Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, julho 12, 2007

Míriam Leitão - Economia em alta


O Globo
12/7/2007

O clima era de otimismo econômico no jantar em Brasília que reuniu empresários brasileiros e americanos para discutir competitividade e inovação. O presidente do Movimento Brasil Competitivo, Jorge Gerdau, tinha uma razão especial para exibir um largo sorriso. O grupo Gerdau havia comprado, como se soube depois, uma nova siderúrgica nos Estados Unidos por US$4,2 bilhões.

Nas rodas que se formaram antes do jantar, os comentários entre os brasileiros eram sobre o aumento do ritmo da atividade econômica este ano. Alguns números impressionam.

- O consumo residencial de energia no Rio Grande do Sul, em junho, aumentou 14% em relação ao mesmo período de 2006. Pode-se dizer que é porque lá a base está baixa, mas, em São Paulo, também aumentou 8% - disse Wilson Ferreira Júnior, presidente da CPFL.

- Vários setores estão aumentando a demanda, eu sei porque, como produtor de aço, sinto quando a encomenda aumenta. O agronegócio está crescendo forte - comentou Jorge Gerdau.

A própria presença do líder da delegação americana, Robert Lane, presidente mundial da John Deere, já era um sinal de que as coisas estão melhorando. A fábrica de máquinas agrícolas que a empresa tem no Sul do Brasil passou por maus momentos nos últimos anos. Agora o setor começa a renascer e está aumentando suas encomendas de aço na Gerdau.

- Nossas vendas estão aumentando em várias áreas, seja para tintas de carros, ou para defensivos agrícolas - disse também Ricardo Vellutini, presidente da DuPont.

As vendas de carros estão tão exuberantes que empurram vários outros setores. A expectativa é de que se possa chegar aos 3,5 milhões de veículos produzidos no ano. Em parte, pelas condições de financiamento. Os juros ficaram mais baixos e as financeiras aumentaram prazos. Com isso, as parcelas caíram à metade. Outro indicador do novo ritmo é o setor de aluguel de carros; algumas empresas já chegam a contabilizar aumentos de 30%.

O presidente do Conselho da Natura, Pedro Luiz Passos, contou que, no setor de cosméticos, o aumento do consumo não é tão forte.

- Já se sente o aumento do comprometimento do orçamento doméstico com as compras de bens de consumo duráveis - disse.

Um dos assuntos dos bate-papos iniciais foi que os salários dos executivos das filiais no Brasil começam a ficar maiores que os dos executivos nos Estados Unidos, pela relação cambial que se inverteu fortemente nos últimos anos. Ilusão cambial? Os brasileiros diziam que talvez fosse ilusório o valor do dólar antes. Quem realmente reclama do dólar são setores como calçados; esses têm histórias tristes de empregos perdidos e de sobrevivência unicamente se for para importar da China.

O jantar era o início do US Brazil Innovation Summit, que, durante dois dias, colocará as empresas de ambos os países para conversar sobre inovação e competitividade. De um lado da mesa, o Movimento Brasil Competitivo; do outro, o Council on Competitiveness, cuja presidente, Deborah Wince-Smith, chegou ao Brasil dias antes do encontro e acha que há muito o que trocar:

- É impressionante como é criativo o design brasileiro. Há muito o que os dois lados podem conversar sobre inovação e competitividade. Estou muito animada com esse movimento. Temos que estar juntos porque nosso concorrente é a China. Ela é o problema dos dois países - disse-me Deborah Wince-Smith.

Nem tudo são flores, evidentemente. O presidente mundial da Merck Sharp & Dohme estaria presente, mas desistiu de vir depois da quebra da patente. Mas, mais que esse problema, que é circunstancial - afinal a Merck está no Brasil há 55 anos -, o que realmente preocupa o setor farmacêutico é a infra-estrutura em colapso e o excesso de burocracia. As empresas têm que manter quatro meses de estoque no Brasil porque qualquer licença na Anvisa demora mais que o razoável. É um setor que depende muito do transporte aéreo. Às vezes, o atraso no transporte e no licenciamento é tanto que os remédios passam da validade. Os investimentos em pesquisa estão sendo levados para Índia e China pela barreira burocrática.

- Hoje o mercado de remédios, tirando a produção estatal, é de US$8 bilhões. Isso poderia ser muito maior porque a produção no setor farmacêutico é de plataforma mundial. O Brasil tem tido dificuldade de entrar neste formato de produção mundial. A Índia está oferecendo todas as vantagens - contou João Nicomendes Valeri Sanches, da Merck.

Quem está tirando o melhor do momento de se produzir globalmente é o grupo Gerdau.

- A compra da Chaparral em Chicago vai completar nossa linha de produção de perfis para o mercado americano - disse Jorge Gerdau.

O grupo já tem a Ameristeel, de US$5 bilhões, nos Estados Unidos; mesmo assim, a Gerdau ainda tem mais ativos no Brasil que lá.

O ânimo dos empresários brasileiros está visivelmente mais alto. Há setores com problemas específicos, mas o que a maioria comemora é o aumento do nível de atividade. E, por enquanto, graças às chuvas que encheram os reservatórios das hidrelétricas e aos investimentos fortes feitos no governo passado na época do apagão, a CPFL, por exemplo, não prevê para curto prazo uma crise de energia. O governo Lula ainda tem tempo de providenciar o aumento de oferta.

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