Entrevista:O Estado inteligente

domingo, novembro 18, 2007

Cabo eleitoral

Não é a primeira vez que Lula apóia Chávez perto de uma votação decisiva na Venezuela: atitude é péssima política externa QUANDO A Venezuela está prestes a decidir se corrobora o 18 brumário chavista, quando a oposição ao caudilho de Caracas cresce, legitimada pelas marchas de estudantes, quando uma defecção abala a junta governista do Palácio Miraflores, o presidente Lula decide defender a "democracia" de Hugo Chávez.
A displicência verbal de Luiz Inácio Lula da Silva não pode ser invocada para justificar o afago em seu colega venezuelano. Em política externa, como em quase tudo na vida, admitem-se deslizes ocasionais. Mas, quando o desvio se torna freqüente, então estamos diante de um padrão.
O presidente brasileiro já se prestara ao papel de cabo eleitoral de Chávez no fim do ano passado, quando faltava menos de um mês para a eleição em que o venezuelano obteve o direito de permanecer presidente até 2013. O pretexto era inaugurar uma ponte no país vizinho, mas a campanha chavista não perdeu a oportunidade de faturar em cima da generosidade de Lula.
Agora Lula volta à carga, a 15 dias do referendo em que os venezuelanos decidirão sobre a reeleição ilimitada -ardilosamente inserida em pacotes de bondades, como a diminuição da jornada de trabalho, que terão de ser votados em bloco. A mais recente contribuição do presidente brasileiro à mais recente campanha chavista foi lida pelo venezuelano num programa de rádio.
Chávez tem motivo para regozijo. Vinha de uma semana ruim, em que seu hábito de insultar governantes provocara uma resposta dura do presidente do governo espanhol, José Luis Zapatero, e do rei Juan Carlos. Em relação ao "Por qué no te callas?", do sábado em Santiago, a falação desastrada de Lula na quarta em Brasília foi o antípoda perfeito.
Desnecessário dizer que o presidente do Brasil deve evitar participações especiais em assuntos de política interna de outras nações. A atitude de resguardo, além de canônica, torna-se prudente quando se prenunciam problemas de maior vulto com o país vizinho. Chávez, que já deu a largada para uma corrida armamentista regional, agora fala em desenvolver energia nuclear para fins pacíficos, nos moldes do programa iraniano (inclusive pela baixa credibilidade).
Lula não precisava ter-se embananado, evocando exemplos de democracias parlamentaristas européias, a fim de defender mandatos ilimitados para Chávez. Tampouco era o caso de sugerir a limitação do mandato na Venezuela. O caso era de seguir o enunciado do rei espanhol e manter-se eqüidistante de algo que será objeto de voto popular.
A defesa atabalhoada do cesarismo chavista, contudo, acabou por revelar uma inconstância preocupante de princípios no Planalto. O círculo lulista não está convencido de que permitir o terceiro mandato presidencial seja algo fora de questão, na Venezuela ou aqui. Ora emite uma mensagem, de olho em votações importantes no Congresso, ora verbaliza o seu oposto.
Em 2005, na outra vez em que Lula elogiou por "excesso de democracia" o regime chavista -referia-se aos plebiscitos, celebrizados por ditadores como Saddam Hussein-, o brasileiro afirmou que não poderia "fazer as coisas que Chávez fez". O venezuelano era "mais jovem" e tinha "mais petróleo", argumentava. Que a descoberta do campo Tupi não tenha subido à cabeça.

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