artigo - Ilan Goldfajn |
O Estado de S. Paulo |
16/10/2007 |
O contribuinte que existe em cada um de nós foi provocado. O Brasil sofre de “nanismo estatal” - escreveram membros do governo -, “o verdadeiro choque de gestão será feito quando a gente contratar mais gente” - arrematou o presidente Lula (1/10/2007). A sociedade contribui com 34% de tudo o que produz para o governo, recebe serviços públicos de qualidade duvidosa e, agora, sofre ameaças contra a sua renda futura (afinal, quem vai pagar as novas contratações?). A princípio, a provocação poderia ser motivada por uma ideologia que acredita na melhora de bem-estar a partir de um governo maior e é refratária a entregar ao setor privado maior responsabilidade na economia. Mas, logo depois, ficou evidente que não se trata disso. Por pura lógica econômica (e pragmatismo), parcelas relevantes do necessário investimento do País em infra-estrutura deverão ser administradas pelo setor privado, como ficou claro no último leilão de concessão de rodovias, na semana passada. Que não haja dúvidas: o governo tem contratado mais gente. Dados levantados por Rodrigo Adão, da Ciano Investimentos, mostram que: O total de servidores ativos e inativos chegou, em 2006, a 2 milhões - um aumento de 235 mil em relação ao ano de 2002; os cargos de confiança aumentaram em 4 mil nesse mesmo período; a contratação por concurso público entre 2003 e 2006 somou 57 mil pessoas, em comparação com as 5 mil no período 1999-2002; e a despesa com servidores ativos da União chegou a 2,72% do produto interno bruto (PIB) em 2006 e deve aumentar ainda mais este ano. Esses gastos (e outros) têm sido financiados com o aumento da arrecadação proporcionado pelo momento favorável da economia. Os gastos com pessoal são de difícil reversão, uma vez que é mais fácil contratar do que demitir, no setor público. E a continuação do crescimento da arrecadação não está garantida. O que acontecerá quando houver uma interrupção nessa trajetória? O impacto dessa trajetória é considerável sobre a economia. A elevação dos gastos em folha reduz o espaço disponível para aumentar os investimentos públicos, que hoje permanecem num patamar muito baixo. E não permite que a dívida pública caia numa velocidade maior, o que reduziria a vulnerabilidade fiscal da economia brasileira e, conseqüentemente, a taxa de juros. Além disso, essa trajetória de gastos usa recursos escassos que poderiam ser utilizados para investimentos privados, exportações e consumo. E a forma que a economia encontra para deslocar esses recursos é apreciando o câmbio e inibindo o crescimento mais acentuado das exportações e impedindo a queda mais rápida dos juros, o que reduz a trajetória de crescimento do consumo e inibe os investimentos. No final, essa expansão resulta em mais gastos correntes do governo, menos investimentos públicos e privados, menos consumo e exportações. Se a situação persistir, numa hipótese radical e fictícia (assim esperamos), caso os gastos do governo continuem crescendo nominalmente 14,5%, mantendo o atual superávit primário, a carga tributária poderia chegaria a quase 60% em dez anos. Claramente, é uma situação insustentável. Duas perguntas naturais são: por que não há uma demanda maior da sociedade para modificar essa trajetória? Por que, ao contrário, aparentemente, há apoio na sociedade para essa política, como vimos nas últimas eleições? Alguns dizem que o brasileiro gosta do Estado como ele é. Na verdade, cada um gosta do “seu Estado”, aquele que o favorece. Há os que estão satisfeitos com o seu emprego público; outros, com os benefícios da aposentadoria pública; alguns gostam das transferências do Estado, como o Bolsa-Família; e há ainda os que se beneficiam do real apreciado ou de subsídios. Muitos desses gastos podem, de fato, ser amplamente meritórios. O problema é o que os economistas chamam de equilíbrio geral, ou seja, o efeito total de cada política, levando em consideração tanto o efeito direto e imediato, quanto os efeitos indiretos e ao longo do tempo. Quando se leva em consideração que é a própria sociedade que tem de pagar por esses gastos, por meio de impostos e contribuições, muitos desses beneficiados podem não estar liquidamente melhor. Na realidade, eles poderiam estar melhor se os gastos fossem menores, o que resultaria em impostos e juros menores, salário e consumo maiores. O problema é que o indivíduo enxerga mais facilmente o efeito direto e imediato, ignorando os outros efeitos, o que pode levá-lo a apoiar medidas que são prejudiciais. O atual crescimento vertiginoso dos gastos é certamente um desses casos em que pode estar havendo apoio (ou, pelo menos, pouca crítica) a políticas que são prejudiciais à sociedade. Em suma, o governo tem contratado mais servidores e defendido a tese de que se deve continuar nessa trajetória. Esses e outros gastos têm sido financiados por aumento de arrecadação e são de difícil reversão futura, caso a situação econômica se modifique. No ritmo atual, a expansão de gastos não é sustentável. Essa expansão tem tido apoio da sociedade por significar benefícios diretos e imediatos e prejuízos indiretos e coletivos, estes de difícil reconhecimento por não-especialistas. Ao contrário do que parece, essa política de expansão de gastos e contratações não se baseia numa profunda ideologia estatal, como mostram os leilões de concessões recentes. A trajetória reflete apenas a necessidade de “a gente contratar mais gente”. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, outubro 16, 2007
A gente contrata mais gente
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