Promotores e procuradores de Justiça de São Paulo reuniram-se recentemente na Assembléia Legislativa para lançar uma Frente Parlamentar de Apoio à Autonomia do Ministério Público (MP), cujo objetivo é assegurar autonomia financeira à instituição. Em 2007, sua dotação orçamentária ficou em torno de R$ 1,2 bilhão - o equivalente a cerca de 1,2% do Orçamento do Estado de São Paulo.
A corporação quer gerenciar sua receita orçamentária com a mesma liberdade do Poder Judiciário, para não ter de bater na porta do Poder Executivo para pedir verbas suplementares. Além de reivindicar “meios que garantam a independência na obtenção de recursos”, ela pleiteia que as custas e emolumentos judiciais sejam repartidos de modo equânime com a Justiça e exige maior flexibilidade em matéria de criação de cargos, planos de carreira para servidores e política remuneratória.
Ao justificar essa pretensão, os promotores e procuradores paulistas invocaram o papel do Ministério Público como fiscal da lei e da Constituição. Segundo eles, a atuação do órgão nas esferas criminal e civil é decisiva para a defesa do patrimônio público e do erário e para a prevalência do princípio constitucional da moralidade administrativa na máquina governamental.
Entre outras atribuições, o Ministério Público defende os chamados “interesses indisponíveis” da sociedade. “Para isso, precisamos de autonomia financeira”, disse o procurador-geral Rodrigo César Rebello Pinho, ao site Consultor Jurídico. Sem independência financeira, o órgão não poderia “dar um salto de qualidade em sua atuação institucional”, afirmou o deputado Fernando Capez (PSDB), promotor de Justiça licenciado e presidente da Frente Parlamentar de Apoio ao Ministério Público.
A Constituição de 88 definiu o Ministério Público como uma “instituição permanente essencial à função jurisdicional do Estado”, atribuindo-lhe “a defesa da ordem jurídica e do regime democrático”, mas isso não significa que o Ministério Público é o quarto Poder. É apenas uma instituição fiscalizadora que, entre outras competências, pode propor a abertura de ações civis e penais. O julgamento dos processos é de responsabilidade exclusiva do Poder Judiciário. Durante décadas, o Ministério Público foi um órgão atrelado ao Poder Executivo. Com a redemocratização do País, promotores e procuradores fizeram um imenso lobby na Assembléia Constituinte para assegurar a autonomia funcional e administrativa, alegando que, sem ela, ficariam vulneráveis a pressões de membros dos Três Poderes que devem fiscalizar.
Desde então, o Ministério Público se converteu num dos principais protagonistas da vida política. Mas, por falta de limites legais para a atuação de seus integrantes, nem todos usam suas prerrogativas de modo responsável. Não são raros os casos de denúncias criminais infundadas, assacadas para prejudicar a imagem pública de dirigentes governamentais, nas esferas municipal, estadual e federal, e favorecer partidos políticos.
Graças às amplas prerrogativas que conquistaram com a Constituição de 88, promotores e procuradores, na prática, são chefes de si mesmos, sem precisar dar maiores satisfações aos procuradores-gerais. Além disso, a autonomia administrativa da instituição permitiu aos seus dirigentes pagar salários não condizentes com a realidade financeira dos governos. Esquecendo-se de que o caixa é um só e a responsabilidade pelo que entra e sai é do Executivo, o MP paga salários muito acima da média do funcionalismo da administração direta.
É por isso que a reivindicação de autonomia financeira, pelo órgão, tem de ser vista com reservas. Além do risco de se dar à instituição um peso político muito acima de seu papel funcional no Estado de Direito, o perigo é que, a exemplo do que ocorre com a Justiça, o MP se valha da autonomia financeira para aumentar ainda mais os salários de seus integrantes, sem aceitar qualquer pedido de explicação a respeito da destinação dos recursos recebidos.
Se todas as reivindicações dos promotores e procuradores paulistas forem atendidas, o Brasil será a primeira democracia com quatro Poderes.