangeiro Direto, aquele que vem
para ficar, já entraram este ano até maio US$ 6,3 bilhões, apesar das
incertezas quanto ao crescimento mundial. São US$ 900 milhões a menos
que no ano passado, mas é um bom sinal de que o Brasil continua
atraindo capital externo.

Exatamente dois anos antes da reunião da semana que vem, no dia 29 de
junho de 2004, o Fed começou a subir os juros, que estavam em apenas
1%. Se o banco central americano optar pela alta de 0,25 pp, a taxa
chegará aos 5,25%. O desejo do mercado é que este ciclo de aperto
pare exatamente por aí.

— É importante o Fed dar sinais para que o mercado possa prestar
atenção nos dados de produção aqui, que realmente interessam e que
estão muito bons — diz Luis Otávio Leal.

As turbulências podem ter razões bem americanas, mas acabam afetando
o mundo inteiro, por isso é preciso ficar de olho em cada etapa. Uma
delas: a reunião do Fed da semana que vem.

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