O Banco Central sobe hoje os juros olhando um painel de controle com sinais confusos: o PIB de 2010 será divulgado na quinta-feira e deve confirmar os 7,5%, mas a produção industrial de janeiro, que será anunciada hoje, deve ficar negativa. A inflação tem risco de superar o teto da meta; o governo anunciou cortes de gastos e novos aportes ao BNDES ao mesmo tempo. A alta dos juros deve ficar em 0,5%.
Há sinais contraditórios na conjuntura, mas uma coisa é certa: a inflação está alta e subindo. Ouvimos aqui na coluna vários economistas, todos acham isso. A inflação de fevereiro vai continuar alta, em torno de 0,83%, segundo Elson Teles, da Máxima Asset. Depois, vai cair para algo como 0,45%, em março, segundo Luiz Roberto Cunha, professor da PUC-Rio. Cunha explica que em junho, julho e agosto do ano passado a inflação foi zero, então a taxa em doze meses vai subir nesse período este ano. Ele acha que não vai estourar o teto de 6,5%, mas prevê um número próximo disso. Outros economistas acham que pode sim superar os 6,5%.
Se fosse olhar só para as pressões inflacionárias, o Banco Central teria que ser ainda mais duro: a inflação não está cedendo e deverá nos próximos meses chegar ao teto da meta; o BC deveria mirar o centro da meta. O governo ampliou muito os gastos no ano passado de olho no calendário eleitoral e os cortes anunciados esta semana não têm a consistência desejada. Há pressões inflacionárias externas contra as quais a taxa de juros tem pouco poder, porém, o BC precisaria compensar nas variáveis sobre as quais suas decisões têm efeito. Além do mais, há em vários mercados sinais de formação de bolhas, como no mercado imobiliário, onde as altas recentes nos preços dos imóveis começaram a ficar fora de órbita.
Mas é pedir demais que o BC tenha uma olhar assim tão técnico num governo inicial e já dando voltas no que havia dito durante a campanha, como a afirmação - agora esquecida, felizmente - de que gastos públicos não têm relação com inflação. Por isso, a aposta geral é por aumento de juros nesta segunda reunião do Copom do governo Dilma Rousseff, mas no mesmo ritmo do último aumento.
O economista José Júlio Senna, da consultoria MCM, acha que o Banco Central está atrasado na sua tomada de decisões, porque as expectativas já vêm piorando desde o ano passado. Aliás, elas melhoraram quando o BC elevou os juros e voltaram a se deteriorar quando ele parou de agir, mesmo diante dos sinais de que pressões inflacionárias estavam se acumulando.
Senna acha que o BC não quer mais trazer a inflação este ano para o centro da meta, ou seja, 4,5%. Mas esse deveria ser o objetivo, porque assim é que funciona o regime de metas de inflação. Ele acha também que o BC pode não estar se sentindo com autonomia para perseguir essa meta este ano ou então está convencido de que a economia vai desacelerar a ponto de reduzir a pressão inflacionária.
De fato, a maioria dos economistas prevê hoje um crescimento do PIB de 2011 menor do que previa no começo do ano, e alguns já notam sinais de desaceleração. Aliás, olhando um período mais longo, o crescimento não é alto, pode ficar em torno de 3,5% de média nos últimos três anos. Na visão de Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse, o grande problema, na verdade, é a forte indexação da economia.
- O grande risco não é a demanda mais forte, mas a inércia da inflação no Brasil. Temos muitos contratos indexados, consultas médicas, serviços. Por isso, os repasses de preços acontecem - afirmou.
A queda das previsões de crescimento do PIB em 2011 para níveis de 4% tem duas explicações. De um lado, a base de comparação agora é alta - o número a ser divulgado esta semana deve confirmar um PIB de 7,5% no ano passado. Segundo, está havendo uma desaceleração, que se reflete na revisão do crescimento para baixo. Nilson Teixeira acha que vai haver um pico de inflação na metade do ano, mas o crédito bancário já está crescendo menos, desaquecendo a demanda.
O economista Eduardo Loyo, do BTG Pactual, considera que um aumento maior de juros agora levaria a um ciclo menor de elevação. Acha também que as medidas macroprudenciais - aquelas que reduziram a oferta de crédito - farão uma parte do trabalho e equivalem a um aumento das taxas de 0,75%.
Luis Otávio Leal, do Banco ABC Brasil, lembra que o governo se comprometeu com vários objetivos ao mesmo tempo, em geral contraditórios: gerar 3 milhões de empregos e reduzir o ritmo de atividade; não cortar investimento; impedir a valorização do real e reduzir a inflação.
Ele considera que tudo ao mesmo tempo não dá. Mas admite que a produção industrial deve cair, mostrando a desaceleração do PIB. Sérgio Vale, da MB Associados, acha que a produção industrial, que vai ser divulgada hoje, terá queda de 0,5%. Carlos Thadeu de Freitas, da Confederação Nacional do Comércio (CNC), acredita que a queda da indústria será ainda maior: 0,75%. Ele conta que o comércio também desacelerou, em parte porque a inflação reduziu a renda.
Natasha Daher, do Itaú Unibanco, afirma que a despeito dos dados da indústria, a atividade ainda está acelerada e acha que a inflação de serviços prova isso. Ela está convencida de que a pressão não vem apenas da alta de commodities.
É neste cenário fluído, cheio de dados, de mudanças de ritmos, de ameaças e em início de governo que o Copom decide hoje a taxa de juros. Deve subir meio ponto, mas avisar que o ciclo não acabou. Para complicar uma situação que já é complexa, lá fora a economia mundial vive com medo do risco que a alta do preço do petróleo pode significar.
FONTE: O GLOBO
Entrevista:O Estado inteligente
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