Não podemos ficar imunes às profundas perturbações que se disseminam pelo sistema financeiro internacional. Seus efeitos começam a ser sentidos em nossa economia. Foram afetados, em primeiro lugar, o mercado de ações - que haviam tido, antes, uma excepcional valorização - e o mercado cambial, depois de um longo período de valorização do real. Agora, começam a ser afetadas as vendas do comércio, ao mesmo tempo que surgem novas ameaças de pressões inflacionárias.
Durante semanas o presidente Lula e seu ministro da Fazenda procuraram convencer a opinião pública de que, graças a resultados "nunca antes conseguidos neste país", a crise não iria nos causar maiores problemas. Contrastando com essa atitude, felizmente, o Banco Central (BC), antes mesmo que a crise explodisse, já cuidava de montar uma linha de defesa com medidas corajosas para conter a inflação e com a constituição de reservas cambiais, cuja grande utilidade se demonstra hoje.
Preocupado com não exacerbar os temores que permeiam, compreensivelmente, boa parte do público, o Banco Central se preparou para encarar os problemas, certo de que eles viriam. Previu que os bancos e as empresas não iam mais poder captar recursos no mercado financeiro internacional, que se fechou com a crise.Tampouco as empresas brasileiras, num momento de forte queda da bolsa, poderiam recorrer ao mercado de capitais, isto é, dependeriam ainda mais do sistema bancário nacional. Mesmo com a desvalorização do real representando uma oportunidade para os exportadores, ela ocorre num período de forte retração do PIB dos países compradores, ao mesmo tempo que as importações, mais onerosas, não mais contribuiriam para conter as pressões inflacionárias. Paralelamente, a alta volatilidade da taxa cambial podia criar graves perdas para empresas que erraram ao tentar se proteger em operações de "hedge", que, ao que parece, se tornaram uma espécie de "subprime brasileiro".
Consciente de todos esses problemas o Banco Central sugeriu ao governo a Medida Provisória (MP) 442 - para que as autoridades monetárias possam enfrentar uma situação mais crítica do que a de hoje, diante da qual o BC se limitou a tornar mais flexível o sistema do recolhimento compulsório dos bancos e a intervir, quando julgou necessário, no mercado cambial. Está se antecipando para enfrentar um cenário pior, dispondo de uma regulamentação que confere maior segurança jurídica.
Antes mesmo da sua aprovação, pelo Congresso, o Conselho Monetário Nacional baixou a regulamentação da MP 442, fixando critérios para a compra de ativos em reais nas operações de redesconto e estabelecendo garantias nos empréstimos em moeda estrangeira.
Ao contrário do Plano Paulson nos EUA, aqui os critérios são claramente definidos e reduzem ao máximo os riscos do BC, que terá em garantia para o redesconto títulos de risco muito baixo, eliminando-se os créditos podres. No caso de empréstimos em moeda estrangeira, a garantia será composta de papéis vinculados a operações reais (Adiantamentos de Contratos de Câmbio para exportação ou importação), títulos da dívida soberana emitidos pelo Brasil ou por países com um rating alto. Apesar do cuidado com a qualidade da garantia, o BC exigirá compromisso de revenda para o redesconto, que terá prazo máximo de 360 dias, à taxa Selic mais um adicional a ser definido. Os empréstimos em moeda estrangeira terão taxa Libor mais um adicional. As garantias irão de 120% a 170% do valor da operação. Reforço de capital dos bancos, suspensão da distribuição de resultados, proibição de aumento da remuneração dos administradores e da venda de ativos são outras exigências, todas muito duras.
Até agora não surgiram novas garantias para os depositantes dos bancos, mas a impressão é de que, se forem necessárias, o BC as dará.