Emprego e salário continuam sustentando o consumo. Com a renda mensal
ainda em alta, as famílias conseguem fugir da marcação do Banco
Central (BC), manter a economia razoavelmente aquecida e atenuar, por
enquanto, os efeitos da política anti-inflacionária. O mercado
financeiro voltou a elevar a inflação estimada para este ano,
projetando um aumento de 5,82% para o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA) e de 6,88% para o Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI). O centro da meta, 4,5%, dificilmente
será alcançado, segundo o julgamento corrente. Mesmo na avaliação do
BC esse ponto só será atingido no próximo ano. Os dados de emprego e
do varejo avalizam o ceticismo quanto aos efeitos das medidas de
controle tomadas até agora.
O Ministério do Trabalho registrou a criação de 280.799 empregos com
carteira assinada em fevereiro - contratações menos demissões. Foi um
recorde para os meses de fevereiro, segundo os dados do Cadastro Geral
de Empregados e Desempregados mantido pelo Ministério. Também no
primeiro bimestre foi recorde o número de empregos formais criados
pela economia brasileira - 448.742.
Números do setor privado confirmam o vigor do mercado de trabalho no
mês passado. Segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
(Fiesp), o emprego na indústria paulista subiu 0,56% de janeiro para
fevereiro, descontado o efeito sazonal. Foram contratados 20.500
trabalhadores. O nível de ocupação foi 4,57% superior ao de um ano
antes. Dos 22 setores pesquisados mensalmente, 16 contrataram, 3
demitiram e 3 ficaram sem alteração.
Pode estar ocorrendo alguma desaceleração na economia, mas seus
efeitos ainda parecem limitados a alguns setores. A ligeira retração
do emprego industrial em janeiro, apontada pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), parece, por enquanto, ter sido
apenas uma acomodação temporária. O contingente assalariado foi 0,1%
menor que em dezembro, mas a folha de pagamento foi 5,1% maior,
descontada a inflação. Ainda em janeiro, o volume das vendas no varejo
foi 1,2% maior que em dezembro, segundo informou ontem o IBGE. Foi o
maior aumento desde agosto do ano passado, quando a expansão mensal
chegou a 1,9%.
Mas pelo menos um setor acusou os efeitos da política monetária. As
vendas de carros, motos e componentes foram 7,1% menores que as de
dezembro - uma consequência do aperto do crédito iniciado no fim do
ano pelo BC. O aperto poderá continuar, com a imposição de novos
limites à capacidade de empréstimo dos bancos. Poderá ocorrer, segundo
avaliação do mercado, mais uma elevação dos juros, na próxima reunião
do Comitê de Política Monetária (Copom). Depois disso, serão mantidas,
segundo as previsões correntes, só as chamadas "medidas
macroprudenciais" - o velho arsenal de controle da criação de moeda.
O Ministério da Fazenda já acenou com a possibilidade de um arrocho
adicional - um aumento do imposto cobrado sobre os empréstimos tomados
no exterior pelas empresas brasileiras. Esses empréstimos têm sido um
dos canais de ingresso de dólares no mercado brasileiro e, portanto,
um dos fatores de valorização do real.
O pessoal da Fazenda parece preocupado principalmente com dois
problemas: primeiro, a valorização cambial; segundo, o risco das
empresas endividadas, se a tendência do câmbio se inverter e o dólar
subir. Uma restrição a esses financiamentos poderá, no entanto, afetar
também o nível de atividade, encarecendo o capital externo e limitando
o campo de ação das empresas.
Um crescimento econômico na faixa de 4% a 5% em 2011 ainda será
razoável, especialmente depois da expansão de 7,5% no ano passado, e
facilitará o reequilíbrio da economia. É esse o objetivo declarado
mais de uma vez pelo ministro da Fazenda. Mas não se poderá alcançá-lo
sem a quebra de alguns ovos, isto é, sem uma expansão menor do emprego
e da folha real de salários. Com a economia em crescimento menos veloz
ainda será possível contratar pessoal, mas o resultado será menos
brilhante e o ajuste poderá ter um custo político. Mas o início de
governo é o melhor momento para isso.