Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 14, 2007

Judiciário Conselho Nacional de Justiça sob pressão

Uma ameaça no horizonte

Disputa no CNJ coloca em risco sua
força e o futuro da Justiça brasileira


Ronaldo França

Celso Junior/AE
Fotos Dida Sampaio/AE
Ellen e Jobim: ela quer mudar todos os conselheiros e ele vê aí um ataque do corporativismo ao CNJ

Criado em 2005, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está diante de sua prova de fogo. O mandato dos atuais conselheiros se encerra em junho e está em curso uma disputa ferrenha para ocupar as quinze vagas de conselheiro. Já se iniciou a corrida para saber quem comandará o organismo que controla o Judiciário brasileiro. A campanha tem adesões inesperadas. Até mesmo quem era contra o CNJ agora quer integrá-lo. Avessos à idéia de um controle externo, os juízes brasileiros resistiram quanto puderam à sua criação. Tentou-se de tudo. Desde gestões para impedir sua aprovação pelo Congresso Nacional até ações questionando sua constitucionalidade. De norte a sul do país, as reações variaram entre a indignação e a cólera. Perdida a batalha, com a decisão do Supremo Tribunal Federal de que o Congresso tinha, sim, competência para criar o conselho, os tribunais não se mobilizaram pela indicação dos primeiros conselheiros. A disputa transcorreu como a vida no pátio do convento: sem competição e até com certo enfado. Era como se estivesse destinado ao fracasso. Depois de dois anos e algumas guerras vencidas, a situação mudou. "Eles começaram a ver a importância disso. Agora estão tentando, através da nova composição, cooptar o conselho para os interesses da corporação", alerta o ex-presidente do STF Nelson Jobim, um dos criadores e o primeiro presidente do CNJ.

Em seus dois primeiros anos de atuação, o conselho conseguiu feitos memoráveis no combate às mazelas do Judiciário. Instituiu o teto salarial dos juízes e funcionários da magistratura. Começou, com isso, a colocar um limite na farra dos salários absurdos. Proibiu também a contratação de parentes nos tribunais. Implantou estatísticas de desempenho, que nunca haviam sido feitas, e instituiu o voto aberto para a promoção dos juízes, um remédio eficaz contra as ações entre amigos dos desembargadores. Em um lance ainda mais significativo, conseguiu o afastamento e, mais tarde, a expulsão do presidente do Tribunal de Justiça de Rondônia, Sebastião Teixeira, preso pela Polícia Federal por participação em um esquema de venda de sentenças. Essa foi uma vitória particularmente estratégica. Na semana passada, um levantamento do jornal Folha de S.Paulo mostrou que, dos 27 tribunais de Justiça do país, catorze nunca investigaram seus desembargadores por desvio de conduta. Em outros nove tribunais consultados, somente três punições foram aplicadas. Por causa de problemas desse tipo era tão importante o CNJ firmar-se como a instância capaz de afastar um presidente de tribunal envolvido em atos ilícitos.

A prisão de Teixeira: uma chave para o sucesso na moralização do Judiciário

Com vitórias assim, o CNJ provou sua força explosiva. O problema é que ficou também patente sua capacidade de demolir interesses corporativos. Por isso é tão importante agora que se consiga preservá-lo, evitando que os grupos que lutam contra o aprimoramento e a transparência do Judiciário consigam nomear representantes. A situação do conselho é particularmente delicada por um detalhe adicional. Quem ocupa a presidência do CNJ é a presidente do STF, a ministra Ellen Gracie. Logo ela, que votou contra a entrada de pessoas estranhas à magistratura no conselho, na época de sua criação. Na prática, significou um voto contra o controle externo. O que se teme agora é a capacidade que a presidente do STF tem de influenciar a disputa. Todos prestam atenção em seus mínimos movimentos.

Com a campanha pela sucessão já quente, instalou-se, por exemplo, uma discussão sobre o número de conselheiros que deverão ser substituídos. A ministra afirmou a VEJA, através de sua assessoria, que é a favor da mudança integral do conselho. Sua tese, compartilhada por muitos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, é que os mandatos na Justiça brasileira são de dois anos, sem a possibilidade de recondução. É o caso de presidentes de tribunais e corregedores, por exemplo. A prevalecer a tese, os conselheiros que obtiveram conquistas tão importantes – e souberam resistir a tantas pressões – vão todos embora de uma só tacada. A ministra tem apoios políticos importantes. Ao longo dos últimos dois anos, foram muitas as rusgas entre o STF e o CNJ, principalmente quando o conselho tentou se impor como a última instância para as decisões de caráter administrativo da Justiça. "Há neste momento uma certa má vontade dos ministros do STF com os atuais integrantes do CNJ", disse a VEJA um dos ministros, que quer distância da polêmica. A Justiça brasileira está ainda a anos-luz da transparência e da eficiência que se pretendem. Os descalabros continuam sendo a regra. Caso o CNJ saia enfraquecido, qualquer que seja o caminho adotado, o país é que ficará debilitado.

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