A Justiça encontra pegadas de Zeca do PT, ex-governador de Mato Grosso do Sul, num desvio milionário de dinheiro público
Heloisa Joly
DO QUE ZECA DO PT É ACUSADO O QUE ELE FEZ, SEGUNDO O MP TAMANHO DO ROMBO | Givaldo Barbosa/Ag. O Globo |
Ao entrar na política, o ex-bancário José Orcírio Miranda dos Santos decidiu adotar um nome que fosse lembrado facilmente pelos eleitores de Mato Grosso do Sul. Passou a se apresentar como Zeca do PT. Em 1998, candidatou-se ao governo do estado. Fez sua campanha acusando o então governador Wilson Barbosa Martins (PMDB) de farrear com o dinheiro público. O discurso colou e Zeca foi eleito. Com a popularidade lá em cima, disputou a reeleição e, no fim das contas, ficou oito anos no cargo, até dezembro de 2006. Ao sair do governo, era apontado como bom administrador. Essa imagem positiva, no entanto, está prestes a ir para o brejo. Na última sexta-feira, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul encaminhou à Justiça duas ações em que o petista é denunciado por usar milhões de notas fiscais frias emitidas por gráficas e agências de publicidade para desviar dinheiro público. Agora, fica mais fácil entender por que o Zeca fez questão de ter PT até no nome.
A ação trata de um contrato firmado em 2004 entre o governo e a agência de publicidade Agilitá, uma das quinze contratadas por Zeca enquanto esteve no poder. A Agilitá foi contratada para fazer folhetos e panfletos de propaganda oficial. Para imprimir o material, subcontratou uma gráfica chamada Sergraph. O serviço nunca foi feito, mas foi pago. Só nesse caso, o MP pede à Justiça que o estado seja ressarcido em 436.000 reais. Em 2005 e 2006, essa mesma gráfica emitiu nada menos que 4 milhões de notas fiscais de supostos trabalhos feitos para o governo, o que equivale a 5.500 notas por dia. Os promotores estimam que 80% delas sejam frias. Segundo os promotores, Zeca do PT foi o "autor intelectual" do esquema. Por isso, denunciaram-no por improbidade administrativa, uso de documentos falsos e peculato – desvio de dinheiro cometido por funcionário público.
As investigações sobre Zeca começaram em maio, quando uma ex-funcionária do governo do estado, Ivanete Leite Martins, revelou a fraude e afirmou ao MP que o desfalque teria chegado a 30 milhões de reais. Então coordenadora de comunicação de Zeca, ela operava o esquema e fazia o leva-e-traz com as empresas envolvidas. Ivanete conta que, além das notas frias, havia superfaturamento: quando o governo petista contratava uma agência, exigia entre 5% e 10% do que era faturado. Agora, serão analisadas as contas das outras empresas que prestaram serviço de publicidade a Zeca. E as investigações podem tomar um rumo inesperado. Em uma apreensão recente, promotores encontraram no escritório do ex-secretário de governo de Zeca, Raufi Marques, um caderno com anotações de nomes e valores de pagamentos mensais. Estão na lista o senador Delcidio Amaral e os deputados federais Vander Loubet e Antônio Carlos Biffi – todos petistas –, além de uma série de vereadores, jornalistas locais e até Gilda dos Santos, mulher de Zeca. O MP suspeita que pode ter encontrado nesse caderno o destino do dinheiro desviado do Erário.