Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 06, 2007

Cidades americanas instalam microfones nas ruas

Polícia na escuta

Para combaterem a bandidagem, cidades americanas
instalam um sistema de microfones nas ruas


Marcelo Carneiro


Até o fim deste ano, as ruas de Boston e Nova York ganharão ouvidos. Como outras dezesseis cidades americanas, incluindo Washington e Los Angeles, as duas metrópoles aderiram a um sistema que, com o objetivo de diminuir a ocorrência de crimes com armas de fogo, prevê a instalação de centenas de microfones de alta sensibilidade em pontos estratégicos. O sistema, conhecido como ShotSpotter (localizador de tiro, em uma tradução livre para o português), é capaz de, em menos de dez segundos, apontar a origem de um disparo com alto grau de exatidão. Nesse curtíssimo intervalo de tempo, a informação também é repassada para uma central de polícia (veja o quadro). Além de agilizar a chegada da polícia ao local da ocorrência, aumentando as chances de prender eventuais criminosos, o sistema inibe a ação de bandidos. É o mesmo princípio das câmeras de vigilância colocadas em locais públicos, que têm contribuído para a redução das taxas de criminalidade em todo o mundo.

O sistema de detecção de tiros nasceu em uma cidade americana de médio porte, Redwood, no estado da Califórnia. Inicialmente, a invenção não tinha como objetivo combater casos de roubo ou homicídio, mas diminuir os efeitos colaterais de uma tradição local: os festivais de tiros para o ar. Realizados a cada feriado nacional, e também nas festas de fim de ano, eles terminavam invariavelmente com feridos. Nos anos seguintes à instalação do ShotSpotter, o registro de incidentes desse tipo caiu 75%. O inventor do sistema, Robert Showen, um engenheiro do Vale do Silício, passou a vender a idéia a outras cidades. "Nos estados americanos, a polícia leva entre cinco e dez minutos para receber um telefonema alertando sobre uma ocorrência com arma de fogo. E a maior parte dos casos não é sequer notificada. Agora, todos os disparos podem ser investigados a partir do instante em que ocorrem", diz Gregg Rowland, vice-presidente da ShotSpotter, a empresa de Showen dona da patente e fabricante do equipamento.

O sistema também tem sido usado como prova nos tribunais, especialmente nos casos em que policiais são acusados de atirar contra suspeitos sem motivo aparente. Como o ShotSpotter aponta a direção de onde a bala partiu, é possível identificar de quem foi o primeiro tiro. No Brasil, o sistema seria útil para acabar com o mito da "bala perdida" – e com a impunidade de quem a dispara. Só na primeira quinzena de março, catorze pessoas foram atingidas no Rio de Janeiro por projéteis disparados durante brigas entre traficantes ou confrontos de bandidos com a polícia. Por enquanto, o ShotSpotter não pode ser vendido a outros países, já que envolve utilização militar: está sendo usado no Iraque por tropas americanas para identificar atiradores entre os insurgentes. Seu alto custo também não incentiva a exportação. Para cobrir uma área de 39 quilômetros quadrados em Washington – o equivalente a três vezes o tamanho do Aeroporto de Guarulhos –, a polícia da cidade gastou em torno de 2 milhões de dólares.

Sistemas de vigilância como esse são uma ferramenta valiosa no combate ao crime. "Eles têm um efeito psicológico e inibem a ação dos criminosos, que ficam com receio do monitoramento", diz Alexandre Perez, gerente do Centro Integrado de Operações da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco, responsável pela segurança pública no estado. Em 2003, o centro instalou doze câmeras ao longo da Avenida Boa Viagem, um dos cartões-postais da cidade. Na ocasião, o local era um dos maiores pontos de roubo do Recife. Passados dois anos, a ocorrência desse tipo de crime foi reduzida em 78%. Sistemas de vigilância eletrônica hoje são utilizados em larga escala. O país com a maior tradição no uso de câmeras é a Inglaterra, que conta com 4 milhões delas – uma para cada quinze habitantes. Nos últimos cinco anos, a capital, Londres, vem registrando sucessivas quedas nas taxas de violência, em especial o homicídio. No Brasil – que tem cidades com índices de assassinato até dez vezes superiores à taxa londrina, de 2,8 mortes por 100.000 habitantes –, cada investimento na aquisição de tecnologia para combate à violência pode significar dezenas de vidas poupadas.




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