Por meio de "nota oficial", Rainha informou que essa invasão em massa tem o objetivo de "despertar o governo de José Serra do seu marasmo" e retomar os assentamentos na região, já que, no seu entender, as fazendas invadidas são "improdutivas ou devolutas". No ano passado, nessa mesma época, Rainha e seus militantes realizaram idêntica invasão em massa no Pontal, região do Estado de São Paulo que concentra a maioria dos conflitos fundiários. Ao dizer que "nada foi feito para os trabalhadores e o governo tucano insiste em privatizar 300 mil hectares de terras públicas", Rainha se refere ao projeto do governo Serra que prevê a regularização das áreas com mais de 500 hectares no Pontal. A proposta foi enviada à Assembléia Legislativa em junho de 2007 e ainda não foi votada.
Independentemente do mérito desse projeto, é claro que uma das principais reivindicações de Rainha e seu bando é que o governador José Serra retire seu projeto de lei da Assembléia Legislativa - pois o que menos lhes interessa é algum avanço no caminho da regularização fundiária. A regularização certamente diminuiria a intensidade de conflitos na região - esvaziando o conteúdo "político" do movimento (MST) cujo comando há tempos disputa, sem o conseguir.
Como não poderia deixar de ser, já que não podem ficar de braços cruzados enquanto invadem suas propriedades, os dirigentes da União Democrática Ruralista (UDR) anunciaram que a entidade apoiará os fazendeiros do Pontal do Paranapanema na contratação de empresas de segurança, para evitar novas invasões.
Mas, além das invasões, os produtores rurais têm outro motivo de revolta. Não se conformam com o fato de a Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo ter agendado - para esta semana - uma reunião com os líderes dos sem-terra. "Nossos associados não aceitam que o governo receba esses fora-da-lei." A Secretaria de Justiça informa que a reunião foi agendada antes das invasões (não esclarecendo se foram desmarcadas em razão destas), a pedido do bispo da região, e que os ruralistas também são recebidos quando pedem audiência. Mas convenhamos: não se pode considerar que existe equilíbrio isonômico quando a autoridade do Estado trata da mesma forma produtores regulares, fazendeiros que respeitam a lei, e bandos fora-da-lei, que não integram uma associação legalmente constituída e costumeiramente praticam o esbulho possessório, acrescido de diversas outras formas de violência - tais como cárcere privado imposto a empregados de fazendas, matança de animais, depredação de sedes e coisas do tipo.
"Tivemos mais de 100 invasões nos últimos anos e nenhum proprietário foi indenizado" - desabafou o presidente da UDR, Luiz Antonio Nabhan. E, para que se interrompa a prática de "os sem-terra invadirem e o governo ir negociar a terra com o dono", o mínimo que o governo deveria fazer - como reivindica, com justiça, a entidade - era não assentar em terras que foram objeto de invasão. Era isso, aliás, o que determinava provisão legal baixada no governo Fernando Henrique.
Não se pede que o governo deixe de ouvir reivindicações de movimentos sociais, mas sim que não trate em pé de igualdade quem está e quem não está dentro da lei. A bem da verdade, José Rainha Júnior tornou-se um dos símbolos da impunidade reinante no País, tamanha é a complacência que tem desfrutado dos Poderes Públicos na evolução de sua carreira.