Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 11, 2008

Mandela – Luta pela Liberdade

Cinema
Uma história de vergonha

Em Mandela – Luta pela Liberdade, o que importa não
é quanto o líder sul-africano respeitou seu carcereiro,
e sim quanto o carcereiro aprendeu a admirar Mandela


Isabela Boscov

Divulgação

NOS PAPÉIS DO APARTHEID
Fiennes, como o carcereiro Gregory, e Haysbert (à esq.), como Mandela: em duas décadas de convivência, do desprezo à razão


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Sobram suspeitas de que James Gregory, carcereiro do líder sul-africano Nelson Mandela por um período que se estendeu de 1968 até sua libertação, em 1990, enfeitou um bocado o relato dessa convivência em sua autobiografia, Goodbye Bafana. Se for esse o caso, o oficial penitenciário, morto em 2003, não terá sido o primeiro, tampouco será o último, a tentar tomar para si um pouco da grandeza da figura de Mandela. Que se tenha então como metafórica, mais do que como verídica, a adaptação das memórias de Gregory em Mandela – Luta pela Liberdade (Goodbye Bafana, África do Sul/Alemanha/Bélgica, 2007), e a questão de quanto esse relacionamento foi de fato próximo se torna imaterial. O que é relevante é que, entre o dia em que chegou como encarregado da censura à prisão da Ilha Robben e o dia em que se despediu de seu prisioneiro, aí já em confinamento domiciliar, algo aconteceu com o carcereiro – e, ainda que não pelos mesmos motivos, também com o seu país.

DA PRISÃO AO PALANQUE
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No drama dirigido pelo dinamarquês Bille August, desde sexta-feira em cartaz no país, Gregory (Joseph Fiennes) assume seu posto na penitenciária de segurança máxima em que Mandela (Dennis Haysbert) está detido como um produto típico da África do Sul do apartheid: um homem que acredita que o desejo da população africana é exterminar os sul-africanos brancos, como ele; que a selvageria é inerente aos negros; e que Mandela e seus companheiros do Congresso Nacional Africano são terroristas repugnantes. Mas Gregory ganha o cargo de censor porque cresceu entre negros, numa fazenda, e fala xosa, o que o habilita a interceptar mensagens clandestinas. Esse é o pivô, previsível mas correto, em torno do qual gira o filme: a idéia de que o protagonista já soube, e procurou esquecer, que o apartheid é uma abominação; e que o impacto de uma personalidade como a de Mandela sobre esse terreno propício pode ser transformador. Num outro plano, August trata de como transformações, em regimes que não as toleram, podem ser penosas. Assim que sua admiração pelo prisioneiro é detectada, Gregory é posto de escanteio, indispõe-se com a mulher (a alemã Diane Kruger, muito bem) e, à medida que a pressão internacional faz a África do Sul se tornar volátil, recebe seguidas ameaças de morte. Numa boa atuação, porém, Joseph Fiennes desvia essa trajetória do seu rumo habitual no cinema – o de mostrar a tomada de consciência de um branco na África como um processo heróico e de iluminação. Na maneira como ele interpreta o carcereiro, esta é uma história de como um homem começou a sentir vergonha. Com motivo.





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