Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 13, 2007

Dora Kramer - O convescote da boquinha




O Estado de S. Paulo
13/4/2007

O presidente Luiz Inácio da Silva ganhou o apoio do PMDB praticamente todo, como ficou demonstrado no jantar oferecido pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, na noite de quarta-feira, ao qual compareceu em peso a nação pemedebista: 92 deputados federais, 20 senadores, 6 governadores, 5 ministros, 6 vice-governadores, dirigentes regionais e integrantes da Executiva Nacional.

Em contrapartida, Lula ganhou também muito mais bocas para alimentar. Quase todas estavam lá, mais interessadas nas boquinhas que o governo federal ainda tem a oferecer do que no jantar propriamente dito.

De tarde, antes do encontro, corria com desenvoltura no Congresso a piada que expressava com sinceridade as intenções: dizia-se que à noite haveria sorteio de cargos, o “bingão do segundo escalão”.

Na hora do encontro, contudo, os convivas estavam mais compostos, houve entre eles até quem se ofendesse com referências ao real motivo da festa.

Seria “confraternização” e não pressão para entrega ao partido de postos em estatais como Petrobrás, Eletrobrás, Correios, Furnas, Caixa Econômica e estruturas desse porte, várias delas com mais dinheiro e poder que muitos dos cinco ministérios já ocupados pelo PMDB.

Ao comparecer ao convescote sem a menor preocupação com seu caráter explicitamente fisiológico, Lula avalizou a dinâmica que o PMDB pretende imprimir à sua relação com o governo, abrindo a guarda para o PT - contrapeso na aliança partidária - reagir em defesa da manutenção de seus feudos na administração pública.

Não poderá, mais adiante, alegar que a cigana o enganou.

A briga que se avizinha não ocorrerá em ambiente de fino trato. Se o presidente captou direito a mensagem, o PT também entendeu bem o recado materializado no quórum do jantar.

Se começar a sentir perda real de espaço, logo fará corpo mole, alegando discordâncias pontuais com o Programa de Aceleração do Crescimento, rateando na convicção sobre a necessidade de prorrogação da CPMF e fraquejando no combate à CPI do Apagão Aéreo.

Obviamente o PMDB não esperava que o presidente fizesse papel de leiloeiro na casa do presidente do Senado. Queria mostrar que é grande, forte, merece uma boa recompensa por isso.

Pela conversa política que transpirou do jantar, ficou tudo entendido. Lula fez discurso falando da eleição de 2010 e de sua idéia de ter um candidato único da coalizão dos 11 partidos governistas.

O presidente do PMDB, que morto não está, inverteu o entendimento. Mais uma vez, lançou mão de sua tese de candidatura própria, sempre à disposição da vocação pemedebista para sentar no banco do carona do poder alheio.

O ministro das Relações Institucionais, Walfrido Mares Guia, pegou a deixa e espalhou a versão mais conveniente ao PMDB, dizendo que Lula admite a possibilidade de dar ao partido o direito de indicar o candidato a sucessor.

É justamente o contrário. Lula pela primeira vez deu uma dica do que pretende de sua aliança partidária mais à frente: fidelidade eleitoral para tentar barrar o projeto de volta ao poder do PSDB.

Não necessariamente com um candidato do PMDB, mas necessariamente com alguém que ele considere o mais adequado para, uma vez na Presidência, dar continuidade a seu projeto de culto à personalidade. Na melhor das hipóteses, com vistas à História. Na mais plausível, Lula aposta num sucessor amigo para exaltar seus oito anos e pavimentar sua volta à Presidência em 2014.

Contravapor

Francamente, não deu para entender a proposta da Câmara de aumentar em 82% o salário do presidente da República. Chefes de Executivo, quando postos diante dessas gentilezas do Legislativo, em geral abrem mão da oferta em nome da preservação da própria imagem.

Recentemente, os governadores de Minas Gerais, Aécio Neves, e de Alagoas, Teotônio Vilela Filho, recusaram os aumentos. Lula foi mais ameno, considerou desnecessário o reajuste naquele índice, mas mandou o mesmo recado ao cordão dos bajuladores: se têm vocação para o suicídio, caminhem sozinhos à beira do precipício.

O recuo revelou juízo, mas a idéia original foi rudimentar.

Embaraçoso

O ministro da Defesa, Waldir Pires, pelo segundo dia consecutivo foi ao Congresso para, junto com o comandante da Aeronáutica, o presidente da Agência Nacional de Aviação Civil e o presidente da Infraero, prestar esclarecimentos sobre a crise aérea.

Pelo segundo dia consecutivo, defendeu o presidente da República, defendeu os controladores, defendeu a si próprio, só não defendeu os interesses do cidadão respondendo a questões elementares: o que se passa na aviação? Quando e como haverá solução? Que garantias há sobre a segurança nos vôos?

Os outros tampouco responderam, mas Waldir Pires passou do limite em matéria de subterfúgio. A cada aparição dessas do ministro fica mais evidente: se Lula quer mesmo preservá-lo, a melhor maneira é tirá-lo de cena.

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