Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 17, 2007

Jânio de Freitas - A marca da zorra




Folha de S. Paulo
17/4/2007

O Ministério da Justiça se transtornou e readquiriu as suas características de tempos idos e mal vividos

NO EXATO MÊS desde a transmissão de cargo, em 16 de março, de Márcio Thomaz Bastos a Tarso Genro, o Ministério da Justiça se transtornou e readquiriu as suas características de tempos idos e mal vividos.
Disputas internas em vez de articulação, concorrência por projeção externa, maior busca de influência política que de eficiência e objetividade em suas atribuições. Tudo isso seria problema da Presidência da República, não fosse o esperável e fatal reflexo sobre avanços recentes em setores de interesse direto da população, como a Polícia Federal e iniciativas associadas ao Judiciário.
O primeiro mês do ministro Tarso Genro na Justiça não se distinguiu, como atividade principal, do que fizera até então como ministro da Relações Institucionais: política. Retorno, portanto, a muito antes de seu antecessor imediato.
Desde o primeiro governo Fernando Henrique, o ministro da Justiça perdera sua função mais que secular de negociador político do governo. De início, Sérgio Motta assumiu tal papel, que desempenhou, em iguais proporções, com determinação estratégica e indeterminação ética. Dele, afastado pela morte, a função passou a sucessivos parlamentares, com maior êxito de Luiz Eduardo Magalhães, também morto no posto. Márcio Thomaz Bastos não pretendeu restaurar a tradição, dedicando-se estritamente às atribuições dadas pela Constituição ao Ministério da Justiça. Com a existência de um Ministério da Relações Institucionais, Tarso Genro estava destinado a função idêntica à de Thomaz Bastos. Em vão.
Não só as funções se embaralham entre os atuais ministros da Justiça e da Relações Institucionais. A partir daí, dá-se o mesmo em boa parte do jogo político. Já se tem notícia de perturbação no governo e na Câmara com a invasão, por Tarso Genro, da área política entregue ao petebista Mares Guia. E o resultado estreante está à vista, como parte das causas da dupla derrota que o governo está sofrendo com a iminência de CPIs do Apagão na Câmara e no Senado.
Os efeitos também se projetam, de cima, no Ministério da Justiça. Ex-promotor no Rio e, derrotado na busca do segundo mandato de deputado federal, Antonio Carlos Biscaia foi incluído nos petistas a receberem cargo do governo. Lutou pela Secretaria Nacional de Segurança, mas, para não criar desagrados ao esquema que circunda o delegado Paulo Lacerda, diretor da Polícia Federal, Tarso Genro foi aconselhado a manter Luiz Fernando Correa na Segurança. Antonio Carlos Biscaia está, há uma semana, na Secretaria Nacional de Justiça.
Mas não só. Volta-se para o que compete à Secretaria de Segurança, inclusive em desacordo explícito e público com o secretário. Mas não só. Se, na Folha de domingo, o ministro Tarso Genro assinava artigo defendendo menos cobrança de repressão imediata à criminalidade, e mais atenção com medidas sociais de prazo longo, na segunda-feira o secretário Antonio Carlos Biscaia aparecia no "Globo", por intermédio do repórter Jailton Carvalho, em defesa do oposto, isto é, da busca "também de resultados imediatos". Assunto da Segurança e não da Justiça.
Só esse embaralhamento no e a partir do ministério já desaconselharia a transferência do Controle de Atividades Financeiras do Ministério da Fazenda para o da Justiça, como pleiteiam Tarso Genro e Biscaia. Há razão muito superior, porém. As atividades financeiras de empresas e pessoas não podem ficar expostas ao interesse policial, sob risco de conseqüências horríveis. E não é outro o propósito do Ministério da Justiça, nas palavras do secretário Antonio Carlos Biscaia: "A vinda do Coaf dará mais agilidade às investigações financeiras (...)".
O que já marcou a nova administração é mais do que o desejado para o Ministério da Justiça. Menos novidade e mais continuidade será melhor. E até mais fácil: é só seguir o exemplo dado por Lula.

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