Entrevista:O Estado inteligente

domingo, abril 03, 2005

O DIA - Dora Kramer :Uma no cravo, nenhuma na ferradura

Há um ano e 10 meses, desde o dia 6 de junho de 2003, descansa incólume na gaveta do ministro da Saúde, Humberto Costa, um pedido de intervenção na área de Saúde do Distrito Federal, feito pelo Ministério Público Federal com base no trabalho de um grupo-tarefa que investigou a gestão e constatou a má aplicação dos recursos do Sistema Único de Saúde pelo governo de Joaquim Roriz, do PMDB.

Assinado pelo então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, o ofício encaminhado ao ministro com os resultados do inquérito nº 365/DF concluía pela ocorrência de “redução inconstitucional dos gastos com saúde no Distrito Federal” e conseqüente “decréscimo na qualidade dos serviços de saúde prestados”. Com base nisso, pedia intervenção federal por descumprimento da Constituição.

No mesmo documento, Brindeiro recomendava que, antes da intervenção – e até para tentar evitá-la –, o Ministério da Saúde determinasse a transferência da gestão dos recursos do SUS do DF para o âmbito da administração federal, citando ação semelhante feita no Governo do Piauí.

O tempo passou, não foram tomadas nenhuma das duas providências e, segundo o promotor do Ministério Público do Distrito Federal, Jairo Bisol, a rede hospitalar e de postos de saúde do DF continua em progressivo estado de “desmonte”.

“Faltam médicos, enfermeiros, remédios, insumos e manutenção para equipamentos. A situação só não pode ser comparada à que justificou a intervenção nos hospitais do Rio de Janeiro, porque temos indícios de que pode ser até pior, com ocorrências de desvios de recursos e condutas de improbidade francamente prejudiciais ao atendimento público”, diz Bisol, o promotor encarregado de fiscalizar a aplicação dos recursos do SUS na capital da República.

De acordo com ele, os 14 hospitais da rede pública estão em situação “caótica”: não há médicos e enfermeiros em quantidade suficiente e a qualidade, em virtude da falta de renovação de equipes especializadas, também vem caindo de maneira crescente. Ele cita um exemplo de um hospital construído por Roriz com capacidade para 250 leitos onde, conforme constatou o promotor em visita recente, apenas cinco estão ocupados.

“Mesmo assim, o governador está falando em construir um novo hospital, o que revela disposição para fazer as obras, mas total desinteresse em assegurar o bem-estar da população”.

O Ministério Público tem em seu poder denúncias, ainda em processo de investigação, de que em diversos hospitais equipamentos quebraram por falta de manutenção e assim permanecem por interesse de “médicos donos de empresas privadas infiltrados no setor público” para obrigar os pacientes a recorrer a serviços particulares. A prática é muito comum, por exemplo, no setor de radiologia.

Jairo Bisol conta ainda que em 2003, por ocasião do envio do ofício pedindo a intervenção ao ministro Humberto Costa, ele expôs a situação perante o Conselho de Saúde, órgão de fiscalização do SUS, e propôs que se votasse a transferência da gestão dos recursos para a União.

Os conselheiros, à exceção dos representantes do ministério da Saúde, aprovaram, a decisão foi comunicada ao ministro e aguarda, até hoje, a homologação de Humberto Costa para ser implementada.

Na essência, a situação relatada pelo promotor e oficializada em documento pelo ex-procurador-geral da República ao Governo federal guarda uma diferença explícita de procedimentos em relação à intervenção feita no Rio.

Razões, certamente, o ministro Humberto Costa deve ter para intervir num caso e, no outro, ignorar os motivos para intervenção apresentados pelo Ministério Público.

Queiram o bom senso e o espírito público das autoridades federais que entre os pesos e as medidas usados para balizar a ação no Rio e a inação no DF não estejam a filiação partidária e a candidatura do prefeito Cesar Maia à presidência da República em contraponto com o acerto político entre o PMDB do governador Joaquim Roriz e o PT do presidente Luiz Inácio da Silva.

Mal essencial

Pensando bem, o malefício da contaminação da execução de políticas públicas pelas disputas político-eleitorais não está na antecipação dos processos sucessórios em si.

O prejuízo reside muito mais na incapacidade dos governantes e seus partidos de compreender o fundamento das respectivas funções, na ignorância ao que seja o compromisso prioritário de um representante popular, na insistência em tratar a população como massa de manobra a serviço de seus projetos de poder.

O defeito não está no debate a qualquer tempo entre Governo e oposição, muito menos, como se alega de quando em vez, no excesso de eleições. O problema é a escassez do velho e bom decoro – também conhecido pelo nome de vergonha – às faces.

Romaria

Os últimos dias foram, e os próximos continuarão sendo, de grande movimentação no escritório e no apartamento do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em São Paulo.

Atende pelo nome de PMDB a seita dos peregrinos. Anthony Garotinho incluído.

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