Ver carros e aviões virando robôs é muito divertido.
Mas o que de fato segura Transformers é o seu elenco
Isabela Boscov
Fotos Divulgação |
Um Autobot (à dir.) enfrenta um Decepticon: ah, se meu carro falasse... |
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Transformers (Estados Unidos, 2007), que estréia nesta sexta-feira no país, é um filme caído do céu para Michael Bay. Não só dá ao diretor de Armageddon e Pearl Harbor a chance de, mais uma vez, perpetrar destruição em larga escala, como o deixa livre para assumir de vez seu caso de amor com o mundo mecânico, lubrificado a óleo e movido por quantidades indecentes de combustíveis fósseis. Para quem conseguiu de alguma forma escapar dos anos 80, vale explicar: os Transformers, originalmente, são brinquedos em forma de carrinhos e aviões que, nas mãos de crianças ou marmanjos dotados de alguma destreza, podem ser convertidos em robôs. Os do "bem" são os Autobots e os do "mal" são os Decepticons. Todos são originários do planeta Cybertron, destruído numa guerra. No filme, convenientemente, eles vêm acertar suas diferenças na Terra. Sam Witwicky (Shia LaBeouf), um adolescente da Califórnia, está sem saber em posse de um objeto que pode trazer de volta à ativa Megatron, o líder da falange malvada, e permitir que esta "desperte" todos os motores do planeta. Será, portanto – e como sempre nesses casos –, o fim da humanidade. A esperança é que Sam não deixe esse objeto crucial cair em posse dos Decepticons. Para tanto, os bem-intencionados Autobots mandam um emissário para protegê-lo, na forma de um velho Camaro amarelo que, na revendedora, parece literalmente implorar ao rapaz para ser comprado.
O diretor Michael Bay: com Spielberg e sem Bruckheimer, uma personalidade menos tóxica |
Sam, é evidente, não tem idéia de que está levando para casa um robô gigantesco. E é claro também que, passado o susto da descoberta, ele vai se tomar de amores por esse monte de lata e pelos seus companheiros, ainda mais descomunais, que logo desembarcam na Terra. Os Transformers tornaram a Hasbro a segunda maior fabricante de brinquedos do mundo exatamente por causa desse apelo irresistível para pessoas de certa inclinação mecânica – a idéia de que seus motores estão de alguma forma vivos e se comunicam com elas. Na década de 80, quando comprou esse conceito de uma companhia japonesa, a Hasbro inverteu toda a lógica do mercado ao lançar histórias em quadrinhos e desenhos animados para promover sua linha. (O normal, até então, era que os brinquedos nascessem das atrações, e não que dessem origem a elas.) Transformers leva essa lógica às últimas conseqüências. Todo o filme é uma peça de merchandising – dos brinquedos, que acabam de ganhar novas versões, dos acordos com marcas de refrigerantes e dos carros de uma grande montadora americana. Dado que o roteiro não faz nenhuma questão de esconder essa inspiração mercantilista, o filme poderia constituir uma experiência das mais irritantes. A surpresa, entretanto, é que ele tem muito mais charme do que se esperaria.
Boa parte dessa simpatia – qualidade que até aqui se desconhecia em Michael Bay – advém do fato de o diretor ter desfeito, pelo menos nesta ocasião, sua parceria com o produtor Jerry Bruckheimer. No lugar dessa combinação tóxica de personalidades, tem-se aqui a influência moderadora de Steven Spielberg. Pode-se creditar a ela a ausência conspícua do jingoísmo que sempre sublinhou a marca Bay/Bruckheimer, o tom de brincadeira em que a história é levada e até o visual atraente dos robôs. Embora pesadíssimos e barulhentos, eles mantêm a qualidade amigável das miniaturas nas cores vivas e na animação engenhosa, a cargo da Industrial Light & Magic. O dedo de Spielberg fica especialmente evidente na escolha do elenco, que favoreceu atores competentes e agradáveis, dos veteranos John Turturro e Jon Voight a recém-chegados como Josh Duhamel, Anthony Anderson e Rachael Taylor. E Shia LaBeouf, que lembra o John Cusack de vinte anos atrás, se desincumbe com desenvoltura da tarefa de conduzir esse time. De fato, por alguma razão difícil de explicar, é divertidíssimo ver carros e aviões se metamorfoseando em robôs. Mas o que segura Transformers, em última análise, é o mais básico dos fatores – o fator humano.