Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 10, 2008

CLÓVIS ROSSI Os incorrigíveis

MADRI - Sabe a AIG, a maior seguradora norte-americana, aquela que o governo teve de socorrer com uma pilha de US$ 85 bilhões (R$ 187 bilhões) para evitar a quebra? Pois é, apenas seis dias depois desse socorro, a empresa gastou US$ 443 mil (suficientes para pagar 2.130 salários mínimos) em uma festa para seus executivos em um dos mais luxuosos "resorts" da sofisticada Califórnia.
"Estavam fazendo as unhas das mãos e dos pés, tratamentos faciais e massagens, enquanto o contribuinte paga a fatura", esbravejou Elijah Cummings, que não é nenhuma demagoga esquerdista, mas uma deputada democrata. Só no campo de golfe do "resort", deixaram US$ 7 mil. Sete dos dez principais executivos da AIG participaram da esbórnia. "É uma prática comum nesta indústria, para compensá-los [aos executivos] por seu trabalho", disse o porta-voz da companhia. Que trabalho, cara-pálida? O de afundar uma empresa?
O instantâneo, que acabou no Congresso dos EUA, é talvez um flagrante mais explicativo da crise do que todo o resto. Não se trata só de ganância, fator a que muitos atribuem a baderna nos mercados. Que há ganância, é óbvio. Mas ganância faz parte da alma do capitalismo e, em alguns casos, é até combustível para o progresso (e não tenho aqui espaço para discutir o conceito de progresso).
O que essa "prática comum" revela é uma cultura torta, feita de hedonismo ao ponto extremo e de uma sensação já não de impunidade, mas de inimputabilidade. Não há respeito não só pelo dinheiro público mas pela própria empresa que lhes paga salários (os famosos pára-quedas dourados, expressão que ganhou estado público com a crise), bônus, luxos. Claro que ganhar dinheiro não é feio, desde que honestamente. Mas essa cultura tornou feio não ter um pára-quedas de ouro.

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