artigo - Jarbas Passarinho |
O Estado de S. Paulo |
3/4/2007 |
Ainda jovem, estudando francês, paradoxalmente, com um alemão, descobri o gozo estético ao ler Anatole France. Eu era tenente e o notável escritor, sempre contrário aos militares - o que não me impediu de admirar-lhe o talento. No Crime de Sylvestre Bonnard me marcou uma frase que me confunde, nada obstante a beleza do contraste: "Sempre preferi a loucura das paixões ao juízo da indiferença." Há 42 anos, o povo nas passeatas gigantescas de 1 milhão de pessoas - bispos entre elas, confessa dom Paulo Evaristo Arns - desfilava nas ruas de São Paulo, nas Marchas com Deus e pela Liberdade, exigindo a deposição de Jango. Ele não era comunista, mas populista de esquerda, aliado de Prestes, como este confessa nos livros que ditou para Dênis de Moraes. Brizola pregava o fechamento do Congresso e uma nova Constituição. Fundou o Grupo dos 11, do tipo paramilitar, que, conta Jacob Gorender, lhe enviou, dias antes de 31 de março, relatório informando que o golpe viria de Jango, e não da direita. O mesmo informava o embaixador soviético, Andrei Fomin, a Moscou. A inflação, só nos primeiros trimestres de março, acumulara 28% e a projeção indicava 170% ao fim de 1964. O PIB brasileiro nos colocava na 48ª posição mundial. As greves eram instrumento do governo, que as patrocinava. Crescíamos como rabo de cavalo, o PIB per capita negativo, enquanto a economia mundial era próspera. Vivíamos sob a ameaça fatal da guerra fria, divididos em dois hemisférios ideológicos: o comunista, liderado pela União Soviética, em plena expansão, que já chegara a Cuba, e o anticomunista, que acompanhava os Estados Unidos da América. No Brasil, os comunistas haviam conseguido intrigar sargentos e marinheiros contra a hierarquia e quebrar a disciplina, pilares fundamentais das Forças Armadas. Em Brasília, em julho de 1963, sargentos da Aeronáutica e da Marinha dominaram o quartel dos Fuzileiros Navais, ocuparam a Esplanada dos Ministérios, prenderam um ministro, assenhorearam-se dos meios de comunicação e foram vencidos à bala pelo Exército, com morte. Em 25 de março, os marinheiros, cooptados pelos comunistas e que se inspiravam no filme do couraçado Potemkin, que iniciou a revolução russa matando seus oficiais, saíram de seus navios e se homiziaram no sindicato de metalúrgicos, presidido por um comunista. O ministro da Marinha mandou que os fuzileiros os prendessem. O "cabo" Anselmo conseguiu que os fuzileiros se aliassem aos marinheiros. O ministro da Marinha foi demitido por Jango, contrário à prisão dos amotinados, que nomeou substituto indicado pelos marinheiros em lista tríplice. Na noite de 30 de março recebeu homenagem - que virou comício - dos sargentos no auditório do Automóvel Clube do Rio e pronunciou discurso violento. Era a loucura da paixão - a que se refere Anatole. O povo nas marchas libertárias, o Congresso que debatia com a esquerda a guerra revolucionária, a imprensa em massa, que dizia "basta" de Jango, a maciça manifestação da Igreja Católica, ainda obediente à encíclica de Pio XI até que abandonamos o " juízo da indiferença". Saímos dos quartéis e sem um só tiro Jango caiu, com dignidade, pois não aceitou a pressão do cunhado para resistir no Rio Grande do Sul, iniciando uma guerra civil. Outra loucura da paixão comunista foi a luta armada. Militar experiente, Prestes previu o fracasso. Negou-se a participar da aventura. Ao fim, disse que "a luta armada só teve um efeito: prolongar o regime autoritário". De fato, o autoritarismo impôs-se para vencer a guerrilha, do contrário se beneficiaria das liberdades democráticas, como Marighella, o mais destemido guerrilheiro, que, preso, foi libertado por habeas-corpus. À esquerda não convém assumir essa responsabilidade. Dominando os órgãos de comunicação, prefere a inverdade e diz que as guerrilhas foram feitas por democratas e foram a resposta ao AI-5. Iniciaram-se - segundo livro da esquerda premiado em Cuba - em 1967. O Brasil modernizou-se a partir de Castello: a inflação, prevista em março em 170% ao ano (sem correção monetária), caiu progressivamente, chegando a 15% ao ano ao fim do governo Médici, mas os dois terríveis choques do petróleo impostos pelo cartel da Opep a elevaram a 220% ao ano ao fim do governo Figueiredo, porém a economia era a oitava do mundo. Mas o primeiro governo civil, logo depois do ciclo militar, terminou com a inflação inimaginável de 1.783% ao ano. Construídas, a Hidrelétrica de Itaipu é a maior do mundo e Tucuruí, a maior do Brasil. Passamos a sexto maior produtor de aço do mundo. O FGTS continua, provando a idiotice que a ele se opôs. As rodovias, a partir do asfaltamento da Belém-Brasília, ligaram a capital ao Oeste, até o Acre e o extremo Norte. A Petrobrás agigantou sua produção com a exploração no mar, que Médici decretara nossa soberania até 200 milhas do litoral. Niterói foi ligada ao Rio pela ponte, encurtando o caminho. A educação foi reformada do primeiro ao terceiro graus. O Brasil, que em 1964 tinha apenas 132 universitários para cada 100 mil habitantes, só melhor que Honduras, Guatemala e Haiti, segundo a estatística da Unesco, em 1984 já tinha 855 para cada 100 mil. O Congresso não tinha mensaleiros nem sanguessugas. De oitava economia do mundo, somos hoje a 12ª, que o IBGE, mudando metodologia, melhora para décima. A esquerda esconde todas as nossas conquistas, preferindo posar de democrata contra uma ditadura e indignada com a violação dos direitos humanos. Mas quem se indigna? Os comunistas em geral indenizados porque vencidos na luta armada. Guerrilheiros, treinados na China (ainda no governo João Goulart), nos satélites da União Soviética e em Cuba, todos regimes totalitários, e torturadores, desde Stalin a Mao Tsé-tung e Fidel Castro. Só a loucura da paixão explica. Jarbas Passarinho, ex-presidente da Fundação Milton Campos, foi senador pelo Estado do Pará e ministro de Estado |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, abril 03, 2007
A loucura das paixões
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