O Globo |
17/10/2007 |
O contraste entre a alta popularidade pessoal do presidente Lula e o descrédito das instituições políticas, reforçado por mais uma rodada da pesquisa CNT/Sensus, não é um fenômeno isolado na América Latina e já produziu, em países como a Venezuela, a Bolívia e o Equador, e em certa medida até mesmo na Argentina, executivos mais fortes do que o equilíbrio dos poderes exige de uma democracia. Segundo outra pesquisa, a EcosociAL, realizada em sete países da América Latina com financiamento da União Européia, dentro de um projeto sobre uma nova agenda de coesão social para a região, mostra que a grande maioria dos latino-americanos - embora prefira a democracia como sistema de governo - confia pouco ou nada nas instituições políticas de seus países. Sintomaticamente, a maior desconfiança é em relação aos partidos políticos. No Brasil, o índice dos que não confiam no Congresso (72,7%) e nos partidos políticos (76,2%), embora muito alto, está um pouco abaixo da média dos países pesquisados, de 76,6% que não confiam no Congresso e 80,6% que não confiam nos partidos políticos. Ao contrário, os que não confiam no governo, no Brasil, são 60,3%, índice de desconfiança maior do que em países como a Argentina, o Chile, a Colômbia, e acima da média dos países pesquisados. Os demais números têm a mesma intensidade negativa: 71,9% não confiam nos prefeitos; 61,4% não confiam nos tribunais de Justiça e 62,8% não confiam na polícia. Esse descrédito nas instituições políticas do país é refletido pela pesquisa CNT / Sensus, que revela que 23,3% dos brasileiros defendem a extinção do Senado; 19,2% a da Câmara dos Deputados e 12,6%, a de ambos. A unificação das duas Casas do Congresso tem o apoio de nada menos que 45,3% dos entrevistados. É claro que esse resultado está ligado aos últimos acontecimentos, especialmente à longa crise que levou o Senado a uma agonia pública até se livrar da presença negativa do seu presidente, Renan Calheiros. Mas essa desmoralização da classe política vem de longe, com as negociações a céu aberto de votos em troca de cargos e verbas, até chegarmos ao mensalão, que envolveu vários ministros do primeiro governo Lula e boa parte da base aliada no Congresso. Tal escândalo, exacerbando uma relação espúria com o poder Executivo que desmoralizou o Legislativo, fez com que os políticos se transformassem, aos olhos da opinião pública, nos grandes vilões. Depois de perder em larga margem sua popularidade durante o ano de 2005, o presidente Lula conseguiu proteger-se desse contágio, alegando desconhecimento e traição, logrando ser reeleito em 2006. Sua popularidade mantém-se em alta, ao passo que o prestígio dos políticos só faz decair, o que alimenta no entorno de Lula ambições de variadas espécies. A idéia do fechamento do Senado, por exemplo, foi defendida oficialmente pelo PT em seu último Congresso, numa atitude claramente oportunista. Agora, que o vice Tião Viana assumiu a presidência do Senado, já existe um movimento no PT para tentar fazê-lo "candidato natural" à sucessão de Renan, que provavelmente não terá condições políticas para reassumir o cargo. O PT ficaria assim com a "tríplice coroa", chefiando o Executivo e as duas Casas do Legislativo. Seria uma distorção da representação política - o PT é apenas a quarta bancada do Senado - comparável a uma outra aventura que certas cabeças petistas alimentam: a convocação de uma Assembléia Constituinte exclusiva para, a pretexto de realizar uma reforma política, tentar aprovar mudança na Constituição e permitir que o presidente Lula possa disputar um terceiro mandato consecutivo. É louvável que Lula, sempre que o assunto lhe é apresentado em público, desminta essa possibilidade com toda a ênfase. No entanto, há relatos vez por outra de comentários seus, com insinuações de que isso poderia acontecer. Mesmo quem tenha críticas à reeleição, introduzida por emenda constitucional no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, sabe que ela existe em diversas democracias do mundo, ao passo que não existe caso de democracia que permita mais de duas eleições consecutivas. Os Estados Unidos, onde foi proibida a reeleição permanente depois que Franklin Roosevelt foi eleito pela quarta vez consecutiva, proíbe até mesmo a volta de um presidente depois do segundo mandato. Apenas a Venezuela, através de um Congresso controlado por Chávez, permite a reeleição permanente, transformando essa distorção em regra "democrática". Aqui no Brasil, esse caminho perigoso para a democracia é rejeitado pela opinião pública. O perigo é encontrar eco na opinião popular, diante da perda de confiança nas instituições político-partidárias. Caberá aos políticos de boa-fé, acima dos interesses partidários, um trabalho de reconstrução dos elos entre o eleito e o eleitor, para não permitir essa manipulação da opinião popular. Também ao presidente Lula caberá papel fundamental: mostrar-se como um líder político classificado pelo maior especialista em marketing político, o americano Dick Morris, na categoria "idealista inteligente", e não um "demagogo" pura e simplesmente. Em seu livro "O novo príncipe", publicado em 2004, ele define os "idealistas inteligentes" como aqueles dirigentes que, tendo uma visão para o futuro do país que comandam, conseguem comunicá-la ao eleitorado. Ao contrário, o "demagogo" não tem uma visão política, mas apenas o objetivo de manipular o eleitorado, ampliando seu poder. |
Entrevista:O Estado inteligente
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