Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 14, 2007

DANUZA LEÃO

Fazendo as pazes

Ele chega mais perto e abre os braços para um grande abraço. É a hora do perdão, do não se fala mais nisso

SUPONDO QUE ele te traiu; difícil, perdoar a traição. No início são aquelas intermináveis conversas pela madrugada; depois, os silêncios. Ele, que traiu, não sabe o que dizer; você sofre, tem vontade de matar, não tem coragem de se separar porque ainda ama, tenta conservar a cabeça fria, mas não dá para ser a mesma de sempre.
Até tenta; fala das coisas que foram manchete no jornal, evitando de todas as maneiras citar o caso Renan Calheiros e Monica Veloso, mas tudo é forçado, sem alegria, sem espontaneidade, pois quem foi traído fica imaginando seu grande amor nos braços da outra. E na hora de irem dormir, viram um de costas para o outro e apagam logo a luz do abajur para não ter que falar, ou repetir tudo que já foi dito, até porque sabem que não adianta.
Quando as crianças estão por perto, pior ainda; elas não devem saber do que está acontecendo, e só Deus sabe o que é fingir que está tudo bem. Os dias vão passando, você não pensa em outra coisa e ele, que traiu -nem foi por paixão, apenas uma dessas coisas que acontecem-, quer se matar, dizer mil vezes que aquilo não significou nada, mas não há clima para isso nem para nada.
Tentar um contato físico, nem pensar. Cada tentativa é um fracasso, e por aí é que não é. Chegar levando flores jamais, se chamar para jantar num restaurante, vai ter como resposta um não, e se sair à noite para escapar do clima pesado da casa, é perigoso: pode dar a impressão de que vai encontrar com a outra. Ah, essa história de trair é complicada, e pode render meses, isso quando não há uma separação imediata. Se ele pudesse voltar atrás teria resistido, mas quem pensa nisso quando bate a vontade? Agora já foi, e é agüentar as consequências, a cara amarrada, o mau humor e às vezes um toque seu que é pior do que uma facada pelas costas. Ah, se arrependimento matasse.
Mas existe o tempo, e só ele, para curar certas feridas. Um dia chegam uns amigos e a conversa flui quase como antes; quando vão embora vocês trocam algumas palavras sobre como fulana estava bonita, sicrano mais gordo, e vislumbra-se uma trégua, até porque não há ninguém que consiga ficar sofrendo por uma traição para o resto da vida.
As coisas vão melhorando, vocês passam a viver numa certa harmonia, já conversam normalmente, mas o contato físico continua zero. E ele lá tem coragem de tentar, levar um não e voltar tudo ao que era antes?
Mas um sábado qualquer, um sábado comum, com um sol lindo, vocês resolvem sair e dar uma caminhada num parque da cidade. A caminhada acaba virando uma corrida, e quando chegam em casa, suados, comentam como foi bom terem conseguido correr, que devem fazer isso mais freqüentemente, pois faz bem ao corpo e à alma.
Nesse momento ele sente que é a hora -e é mesmo; chega mais perto e abre os braços para um grande abraço. É a hora do perdão, do -sobretudo- não se fala mais nisso; um abraço bem generoso, bem demorado, bem apaixonado, e a paz volta a reinar no universo.
Porque, pensando bem, não há nada melhor na vida do que um abraço bem sincero, bem apertado, bem encaixado, melhor do que todos os beijos na boca do final dos filmes.

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