Sempre haverá gente capaz de levar a sério discursos anti-FMI. Parte desse público também se opõe à Organização Mundial do Comércio e a acordos comerciais com qualquer parceiro acima da linha equatorial. No entanto, os dados são razoavelmente claros quando se trata da questão financeira: ou se fortalecem as instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, ou a maior parte dos países ficará sujeita ao poder direto dos grandes bancos e, às vezes, à ingerência também direta, sem nenhum amortecedor, do governo dos EUA ou de outras potências de primeira linha.
A percepção desse fato é especialmente importante quando se inscrevem no alto da agenda a regulação e a supervisão do sistema financeiro internacional. Sobre alguns pontos, pelo menos, parece esboçar-se um consenso: é preciso enquadrar todos os tipos de instituições (não só os bancos comerciais), montar esquemas precisos de monitoramento e difusão de informações, tornar a contabilidade mais transparente e instalar sistemas eficientes de alarme e de prevenção de desastres. O presidente da França e do Conselho Europeu, Nicolas Sarkozy, enumerou, ontem, sugestões desse tipo para a regulação do mercado comunitário e, se possível, do sistema global.
Haverá, nos próximos meses, muita discussão política sobre o assunto, com algumas boas idéias e certamente muita retórica, especialmente de tipo terceiro-mundista. Na hora do trabalho sério, o ambiente de assembléia será substituído por estilos de ação mais conseqüentes e mais profissionais.
Uma das questões mais importantes será a divisão de funções entre organismos nacionais e internacionais. Numa economia globalizada, será insensato depender apenas das autoridades nacionais. Mas, para uma solução equilibrada, será preciso ir muito além do Fórum de Estabilidade Financeira, em funcionamento desde 1999 e formado por autoridades de 12 países avançados, 5 instituições internacionais, incluído o FMI, e 6 organismos de regulação e supervisão. Um mecanismo eficiente de acompanhamento e de prevenção de crises terá de operar de forma permanente, com uma equipe de alto nível, um bom sistema de coleta de informações e razoável independência técnica. Esse mecanismo deverá ser o centro do sistema de supervisão e de alerta. Seria um desperdício montar um novo organismo, em vez de atribuir a função ao Fundo, como foi recomendado, na semana passada, pelo comitê político representativo dos 185 países membros, e equipá-lo para isso.
Embora os EUA e outras grandes potências tenham o maior peso político no FMI, proporcional a suas cotas, a instituição tem operado com autonomia técnica e, como fórum multilateral, tem-se mostrado muito mais equilibrado que a ONU. Seus economistas têm sido capazes de antecipar problemas. Alguns críticos deveriam reler (ou ler pela primeira vez) o prefácio do Panorama Econômico Mundial publicado em abril de 2006, há dois anos e meio, portanto. Depois de resumir o cenário central das projeções, o autor do texto escreveu: "Tal cenário seria o proverbial pouso suave. Há possibilidades menos benignas. Por exemplo, o consumo poderá cair mais velozmente do que se prevê quando baixar a espuma dos preços dos imóveis e isso poderá derrubar a confiança e o investimento." A frase seguinte chama a atenção para o conjunto de riscos em torno do cenário central de crescimento robusto. Esse crescimento, confirmando a previsão, continuou até há pouco tempo. Mas o alerta estava lá, com o detalhe da espuma nos preços dos imóveis - no mercado americano, portanto. A leitura atenta pode ser instrutiva.