BRASÍLIA - Lula disse ontem que é um "apaixonado" pela Revolução Cubana, que faz parte de uma geração seduzida pelos barbudos que saíram de Sierra Maestra para derrubar uma ditadura cliente de Washington. Até aí, quase toda a esquerda, festiva ou "hardcore", o foi em algum momento. Mas tudo indica que o brasileiro não entendeu bem o que ocorreu depois de 1962, quando a crise dos mísseis moldou o autoritarismo castrista.
Lula encontrou-se com o adoentado Fidel e sua camarilha, que aparentemente está conduzindo algum tipo de transição na ilha. Tendo sobrevivido à morte da mãe moscovita, querem agora transformar aquele paraíso tropical numa espécie de China do Caribe: sexo livre na economia, recato ultracatólico na liberdade política.
O processo por ora está sendo seqüestrado pelos barris de petróleo de Hugo Chávez, um grande democrata na concepção de Lula. E o Brasil? Promete investimentos.
Muito bem, é natural que todos os países ignorem os abusos cometidos por seus parceiros de negócios. Funciona assim no mundo todo: os EUA fingem que a China é democrática, regimes autocráticos do Golfo são badalados pelo Ocidente, as ditaduras africanas ricas em matérias-primas são vistas como "países com características próprias".
Não que a democracia liberal seja a panacéia universal, longe disso.
Mas a posição é de omissão. Há quase três anos, Lula insinuou que o Brasil poderia "ajudar a construir o processo democrático" na ilha dos irmãos Castro. Cascata. Ontem, Lula soltou o seguinte ao falar sobre política cubana: "Quem dá muito palpite quebra a cara".
O presidente mostra que não exorcizou integralmente aquele velho PT que adorava uma ditadura amiga. Lula é seletivo ao seguir seu próprio conselho sobre palpites: evoca os direitos humanos ao falar dos reféns das Farc, mas cala sobre os dissidentes cubanos.
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