Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 07, 2007

VILLAS-BÔAS CORRÊA


villas@jb.com.br
Os culpados são os que apuram

A experiência é um traste tão inútil como o conselho: só se adquire quando dela não mais precisamos.

Com o peso de décadas de militância no jornalismo político e a coceira na garganta para aconselhar ao amigo e colega brilhante, não resisti ao generoso impulso de uma releitura crítica do artigo de Augusto Nunes, publicado neste espaço, na edição de quarta-feira, dia 4, com o título instigante: A casa de doidos é caso de polícia.

No caso, o hospício é o venerando Senado e o seu enquadramento no prontuário policial um achado da precisa afinação do texto irretocável de um mestre da língua e de borduna pesada nas sovas aos intocáveis da cúpula dos três poderes.

Pois, meu prezado parceiro nesta caminhada de áspera cobrança ao comportamento vexaminoso do Legislativo - atolado no período de decadência que se começa a contar a partir da Constituinte de 1987/88, saudada pelas esperanças de mais uma ilusão - creio que devemos dar as mãos à palmatória, reconhecer os erros de interpretação e baixar à terra ou ao monturo da realidade.

Pois, salta à evidência que o Senado nos ensaios da opereta para inocentar o seu galante presidente, senador Renan Calheiros - com ressalvas para o recuo da devolução do processo contra ele ao Conselho de Ética, a escolha da trinca de relatores e o aprofundamento das investigações que pode encrencar o afortunado criador de gado folheado a ouro e o pagante da pensão à filha da sua ligação com a Mônica Veloso - esbofa-se para preservar uma praxe que não é apenas parlamentar mas incorporada à cultura da classe dirigente, dos donos do poder e do dinheiro.

A nossa irada frustração - a minha, a de Augusto Nunes, da minha geração que forjou o modelo de cobertura política que hoje se dissolve na orgia de mordomias e privilégios do Congresso brasiliense - é compreensível e razoável. O Congresso da fase dourada da eloqüência, de 1945 à mudança para a capital inacabada no ermo do cerrado, em 21 de abril de 1960, embora elitista e reacionário, na modéstia das instalações do Monroe e do Palácio Tiradentes, preservava o decoro e isolava os raros suspeitos de deslizes éticos. Não era um mosteiro de monges. Mas é inimaginável um dos seus expoentes, como Nereu Ramos, Gustavo Capanema, Afonso Arinos, Milton Campos, Aliomar Baleeiro, Adauto Lúcio Cardoso e dezenas ou centenas de homens de bem, no paletó do senador Renan Calheiros.

Se os tempos mudaram os costumes e corromperam a atividade política, o comportamento do Legislativo, do governo e do Judiciário deve ser analisado pela nova cartilha.

E, como não há outro jeito senão vergar a espinha para recolher o lixo, a melhor senão a única saída é tentar entender o que rola na cuca dos que mandam na praça da gandaia. A faca, o queijo e a razão estão com a maioria; errados são os que remam contra a corrente. Na cambalhota, com o cenário às avessas, são responsáveis pela nossa desmoralização recordista a Polícia Federal, a Procuradoria-Geral da União, as CPIs que não se acanalharam, e denunciaram os roubos, os desvios de fortunas, a prisão dos suspeitos da série de escândalos "como nunca se viu na história deste país".

Da inflada lista de escândalos - precatórios, Sudam, propinoduto, sanguessugas, mensalão, caixa 2, bingos, vampiros - a mão togada safou quase todos os denunciados. Livres, soltos, zombam dos trouxas que os perseguiram.

A malícia do povo ensina que "quem não pode com o pote não bota a mão na rodilha".

No país da impunidade só os pobres superlotam as cadeias. Rico relaxa e goza a vida.


Villas-Bôas Corrêa escreve nesta coluna aos sábados.

07/ 07/ 2007

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