Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 24, 2007

Folha entevista ANAC (!!!)

Diretora da Anac não vê elo entre acidente e caos aéreo

ACIDENTE que deixou pelo menos 197 mortos não teve ligação com o número de vôos em Congonhas. "O acidente é o acidente. O sistema aéreo é o sistema aéreo", afirma Denise Abreu, diretora da Anac, agência reguladora do setor aéreo, para quem não houve demora na tomada de medidas em relação ao caos aéreo. "Enquanto a questão dos controladores não fosse resolvida, jamais conseguiríamos detectar os outros gargalos."

-folha SP 22/7

MÔNICA BERGAMO
COLUNISTA DA FOLHA

FOLHA - Depois do acidente e de duas centenas de mortes, o presidente Lula anunciou a diminuição de vôos em Congonhas. Não caberia à Anac ter feito uma avaliação e tomado a medida antes da tragédia?
DENISE ABREU
- Deixa eu te falar uma coisa: o acidente não foi no ar. Ninguém bateu no ar, tá? Então o acidente não tem nada a ver com o número de vôos em Congonhas. Vocês estão confundindo. O acidente é o acidente. O sistema aéreo é o sistema aéreo. Se "linkar" uma coisa à outra, fica um pouco difícil de discutir, né? Não tem nada a ver, na-da a ver, "linkar" tráfego aéreo com o acidente.

FOLHA - Foi o próprio presidente Lula quem, ao falar sobre o acidente, afirmou que o maior problema do setor aéreo hoje é a excessiva concentração de vôos em Congonhas.
ABREU
- Mas nós já estamos reduzindo os vôos desde a crise do apagão. Eram 48 movimentos por hora que caíram para 44 e depois para 33 com a reforma da pista principal do aeroporto. Já estávamos realizando estudos para redução de vôos e reavaliação de malha aérea. E não por falta de segurança, mas porque entendíamos que estávamos com problemas de infra-estrutura. Agora se resolveu tomar essas medidas mais rapidamente. Antes mesmo da resolução desses problemas de infra-estrutura, nós tomamos medidas para agilizar o check-in em Congonhas, a fila de raio-X, problemas com ônibus.

FOLHA - Mas já eram mais de dez meses de apagão aéreo e só agora a Anac começava a tomar medidas. Por que a demora?
ABREU
- Enquanto a questão dos controladores aéreos não fosse resolvida, nós jamais conseguiríamos detectar os outros gargalos do sistema. Quando a Aeronáutica tomou providências, não tínhamos mais o problema do controle gerando os atrasos. Mas eles permaneceram. Passamos então a adotar outras medidas.

FOLHA - Vocês tomaram providências em relação aos aeroportos. Mas não em relação à malha aérea das empresas. Por exemplo, um único avião faz vários trechos e escalas, e o atraso num deles gera problemas em cascata. A própria Infraero denunciou isso e as empresas disseram simplesmente que não mudariam nada. A Anac já não deveria ter interferido fortemente na questão?
ABREU
- A concepção da malha não foi elaborada pela Anac, mas sim pelo antigo DAC. É uma herança. A Anac não concedeu novos vôos para Congonhas. Quando resolvermos o problema da infra-estrutura, aí sim vamos poder dizer: "Ah, continuam os atrasos. Portanto o problema é das empresas". Aí você multa, aplica penalidades.

FOLHA - Em pleno apagão , a Anac arrecadou só R$ 3.000 de multas. É um número que realmente impressiona. As empresas têm comportamento tão exemplar assim?
ABREU
- A multa é o ato final de um processo que decorre da instauração de auto de infração. Pela lei, temos de abrir prazo de defesa para a empresa, em primeira e segunda instâncias. Poderíamos aplicar multas para dar impacto de mídia. Mas aí o Judiciário vai anulá-las. É super complexo isso, entendeu?

FOLHA - Outro fato que chamou a atenção foi o apagão da TAM no Réveillon de 2006. Os problemas não eram da infra-estrutura, já que outras empresas transportaram os passageiros a contento. A Anac fez auditoria e inocentou a TAM, que comemorou e divulgou o resultado.
ABREU
- O que a TAM divulgou não sei. Mas existem vários autos de infração em andamento.

FOLHA - Deputados da CPI do Apagão fizeram mapeamento que diz que diretores da Anac são subordinados aos interesses das empresas. Nele, você seria ligada à TAM.
ABREU
- TAM?

FOLHA - É. O presidente [Milton] Zuanazzi e o [diretor] Leur Lomanto seriam ligados à Gol.
ABREU
- Ainda bem que eu não li isso. E aí?

FOLHA - Bem, e aí eu gostaria de saber se você quer comentar.
ABREU
- Eu desconhecia isso. Estou trabalhando intensamente, vocês nem podem avaliar. Enquanto eu não ler como essa coisa foi redigida, eu não tenho nenhuma resposta. Mas eu me comprometo a ler e aí te dar uma resposta.

FOLHA - Dos cinco diretores da Anac, só um é do setor aéreo. A agência não deveria ser técnica?
ABREU
- A agência é reguladora. E o que é regular? É escrever uma norma, não é? E quem escreve norma? São os advogados, que sabem se aquela informação técnica está traduzida de forma correta, de acordo com todo o regramento nacional e internacional, com a Constituição. Então uma das pessoas da Anac tem que ser da área jurídica. É o meu caso.

FOLHA - Vocês receberam medalhas da Aeronáutica três dias depois do acidente. Não foi inoportuno num momento tão dramático?
ABREU
- Isso você tem que perguntar para o comandante [Juniti] Saito, da Aeronáutica. Estava marcado há quatro meses, é um evento que ocorre no aniversário de Santos Dumont. A Aeronáutica substituiu a comemoração por entrega de medalha seguida de um ato de luto.

FOLHA - Voltando ao acidente: foi correto liberar a pista de Congonhas antes de serem feitas ranhuras para melhorar o escoamento da água?
ABREU
- A pista é da Infraero, a obra é da Infraero. Quem libera a pista é a Infraero. Eu só posso te falar que a pista estava com 0,6 mm de água no momento do acidente. As regras internacionais definem que, com até 3 mm de água, a pista não precisa ser interditada porque é considerada segura. O atrito da pista também foi medido naquela semana. Deu aproximadamente 0.68, e as regras internacionais dizem que o índice deve estar com 0.5. Ou seja, a pista estava sendo operada com margem de segurança até maior. O Cenipa [órgão que investiga acidentes aéreos no Brasil] vai estar apresentando isso. Não é competência da Anac investigar.

FOLHA - A Anac é responsável pela segurança dos aviões. A agência sabia que a TAM estava operando o Airbus-320 sem um dos reversos? A própria agência baixou orientação para que as aeronaves não pousassem em pista molhada sem reverso.
ABREU
- No momento em que editamos essa regra, a pista de Congonhas ainda não tinha sido reformada, e o índice de atrito estava baixo. Nós então agregamos essa regra para aumentar o grau de segurança. Agora a situação é outra. Depois da reforma aumentou o atrito. A Airbus edita o manual operacional da aeronave. Se ele diz que o avião pode voar com um reversor só, pode. E não tem órgão fiscalizador que possa alterar as configurações prestadas pelo fabricante da aeronave. Nós fiscalizamos se a manutenção está sendo feita a contento. Fizemos a inspeção na aeronave [acidentada] e estava tudo ok.



Denise Abreu é próxima de José Dirceu

DA COLUNISTA DA FOLHA

Formada em direito pela PUC de SP, Denise Maria de Abreu fez carreira como procuradora do Estado. Em seu currículo, na página da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), ela destaca o fato de ter sido chefe-de-gabinete da Secretaria da Saúde de SP e também da Febem.
Próxima de José Dirceu, foi "subchefe-adjunta da subchefia de Assuntos Jurídicos" quando o ex-ministro comandava a Casa Civil. Na ocasião, participou do grupo de discussões para encontrar uma solução para a Varig, então ameaçada de quebrar. Dirceu defendia que a empresa fosse dividida em duas. O pedaço "saudável" formaria a Super Varig, que seria comprada por TAM e Gol. Ao sair da Casa Civil, Denise Abreu assumiu uma diretoria da Anac.

ENTREVISTA MILTON ZUANAZZI

Para presidente da agência, medidas podem não ser tão efetivas

Milton Zuanazzi acredita que as medidas anunciadas anteontem pelo governo federal para desafogar Congonhas talvez não tenham o efeito esperado

-folha SP 22/7 JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Milton Zuanazzi acredita que o pacote para desafogar Congonhas, anunciado anteontem pelo governo, talvez não surta o efeito esperado.
"Exeqüível é. Só não sei se será uma medida com os resultados que se espera. Temos que aguardar para ver. O problema de São Paulo é a falta de uma alternativa. A demanda de pessoas que viajam não é uma coisa que se possa controlar."
Para Zuanazzi, as decisões cabem ao governo e ao Conac (Conselho Nacional de Aviação Civil). A função da Anac é fiscalizar e regular o setor, no interesse da sociedade. Ele afirma que a agência "não tem nenhuma responsabilidade" pelo caos aéreo que há quase um ano tomou conta do país e considera que a Anac é criticada por aspectos que não são de sua responsabilidade.
Zuanazzi reclama ainda da falta de dinheiro para fiscalização e regulação do setor. Veja trechos da entrevista.

FOLHA - O presidente falou em fortalecer a Anac. O que isso significa?
MILTON ZUANAZZI
- Prioridade de recursos para exercer as funções de regular e fiscalizar. Para isso, tem que ter recursos humanos, recursos materiais.

FOLHA - O que falta para a Anac?
ZUANAZZI
- Nenhum organismo no Brasil ou agência reguladora tem dinheiro sobrando e profissionais sobrando [...]. Pedimos para o orçamento deste ano R$ 231 milhões e recebemos R$ 151 milhões. O que estamos discutindo com o governo é remunerar a Anac por dentro do sistema, e não pelo Ministério da Fazenda.

FOLHA - Por que a Anac não fez mudanças em Congonhas antes?
ZUANAZZI
- A agência tomou as medidas que considera as mais corretas, ou seja, baixamos os slots [horários e espaços de pouso e decolagem] de Congonhas para 44 movimentos/hora. Nós limitamos a aviação comercial em 38 movimentos/hora. Passamos por um ano atípico, tivemos duas obras -numa pista e depois noutra. Nós estávamos dentro daquilo que os padrões internacionais entendem que é viável. Nunca negamos que o ideal em São Paulo não era o "hub" [centro de distribuição de vôos] em Congonhas, mas sempre dissemos que não tínhamos alternativa de outro sítio aeroportuário [...].

FOLHA - E a idéia de criar um "hub" do Sudeste, com mais vôos no Rio?
ZUANAZZI
- Ele já está acontecendo no Rio e em Belo Horizonte. Pega os vôos em Confins e no Galeão há um ano e agora. O que a imprensa nunca diz é que a Anac nunca deu um novo "slot" em Congonhas desde que surgiu e que reduziu os "slots" em Congonhas. A gente fica apanhando por ter excesso de tráfego no aeroporto quando nós é que diminuímos. Quem aumentou? Nós estamos recebendo as críticas de algo que não fizemos.

FOLHA - Como foi ser condecorado com a medalha Santos Dumont?
ZUANAZZI
- A Aeronáutica é que tem que responder, mas não sinto que esteja fazendo nenhum mal à sociedade. Estou fazendo um esforço para acertar um conjunto de problemas, mas tem muita coisa que não tem a ver com a agência, como o controle de tráfego aéreo.

FOLHA - A Anac já identificou algum local capaz de receber o novo aeroporto?
ZUANAZZI
- A Anac já informou há bastante tempo o governo, inclusive na CPI, que necessitamos com urgência de um novo equipamento em São Paulo, além da ampliação de Guarulhos. O primeiro passo é ampliar Guarulhos, e o segundo é criar um novo equipamento em São Paulo, que pode ser um novo sítio ou uma ampliação. Estamos estudando levar a aviação geral [transporte aéreo não regular, como táxi aéreo] para Jundiaí porque é um local próximo de São Paulo, mas ainda não veio a resposta definitiva do Comando da Aeronáutica.

Arquivo do blog