O Globo |
17/7/2007 |
O episódio das vaias ao presidente Lula na abertura do Pan reacendeu nas lideranças do Democratas, o partido de Cesar Maia, a sensação de que é possível derrotar o governo nas eleições presidenciais de 2010. A análise do prefeito do Rio das pesquisas de opinião, que indicam uma alta popularidade de Lula, já eram no sentido de que sua imagem começa a ficar desgastada. Ele pinçava algumas tendências declinantes que apareciam entre os números positivos: a expectativa para 2007, que 43% consideravam "muito boa" em dezembro de 2006, em junho deste ano caiu para 19%; a avaliação de ótimo + bom de Lula, que em dezembro de 2006 era de 57%, caiu para 50% em junho deste ano; os que desaprovam o governo Lula em dezembro de 2006 eram 23%, e em junho deste ano chegavam a 30%; os que não confiam em Lula representavam 28% em dezembro do ano passado e passaram a 35% no mês passado. A direção nacional do partido considera que se mantém inalterado o quadro do primeiro turno da eleição presidencial, quando o país apresentou-se dividido entre os que apoiavam Lula e os que se opunham a ele, mesmo que boa parte desses tenha acabado optando pela reeleição no segundo turno. O presidente teve 48,6% dos votos no primeiro turno, e o tucano Geraldo Alckmin conseguiu a façanha de ter menos votos no segundo turno. Os Democratas consideram que a fraca campanha de Alckmin e opções equivocadas, como aceitar a adesão dos Garotinho logo no início do segundo turno, ou não defender o projeto de privatização, inviabilizaram uma vitória que era possível. No Rio, a situação foi quase idêntica, com Lula obtendo 49,2% no primeiro turno, sendo que Heloísa Helena, do PSOL, teve sua melhor votação, com 28,9% dos votos. Cesar Maia, para explicar as razões da vaia e recusar a acusação de que a tenha orquestrado, diz que o presidente Lula tem na cidade sua pior avaliação de todo o país. Vale-se de pesquisas do Instituto GPP que mostram que a avaliação do governo Lula sempre é pior na cidade que a média nacional. A avaliação "ruim" sobre a segurança pública, por exemplo, chega a nível nacional a 54,7%, mas na capital do Rio vai a 69,3%. O mesmo acontece com a nota média do governo, que no Sul e Sudeste são menores que a média nacional, elevada pela aprovação nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Os Democratas, que tentaram lançar a candidatura de Cesar Maia a presidente ano passado, agora parecem dedicados a alavancar nacionalmente o nome do governador de Brasília, José Roberto Arruda, que faz um governo voltado para a reorganização da ordem urbana, combatendo a favelização do entorno da capital promovida pelo ex-governador Joaquim Roriz. Ele mesmo admite que está perdendo popularidade nas classes D e E, mas diz que não teme o rótulo de "direita". É esse público-eleitor, da classe média para cima, que era a maioria dos que estavam no Maracanã na abertura dos Jogos, devido aos ingressos caros e aos convites dos grandes patrocinadores, que os Democratas estão buscando. As vaias seriam sintomas de que esse eleitorado continua avesso ao lulismo e esperando uma ação política que os represente. O cientista político César Romero Jacob, da PUC-Rio, especialista em análises de resultados eleitorais, não vê como o discurso da ordem seja suficiente "porque no plano econômico nunca houve tanta ordem. Há um eleitorado conservador no Sul, mas não suficiente para impor um projeto nacional". Romero Jacob diz que "há um descompasso entre o voto para presidente e o voto para prefeito no Rio, onde sempre houve, no plano municipal, um hegemonismo do brizolismo e seus descendentes". Desde 1992, quando Cesar Maia rompe com Brizola e se elege prefeito, a política no Rio tem sido "uma briga dentro da família brizolista", diz o cientista político, lembrando os casos de Marcello Alencar e do próprio Garotinho. "Ocorre que essas forças políticas dominantes no plano municipal e mesmo estadual não são dominantes no plano nacional, o que gera um descompasso entre o voto municipal e o federal. Na hora da eleição presidencial, este eleitorado, entre uma candidatura mais à direita e outra mais à esquerda, opta pela esquerda no Rio". Ele acredita que, por Cesar Maia, após quatro administrações, ter uma máquina administrativa muito forte, e que estava mobilizada na organização do Pan, pode ter influenciado no clima propício para as vaias, "mas isso não seria suficiente se não houvesse outros ingredientes: a classe média que votou na Heloísa Helena, a condescendência de Lula com os desvios de conduta de aliados; o próprio caso Renan Calheiros". Já o sociólogo Luiz Werneck Vianna, no artigo do site "Gramsci e o Brasil" citado domingo, chama a atenção para os sinais de que, sem a presença carismática de Lula em 2010, o "consórcio pluriclassista" montado no governo já começa a dar sinais de que não resistirá. Cita, "no mundo sindical, o anúncio de rompimento do PCdoB, partido integrante do governo, com a CUT, em nome de uma ação sindical mais reivindicadora, e, no mundo agrário, com a contestação do MST à política do agronegócio do etanol". Para ele, "a política pode se tornar um lugar vazio, nostálgico do seu homem providencial, ou vulnerável à emergência eleitoral da direita, brandindo seu programa de reformas institucionais, entre as quais a de simplificar ao máximo o papel do Estado, a ser denunciado como agência patrimonial, fonte originária da corrupção no país". Os Democratas jogam tudo nessa segunda hipótese. |
Entrevista:O Estado inteligente
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