Decisões anticrise, ainda que técnicas, sempre são políticas; se exagerar na "meta" do PIB de 2009, governo fará má política |
SE ALGUÉM TIVESSE a chave do tamanho das medidas necessárias para estancar crises horríveis de crédito, Bancos Centrais e ministérios das Finanças de larga tradição e enormes assessorias, como os dos EUA e Europa, não teriam errado a mão tantas vezes. Além do mais, se as medidas fossem apenas "técnicas", não haveria tantas idas e vindas nem episódios lamentáveis, como a desmoralização de Henry Paulson, secretário do Tesouro americano.
Paulson rabiscou seu primeiro plano de socorro à finança em três páginas. O quase decreto lhe dava poderes de sultão financeiro e, em suma, consistia em tabelar o preço dos papéis podres dos bancos a fim de comprá-los por um valor muito acima daquele dado pelo mercado.
O pacote foi algo escanteado depois que apareceu o plano britânico, que estatizava parte dos bancos.
Em suma: 1) Agir nesse caos é muito difícil; 2) As medidas têm "caráter técnico", mas entre as medidas técnicas "a" e "b" cabem "n" interesses e predisposições políticas; 3) O governo Lula também tateia, erra e acerta na sua "work in progress", no pacote de medidas que desenvolve a fim de conter os estilhaços da crise global. Também toma decisões políticas e outras que, inevitavelmente, acabam por beneficiar setores.
O BC começou por tentar resolver o problema da asfixia de crédito de bancos pequenos e o da disparada do dólar, duas medidas necessárias.
Com o andar da crise, acabou por relaxar o compulsório às dezenas de bilhões e permitiu que, com tal dinheiro, bancos comprassem não só carteiras de crédito de bancos pequenos, mas também papéis de empresas e quotas em fundos de investimento que estavam sangrando.
O BC leiloou dólares a fim de conter a caótica desvalorização do real, mas com isso acabou por subsidiar empresas que fizeram besteira nos seus investimentos em dólar, empresas que elas mesmas ajudaram a causar o tumulto cambial. O BC não "deu" dinheiro a empresas. Mas, ao administrar o câmbio, as subsidiou: se o Estado oferece algo a custo inferior ao do mercado, dá subsídio.
Assim é também com os governos de todo o mundo que subsidiam seguros para seus bancos a fim de evitar "crises sistêmicas" -é necessário, mas os bancos têm um privilégio sistêmico. É socialmente útil? É. Assim como subsídios para outros setores sociais e econômicos, no entanto execrados pelo mercadismo.
Outro aspecto político das medidas anticrise, mais evidente, é a tentativa de manipular desastradamente o ciclo econômico. Por ora, Lula quereria apenas evitar que a epidemia da crise exploda por aqui. Ok, mas atenuar a crise não significa tentar navegar contra o vento com vela fixa. O Brasil, com todas as suas reservas, depende de financiamento para fechar suas contas externas (o balanço de pagamentos). Se insistir em crescer demais, terá inflação ou crise externa. Ou as duas coisas. Se mirar uma "meta" alta para o PIB de 2009, o governo vai só atirar no próprio pé e adiar e incrementar uma crise. Para o ano eleitoral de 2010.