SÃO PAULO - Já devia estar acostumado, mas não consigo deixar de me surpreender com a formidável capacidade de o mundo político brasileiro debruçar-se sobre o escandalosamente periférico em vez de debater o essencial.
Refiro-me, desta vez, ao "furo" de Catia Seabra, na Folha de ontem, a respeito das negociações governo/ oposição para acabar com o mecanismo da reeleição, estendendo o mandato presidencial de quatro para cinco anos.
À parte os próprios políticos, há por aí algum mortal comum capaz de achar que eliminar a reeleição (ou mantê-la) resolve um só problema da pátria? É óbvio que não.
Mas é uma mania brasileira essa de mexer nas regras, como se tudo dependesse delas, não de ações.
Para tornar ainda mais espantosa a idéia em negociação, convém lembrar que o mecanismo da reeleição é de tenra idade no país: foi usado apenas em três eleições (1998, 2002 e 2006). Ou seja, não teve nem tempo de maturação suficiente para mostrar sua eficácia (ou não).
Aliás, daria até para dizer que se mostrou, sim, eficaz. Pelo menos foi sob a égide da reeleição (ou dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva) que o Brasil conheceu um surto raro de estabilidade econômica e política. Antes dela, ou havia uma seqüência contínua de interrupções do processo democrático, ou uma sucessão de distúrbios econômicos espantosos, ou as duas coisas ao mesmo tempo.
Admito que as duas estabilidades não serviram até agora para fazer do Brasil um país realmente decente. Mas, sem elas, era mais indecente ainda. Até a pobreza diminuiu, graças ao controle da inflação.
Para que mudar agora, então? Só pode ser para dar vazão ao furor legisferante do mundo político. Impotente ou incompetente para agir, fica fazendo ou discutindo regrinhas. Ridículo.
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