Um passeio pela história da boa mesa,
nas crônicas do jornalista J. A. Dias Lopes
Jerônimo Teixeira
Roberto Setton |
Dias Lopes: da massa de 4 000 anos aos sundaes de Elvis Presley |
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Em sua campanha no Egito, Napoleão encontrou tempo para uma frase de efeito diante dos monumentos mais famosos do lugar: "Do alto dessas pirâmides, quarenta séculos vos contemplam", teria dito aos seus soldados. Ele não precisaria viajar tão longe. Houvesse parado na Itália para uma excursão gastronômica, e não militar, Napoleão teria quatro milênios de história no prato de macarrão ou espaguete: uma das crônicas de A Rainha que Virou Pizza (Companhia Editora Nacional; 368 páginas; 42 reais) fala justamente de um fio de massa encontrado em uma escavação arqueológica em Lajia, na China, cuja idade estimada é de 4 000 anos. O livro do jornalista J. A. Dias Lopes – diretor de redação da revista Gula, colunista gastronômico do jornal O Estado de S. Paulo e ex-editor de VEJA – é um saboroso passeio por milênios de história culinária.
Publicados originalmente em Gula e no Estado de S. Paulo, os textos do livro foram organizados cronologicamente, compondo uma espécie de painel histórico informal (o mesmo formato, aliás, de outro livro do autor, A Canja do Imperador). Os temas vão da evolução dos talheres aos hábitos alimentares de figuras históricas como o rei inglês Henrique VIII (cuja cintura chegou a ter mais de 1,5 metro de diâmetro) ou de celebridades como Elvis Presley (outro glutão, que só comia porcarias calóricas como cachorro-quente e sundae). Cada crônica é acompanhada de uma receita que lhe diz respeito. O texto sobre Sarah Bernhardt (gourmet refinada e caloteira inveterada, pois nunca pagava a conta dos restaurantes nos quais jantava), por exemplo, traz a receita de codornas que ganhou o nome da legendária atriz francesa. Caso semelhante é o da pizza margherita, criada pelo pizzaiolo Raffaele Esposito em homenagem a Margherita di Savoia, a rainha que virou pizza do título. Os ingredientes da cobertura – manjericão, mozzarella e tomate – prestam homenagem às cores da bandeira italiana, verde, branco e vermelho.
Escritores, artistas, reis e políticos desfilam suas preferências pelo livro. O presidente Juscelino Kubitschek era fã de baba-de-moça, doce que também fazia as delícias da princesa Isabel e do escritor José de Alencar. O último texto da coletânea examina os gostos de Bento XVI. Por muito tempo fiel ao apfelstrudel, sobremesa típica de sua Alemanha natal, feita com maçã, o papa acabou se rendendo ao italiano tiramisù. A Rainha que Virou Pizza demonstra que, além de deliciar o paladar, a boa mesa pode estimular o cérebro.