Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, julho 13, 2007

Dora Kramer - Os roncos da reação




O Estado de S. Paulo
13/7/2007

Resolvido o caso Renan Calheiros, seja para que lado for, será iniciada no Congresso uma movimentação em favor de mudança na Constituição para transferir do Legislativo ao Judiciário a prerrogativa de julgar atos considerados impróprios ao exercício do mandato.
O argumento é o da necessidade de despolitizar os processos por quebra de decoro parlamentar, mas o essencial da idéia mesmo é criar uma barreira a mais entre os políticos e a opinião pública, mantendo-se o mais longe possível da pressão de quem vota.
De um modo geral, salvo raras exceções, deputados e senadores andam inquietos com a vigilância que se estabeleceu sobre suas ações.
Sentem-se permanentemente ameaçados e acreditam que, mudando para o Judiciário a arena de julgamento a respeito de suas condutas, os processos ficariam livres de ingerências externas e de eventuais revanches político-partidárias.
Por trás dessa argumentação aparentemente lógica, que inclusive busca no mundo exemplos de países de democracia desenvolvida onde o julgamento do parlamentar não é feito por seus pares, se descortina uma enorme resistência a se adaptar à evolução democrática: a sociedade ficou mais exigente, os meios de comunicação mais atentos e a informação mais transparente.
Só a política, da redemocratização para cá, se recusou a se modernizar. Não se faz a reforma das regras e não se reformam os procedimentos. Como estes já não combinam com os avanços - lentos, mas irreversíveis - das demandas da cidadania, o que antigamente era considerado normal hoje é motivo de escândalo.
Como não compreendem - ou não querem compreender - isso, não levam a sério critérios de improbidade e impessoalidade, acham que podem agir conforme o molde antigo e interpretam os novos tempos como tempos de caça às bruxas.
A proposta de transferir toda e qualquer fiscalização à Justiça é uma maneira de se valer das próprias distorções ainda não corrigidas da Justiça. Estão à disposição de todos os dados: o Judiciário não tem sido capaz de assegurar punições e, no lugar de se dedicarem a melhorar o sistema preferem se esconder por detrás de seus defeitos.
As alegadas vítimas de pretensas injustiças passadas, presentes e futuras não conseguem, entretanto, responder a uma questão bastante simples: em que caso o julgamento do Parlamento condenou inocentes incontestáveis, no de Fernando Collor? Era o que faltava.
Se injustiças houve, estão todas arquivadas na gaveta da absolvição de muita gente com patente culpa no cartório da representação popular, no qual se exige, além da observância irrestrita da lei, comportamento acima de quaisquer suspeitas.
O mundo político ainda não se deu conta - e em boa medida aquela parte da sociedade que se angustia e cai na desesperança também não -, mas a democracia tem um preço e, 22 anos de plenitude depois, nada mais natural que cobre a sua fatura dos que a ela devem institucionalmente representar.


Inquietos com a pressão, parlamentares querem pôr fim a julgamentos políticos

Autocombustão
Há 40 dias dono da solidariedade quase unânime do Senado, o senador Renan Calheiros já está, com suas manobras, pedindo para ter o mandato cassado, algo até há muito pouco completamente fora do cenário.
Não demora, algum partido representará contra ele por quebra de decoro no abuso das prerrogativas do cargo.

Imagem e semelhança
A atitude dos funcionários públicos que se aproveitam de situações específicas e da estabilidade no emprego para fazer de refém a coletividade com suas greves é coisa de oportunistas auto-referidos.
Nisso, não diferem dos tão criticados políticos quando eles se valem de prerrogativas específicas para obter vantagens corporativas.
Agora, isso só acontece porque a autoridade - ou falta dela - do governo federal já foi sobejamente posta em xeque: nas greves de servidores sem corte de salário no primeiro mandato; no salvo-conduto ao MST para invadir e depredar; no tratamento sindicaleiro dado aos controladores de vôo aos primeiros sinais da crise aérea e, mais recentemente, na tolerância ao parcial descumprimento da ordem para o corte do pagamento dos dias parados.
Enquanto isso, a proposta de regulamentação do direito de greve do servidor é "negociada" com o funcionalismo há seis anos e as reformas administrativa, sindical e trabalhista permanecem devidamente enterradas no arquivo dos assuntos para serem resolvidos quando, e se, no Brasil houver governos dispostos a executar a espinhosa - e nem sempre eleitoralmente compensadora - tarefa de governar.

Embolada
O crescimento baixo da economia foi, na visão do ministro da Fazenda, Guido Mantega, benéfico, porque evitou o apagão elétrico. Já o apagão aéreo, na versão do ministro, é bom porque traduz a aceleração do crescimento da economia.
Deu para entender, não é? Pois é.

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