Na sexta-feira, 18 de março, o G-7 demonstrou uma nova razão para sua
existência pela primeira vez em anos. Num claro sinal de seu desejo de
ajudar o Japão, as autoridades do G-7 anunciaram que interviriam para
sustar a valorização do iene. Essa é a primeira vez que ocorre uma
medida desse tipo em dez anos e, ao menos da perspectiva japonesa, é
extremamente bem-vinda. Após a declaração, as autoridades japonesas
intervieram e, como resultado, pelo menos por enquanto, o iene
enfraqueceu.
Embora continue difícil avaliar com segurança a escala dos danos
causados pelo terremoto e o tsunami que assolaram o Japão, é
imperativo que a situação não seja mais agravada por desdobramentos
injustificados do mercado financeiro. No início desta semana, o
primeiro-ministro japonês descreveu a situação como o maior desafio
que o país enfrenta desde a 2ª Guerra Mundial. Um comentário desses
requer medidas corajosas, e a intervenção para conter a força do iene
se justifica plenamente, a meu ver.
Evidentemente, a origem da força da moeda japonesa é, em grande
medida, a acumulação de superávits em conta corrente no balanço de
pagamentos na última década e, com isso, o acúmulo de enormes ativos
estrangeiros. Embora o governo pareça ter um problema de dívida, o
país como um todo não o tem. Por definição, o saldo em conta corrente
é a diferença entre a poupança nacional e o investimento nacional, e
os superávits em conta corrente do Japão ao longo de muitas décadas
são reveladores.
No entanto, nos últimos anos, essa poupança nacional tornou-se cada
vez mais dependente do setor corporativo, na medida em que diminuía a
poupança das famílias. Apesar de muitos financistas continuarem
estupefatos com as atividades da infame sra. Watanabe (apelido no
Japão para donas-de-casa que fazem investimentos cambiais), a poupança
acumulada está de fato encolhendo. Como já mencionei em ocasião
anterior, jamais pensei que ainda estaria trabalhando quando a taxa de
poupança familiar nos Estados Unidos superasse a do Japão, mas isso já
está ocorrendo há mais de um ano. Aliás, as famílias americanas poupam
hoje duas vezes mais que as japonesas e a dívida pública bruta
americana é menos da metade. Não era assim que a coisa funcionava.
É fato conhecido que a população do Japão começou a declinar alguns
anos atrás, e muitos especialistas calculam que até 2050 ela estará em
torno de 100 milhões de pessoas ou menos, cerca de 25% menor do que
hoje. Com o aumento da expectativa de vida, porém, isso significa que,
a menos que os japoneses aceitem trabalhar além da idade normal de
aposentadoria, haverá cada vez menos pessoas trabalhando para
sustentar cada vez mais pessoas. Segundo um interessante artigo
recente do jornal Financial Times, 20% dos japoneses com mais de 65
anos já estão trabalhando em empregos de tempo integral, supostamente
quatro vezes mais que na Europa. Todos eles terão de trabalhar muito
mais, especialmente no Japão, que terá ainda que aumentar a imigração
e imaginar maneiras de encorajar os pais a produzirem mais filhos.
Esses problemas chamaram a atenção por muito tempo de diversas mentes
no exterior para os dramas financeiros do Japão, incluindo diversos
investidores altamente bem-sucedidos. Muitos têm histórias famosas
sobre quanto perderam tentando vender a descoberto Bônus do Governo
Japonês ou ienes, ou ambos (apostando no enfraquecimento dos ativos
japoneses). Durante boa parte dos últimos 15 anos, nunca concordei
realmente com essa visão, por três razões (embora, nos últimos dois
anos, eu também tenha entrado nesse campo).
A primeira das três razões é a seguinte: foi verdade, e ainda é, que o
Japão é um grande credor estrangeiro. Quando o Japão precisou de mais
financiamentos por causa do terremoto de Kobe e suas consequências em
meados dos anos 90, os mercados internacionais suportaram as
consequências negativas quando investidores japoneses repatriaram
ativos estrangeiros para ajudar a financiar necessidades domésticas
imediatas maiores. Observando de maneira geral os mercados na
sexta-feira, a situação sugeriu uma reprise parcial.
A segunda razão é que, apesar de a taxa de crescimento do Produto
Interno Bruto (PIB) real do Japão ter sido modesta e sua tendência de
crescimento fraca comparada à de muitos outros países, em razão de sua
demografia, a riqueza individual no Japão não sofreu - isto é, o PIB
per capita não encolheu. Isso foi verdade antes de o Japão começar a
testemunhar a deflação, mas as evidências são agora mais matizadas. A
terceira é que a taxa de poupança no Japão era relativamente alta, mas
isso agora começou a mudar, especialmente desde a crise global do
crédito em 2008 e da reconstrução da taxa de poupança familiar
americana. Foi esse último ponto, na verdade, que me levou a mudar a
minha visão estratégica sobre o Japão.
Muitos observadores têm ficado confusos com a relativa timidez do
Banco do Japão (banco central) para tentar estimular o crescimento,
conter a deflação e sustar a valorização aparentemente inexorável do
iene. Embora se possa explicar por que o iene chegou ao ponto em que
está levando em conta os ativos estrangeiros líquidos do Japão, por
quaisquer outras fórmulas de estimação da taxa de câmbio de
equilíbrio, o iene está muito caro. Isso é obviamente verdadeiro numa
simples base de PPP (paridade de poder de compra), e nos dois últimos
anos, o mesmo resultado também é produzido por modelos de taxa de
câmbio real ajustada. Ironicamente, isso ocorre num modelo que eu
criei há cerca de 15 anos para explicar por que o iene se comportou da
forma como se comportou, e que hoje mostra a moeda japonesa com uma
sobrevalorização de 30%.
No último ano, circulou um argumento muito válido, em termos
políticos, de que o Banco do Japão resistiu a medidas para enfraquecer
deliberadamente o iene tanto por temer provocar um sentimento
empresarial anti-japonês nos Estados Unidos (que foi abundante no fim
dos anos 80 e começo dos 90), e por um desejo de fortalecer o yuan
chinês. O fato é que o iene se fortaleceu consideravelmente mais que o
yuan desde a crise de crédito global. Há agora uma clara necessidade
de ousadia para assegurar uma superação acelerada dessa situação
trágica. Os acontecimentos certamente o exigem. Eu aplaudo a
declaração do G-7 e a intervenção que vimos e que, muito
provavelmente, veremos mais. / TRADUÇÃO DE CELSO M. PACIORNIK