A festa da anistia não pode parar
TERMINANTEMENTE PROIBIDA DE ATRAVESSAR O ATLÂNTICO pelo presidente Lula, disposto a tudo para manter a forasteira indesejada longe de um Brasil que passou de pobre a novo-rico em apenas cinco anos, e daqui a mais cinco estará desfrutando do vidaço de bilionário petroleiro, a crise econômica americana foi obrigada a viajar por terra. A interdição do oceano forçou o monstrengo parido pelo capitalismo ianque a enfrentar canseiras e perigos exonerados da rota marítima. Cruzou a nado o Canal do Panamá, recorreu a furtivas caminhadas noturnas na inóspita etapa bolivariana, por pouco não foi atropelada por alguma motosserra na travessia da Amazônia. A viagem só terminaria neste começo de primavera. Na semana passada, a Bolsa de Valores e o dólar anunciaram que a crise chegou ao Brasil. Problema de George Bush, parecem pensar como Lula os tripulantes e passageiros do trem da alegria a serviço da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Tudo vai bem no paraíso tropical que o chefe criou. E anda sobrando dinheiro, reiteraram as três paradas feitas em cinco dias pelo trem pagador. Na segunda-feira, o vagão dos metalúrgicos recolheu na estação da Câmara Municipal de São Bernardo 41 veteranos de greves, todos contemplados com indenizações que variam de R$ 100 mil a R$ 300 mil e pensões de R$ 900 a R$ 2.700 por mês. É pouco, queixaram-se os embarcados.
Se são todos heróis da resistência, por que o adjutório mensal é inferior ao de Lula, orçado em R$ 4.509? Se o batalhão dos operários do ABC lutou com tanta valentia e tanto desprendimento quanto a brigada dos jornalistas do Rio, como conformar-se com indenizações que parecem troco se comparadas aos R$ 1.000.253,24 embolsados pelo cartunista Ziraldo? "A Lei de Anistia é pouco eqüitativa", desculpou-se Paulo Abrão, presidente da comissão. "Particularmente, discordo dos critérios que aprofundam desigualdades e não identificam quem suportou mais sofrimentos e prejuízos em razão das perseguições". A angústia de Abrão seria abrandada, nas duas paradas seguintes, por merecidos elogios à inventividade do maquinista-chefe. Na quinta-feira, ao preço de R$ 99,6 mil (fora as prestações mensais), Nilmário Miranda inaugurou o carro-leito reservado a ex-ministros de Lula. Na sexta, durante a escala na estação da CNBB, instalaram-se no ecumênico vagão dos religiosos passageiros que nunca receberam salários e viviam jurando que o caminho para o Reino dos Céus é muito mais curto para quem não tem apego a dinheiro. O pastor americano Frederick Morris (indenização de R$ 286 mil e prestações mensais de R$ 2 mil) viaja agora ao lado do arcebispo-emérito da Paraíba, dom Marcelo Carvalheira (indenização de R$ 100 mil). Entre 2002 e junho deste ano, a farra da anistia torrou R$ 2,3 bilhões com indenizações. Pensões e aposentadorias consomem R$ 28 milhões por mês. A fila de espera passa de 30 mil pedintes. Com crise ou sem crise, a festa continua. O Brasil não se espanta com mais nada.
Rio coloca em risco ibope do Ibope
A pesquisa divulgada pelo DataFolha no fim de semana traduziu em números o que via com nitidez até o mecânico da Ferrari que cuida do sinal verde no pit stop: a onda Gabeira chegara ao pescoço de Marcello Crivella e ameaçava engolir em poucas horas o candidato do PRB. Ilusão de ótica, discordou o Ibope, que enxergou uma diferença de 14 pontos percentuais entre o senador (24% das intenções de voto) e o deputado do PV (10%). O Rio tem 4,5 milhões de eleitores. A margem de erro é de 3 pontos percentuais. A menor das distâncias, portanto, mostra o segundo colocado com 21% (ou 945 mil votos), 8 pontos acima do terceiro (13%, ou 585 mil). Sobretudo em números absolutos, é uma diferença de dimensões formidáveis. Como Fernando Gabeira continua com mais cara de segundo turno que Crivella, é bom que o instituto comece o quanto antes a garimpar explicações para o enigma que pode emergir das urnas: o que aconteceu para que fosse superado em 10 dias o abismo de 360 mil votos? Se não for convincente, o Ibope poderá ficar com um ibope de deixar ruborizado o mais nanico dos candidatos.
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