Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 14, 2007

França Sarkozy lidera campanha presidencial

Perfil de Napoleão

O pragmático Nicolas Sarkozy é o favorito no primeiro
turno da eleição presidencial na França, onde três
candidatos disputam a segunda vaga e a metade
dos eleitores ainda não decidiu em quem vai votar


Antonio Ribeiro, de Paris

Jean Paul Pelissier/Reuters
Sarkozy quer uma França que acorde cedo e trabalhe. O eleitor gosta dele, mas está em dúvida sobre acordar cedo

Pascal Guyot/AFP


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Mais de 100 pesquisas de intenção de voto para a eleição do presidente da França foram realizadas desde o início do ano. A escolha desperta nos franceses interesse sem paralelo em meio século. Os eleitores inscritos aumentaram, proporcionalmente, acima do crescimento populacional. As projeções prevêem um índice de abstenção – o voto não é obrigatório – três vezes menor do que na última eleição presidencial. Uma semana antes de 44 milhões de franceses irem às urnas, no próximo domingo, 22, as sondagens indicam uma disputa fratricida entre três aspirantes a uma vaga no segundo turno. Já a posição de favorito é ocupada pelo mesmo postulante desde 2003, quando Nicolas Sarkozy, o candidato de centro-direita, contou aos seus compatriotas em um programa de TV que ao se barbear diante do espelho via a imagem do futuro presidente da França.

A franqueza em um país onde políticos prolixos dizem quase nada de substancial contribuiu para colocar Sarkozy em evidência. No jogo da verdade, marcou seu milésimo gol ao identificar os vândalos das periferias das grandes cidades como "escória" da sociedade francesa. As propostas do candidato para debelar o desemprego crônico, reformar o decrépito estado provedor, reduzir o colossal déficit público e promover um crescimento econômico robusto são consideradas brandas em muitos países. No entanto, essas medidas necessárias são ousadas para os padrões franceses, ainda que a maioria dos eleitores agora flerte com a direita, muitas vezes, em segredo pelo temor da patrulha ideológica. Ministro do Interior do apático governo de Jacques Chirac – o padrinho político com quem teve confrontos notórios –, Sarkozy baixou a criminalidade, preocupação número 1 nas últimas eleições presidenciais. Mas é pela desenvoltura ao abordar temas sensíveis e controversos, como o controle da imigração, a falta de apego ao trabalho e os limites dos direitos individuais, que o candidato causa um misto de medo, respeito e, às vezes, espanto. Como ao declarar ser genética a origem da pedofilia. Quando é considerado o mais ambicioso político da Europa, Sarkozy não se queixa. Diz ele: "Minha vida, minha paixão, é a ação; piso fundo e continuo acelerando". Pragmático, ele acha a França, atolada pelo imobilismo, carente de "ruptura" com o passado. Acredita que sem voluntarismo – o dele, evidentemente – o país irá de mal a pior.

Jean-Christophe Verhaegen/AFP

O belo sorriso de Ségolène: a proposta de mais assistencialismo não convence a maioria

Quatro em cada dez eleitores franceses ainda não decidiram em quem votar. Por duas razões. Nenhum candidato suscita uma adesão natural. As sociedades democráticas são propícias à indefinição eleitoral porque têm o livre-arbítrio como princípio fundamental. Esse conceito permite a impressão de que a decisão de última hora está mais próxima do acerto ou do erro menor. Por outro lado, a tradição mostra que a distribuição dos votos indecisos se dá de forma equivalente à dos já decididos. A segunda colocada na corrida presidencial, a socialista Ségolène Royal, diz ter gasto metade da campanha ouvindo os franceses para elaborar seu programa. Por "franceses" leia-se militantes do Désirs d'Avenir, movimento criado por ela fora do Partido Socialista, cujos caciques foram contra sua candidatura. Num primeiro momento, Ségolène prometeu um estado de bem-estar social ainda mais assistencialista. Transformada em realidade, sua promessa vai cavar mais fundo o buraco de 1,2 trilhão de euros da dívida pública e colocar mais recursos nas mãos do estado, que atualmente fica com 46% de toda a riqueza produzida no país. Agora, Ségolène propõe uma bandeira francesa em cada lar. Se isso não reduz um tostão dos impostos pesados, demonstra o patriotismo, tema querido à extrema direita de Jean-Marie Le Pen.

Enquanto Ségolène capricha para ganhar simpatizantes no campo adversário, ela perde votos para François Bayrou, o candidato do centro. Bayrou tem chances como azarão porque o eleitor desconhece para onde Ségolène vai e sabe muito bem aonde Sarkozy quer chegar. O centrista propõe a troca da velha batalha entre a esquerda e a direita por uma temática suprapartidária, sob seu comando. A proposta tropeça no tamanho de seu partido: apenas 27 deputados dos 577 da Assembléia Nacional. Ele não conseguiria formar um governo no regime parlamentar francês sem aliar-se a um de seus adversários atuais ou mesmo a ambos. Uma curiosidade: Bayrou está 6 pontos porcentuais atrás de Ségolène. Se chegar ao segundo turno, as pesquisas o apontam vitorioso contra qualquer adversário.

Na semana passada, em uma rara e discreta visita a território hostil, Sarkozy assistiu à cerimônia de concessão de cidadania francesa a quarenta imigrantes num subúrbio de Paris. Le Pen aproveitou para dar uma estocada no adversário que lhe tira votos. Dias antes, ele flanou pela periferia para mostrar que não é recebido nos bairros pobres, cheios de imigrantes de origem árabe, com a mesma animosidade que Sarkozy. Le Pen insiste que o presidente da França deve ser como ele, ou seja, de cepa 100% nacional. Sarkozy, filho e neto de imigrantes húngaros, não dispõe do pedigree. Esse tipo de abordagem provoca polêmica, mas passa longe das principais expectativas dos franceses nestas eleições: as propostas para criar empregos e garantir a eficiência do sistema previdenciário.

Todos os candidatos foram unânimes em criticar a indenização de 8,4 milhões de euros paga a Noël Forgeard, ex-presidente da Eads, holding da Airbus. A crise da Airbus – e dela deriva o plano para demitir 10 000 franceses – deve-se, sobretudo, à opção por decisões políticas, influenciadas pelos acionários estatais, em detrimento dos imperativos comerciais. Nenhum candidato ousou tocar na ferida. O caso Forgeard serviu para reforçar a caricatura do patrão endinheirado, cuja exploração eleitoreira rivaliza com os recorrentes ataques ao "poder global dos EUA". Em termos de antiamericanismo, Sarkozy representa outra exceção na classe política francesa. Os mais ponderados viram como um despropósito a visita do candidato à Casa Branca. Os mais radicais encararam como traição.

O futuro presidente da França, seja quem for o escolhido, e a julgar pela campanha eleitoral, não está inclinado a aliviar as barreiras alfandegárias. Isso significa que os produtos agrícolas brasileiros continuarão onerados por sobretaxas na França. O Brasil, o maior parceiro comercial da França na América Latina, tampouco deve esperar dela agrados nas negociações da Rodada de Doha, sobre comércio internacional. Se eleito, Sarkozy deseja executar reformas nos dois primeiros anos de seu mandato de cinco. No bojo das propostas está a abolição da jornada de trabalho de 35 horas semanais, uma extravagância francesa. "Eu me comprometo a reduzir o desemprego de 9% para 5%, como os ingleses fizeram", diz ele. Sarkozy já escolheu o seu primeiro-ministro. Será o senador e ex-ministro da Educação François Fillon, autor da reforma previdenciária, conhecido por enunciar, no calor de um debate, a regra simples: "Quanto mais impostos, menos empregos".

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